Publicado originalmente em inglês em 22/09/2020
É compreensível que os investidores estejam receosos com a atual incerteza em relação a praticamente tudo. Não é à toa que um pequeno parágrafo na ata da reunião de política monetária do Banco da Inglaterra tenha pegado os mercados de surpresa na semana passada.
O banco central britânico aumentou a possibilidade de taxas de juros negativas, depois de as autoridades virem rechaçando a ideia há meses.
De acordo com a ata, o Comitê de Política Monetária:
“[...] foi informado a respeito dos planos do Banco da Inglaterra de estudar como uma taxa bancária negativa poderia ser implementada com eficiência, caso a perspectiva de inflação e produção o justificasse.”
À medida que o Reino Unido se prepara para impor algumas restrições contra a covid-19 e debate um retorno ao confinamento, tudo leva a crer que as circunstâncias justificam a adoção de juros negativos se a intenção do banco é flexibilizar a política monetária ainda mais em relação à sua taxa referencial de 0,1% em vigor.
Surpresa do BoE segue exemplo do Fed
A libra esterlina mergulhou com os comentários, e os rendimentos dos títulos do governo britânico caíram com a alta do valor dos gilts (os rendimentos têm relação inversa com a cotação dos títulos).
O título de 10 anos derrapou 2 pontos-base na segunda-feira, enquanto os participantes do mercado esperam por um discurso do governador do Banco da Inglaterra, Andrew Bailey, na terça-feira, para ver se ele esclarecerá a visão do banco sobre os juros negativos.
O rali nos gilts também deu suporte aos preços dos títulos governamentais da Zona do Euro. O rendimento do papel italiano de 10 anos, que estava um pouco abaixo de 1% desde o anúncio do Fed, caiu ainda mais, tocando quase 0,9% na segunda-feira, antes de repicar alguns pontos-base.
Pesquisas de boca de urna indicaram que a aliança de centro-esquerda na Itália deveria manter o domínio do seu feudo na Toscana. As intenções de voto antes da eleição regional no domingo e segunda-feira mostravam que uma disputa acirrada. A perda da região central poderia desestabilizar o governo de coalizão do Partido Democrático e do Movimento Cinco Estrelas em Roma.
A surpresa com o Banco da Inglaterra na quinta-feira ocorreu depois que o Federal Reserve cumpriu sua promessa na quarta-feira de manter os juros baixos, estendendo o horizonte de tempo até 2023, com previsão de que a taxa referencial permaneceria perto de zero até o fim daquele ano.
Os rendimentos dos treasuries oscilaram, enquanto os investidores digeriam essa perspectiva, tentando usar a carta branca para sair de ativos mais arriscados diante da visão pessimista inerente à previsão.
Na segunda-feira, as preocupações com a pandemia pareciam predominar, e a nota de 10 anos do tesouro americano caiu 3 pontos-base, para 0,66%, já que a possibilidade de um novo lockdown em Londres fez os investidores buscarem ativos de proteção e deixar de lado as ações em favor dos treasuries.
O impasse no congresso americano em relação a um estímulo fiscal maior foi ofuscado pelo debate em torno de um nome substituto para a juíza Ruth Bader Ginsburg na Suprema Corte, que faleceu na sexta-feira depois de uma batalha contra o câncer.
O presidente do Fed, Jerome Powell, tinha pouco a acrescentar à equação em seu pronunciamento preparado para uma audiência na terça-feira perante o Comitê de Serviços Financeiros da Câmara a respeito da resposta do Fed à pandemia.
Mas timing é tudo, e sua reiteração da crença de que “uma recuperação plena só deve acontecer quando as pessoas tiveram confiança de que estão seguras para interagir em uma ampla gama de atividades" nos faz lembrar de que esse momento, claramente, ainda não chegou.