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Como explicar a quebra de um banco: uma análise formal em duas partes?

Publicado 07.10.2022, 09:19
Atualizado 09.07.2023, 07:32
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Os bancos possuem um papel de grande relevância na economia, pois realizam a intermediação financeira entre os agentes superavitário e deficitário. Porém, se ocorrer uma descontinuidade da intermediação financeira, o efeito na economia é crise. Nos meus dois próximos artigos, esse e o próximo, vou apresentar um modelo simples, o modelo de fluxos financeiro, que explicará o que leva à quebra bancária e uma crise financeira. A explicação completa do modelo pode ser encontrada aqui.

Os bancos possuem um papel central no modelo, pois realizam a intermediação de recursos entre as famílias. Assim, uma falha bancária pode significar a ruptura do funcionamento do sistema de intermediação, o que geraria instabilidade financeira para as famílias, pois ficariam impedidas de trocar recursos.

O banco central, que no modelo atua como planejador social, deve atuar na estabilização dos fluxos financeiros. Tal estabilização possui duas dimensões, a dimensão microeconômica (o banco individual) e a dimensão macroeconômica (o sistema financeiro).

As famílias buscam suavizar seu consumo entre o presente e o futuro, ou seja, buscam manter o mesmo nível de consumo em diferentes períodos de forma a maximizar sua utilidade intertemporal. Neste sentido, o consumidor racional possuirá um comportamento ótimo quando o seu consumo for pouco volátil entre os dois períodos. É assumido que não há restrição em emprestar (agentes superavitários) ou tomar emprestado (agentes deficitários), de forma que há intermediação financeira sem nenhum tipo de entrave.

Em suma, no processo de suavização as famílias superavitárias poupam no primeiro período para consumir no segundo período e as famílias deficitárias tomam emprestado no primeiro período para pagar no segundo. As famílias maximizam a sua utilidade intertemporal (U) em função do nível de consumo do primeiro período (ct) e do nível de consumo do segundo período (ct+1). É assumido que a função utilidade das famílias é crescente e côncava (utilidade marginal decrescente), ou seja, a primeira derivada da função utilidade em relação ao consumo é positiva (u'>0) e a segunda derivada é negativa (u''

A utilidade total das famílias corresponde à soma das utilidades dos dois períodos, mas cada período fornece um grau distinto de utilidade. A diferença da utilidade gerada pelo consumo do primeiro período em relação ao consumo no segundo período é dada pelo fator de preferência intertemporal das famílias entre o consumo corrente e o consumo futuro (β).

  1. U=uct+βuct+1, 0

onde β=1/(1+ ρ), e é a taxa de desconto subjetiva.

A maximização intertemporal das famílias está sujeita à restrição orçamentária definida a partir da renda de cada período (yt e yt+1) e da taxa de juros real (r) referente aos empréstimos contraídos e aos empréstimos concedidos. Para efeito de simplificação, as famílias não são tributadas e nem possuem ativos. Assim, a restrição orçamentária intertemporal deverá corresponder à igualdade entre o valor presente do consumo e o valor presente da renda,

  1. ct+ct+1/(1+r) = yt+yt+1/(1+r).

Desta forma, a condição de primeira ordem da utilidade intertemporal (1) sujeita à restrição orçamentária (2) permite a maximização da utilidade intertemporal das famílias:

  1. u'ct+1u'(ct)= 1+r1+ρ.

A equação (3) implica que, para que não exista diferença entre a utilidade marginal do consumo das famílias entre os dois períodos, a taxa de juros e a taxa de desconto devem ser iguais. Por outro lado, quando a taxa de desconto () não coincide com a taxa de juros real (r) duas situações são possíveis: (i) se a taxa de juros for maior que a taxa de desconto (r>ρ), o consumo no período t+1 é maior que no período t, pois o agente superavitário no primeiro período poupa para consumir mais no segundo período; e (ii) se a taxa de juros for menor que a taxa de desconto (r

As famílias não podem investir e nem tomar crédito sem um intermediário, pois não possuem capacidade de monitoramento de projetos ou de consumo. Os bancos realizam a intermediação financeira, cuja origem compreende a necessidade de suavização de consumo de famílias com distintos comportamentos. As famílias superavitárias geram recursos para intermediação (inflows – IF) e as famílias deficitárias precisam de recursos de intermediação (outflows – OF).

Na condição de equilíbrio, quando os bancos podem garantir que o fluxo de entrada é igual ao de saída, pode-se garantir que o processo de intermediação não sofrerá descontinuidade o que, por conseguinte, representa a condição pela qual a estabilidade financeira é garantida. Portanto, o equilíbrio da intermediação financeira é resultado do comportamento das seguintes variáveis: IF - variável que representa as entradas de caixa de um banco qualquer; OF – variável que representa as saídas de caixa de um banco qualquer; e FF – variável que representa o fluxo financeiro resultante do processo de intermediação (equação 6). Na condição de equilíbrio, a entrada de recursos é igual à saída e o fluxo financeiro (FFt) é igual a zero (equação 7).

  1. FFt=IFt-OFt; e

  2. OFt=IFt.

Além das entradas e saídas de caixa, os bancos mantêm reservas (Mt) para fazer frente aos desvios inesperados dos fluxos financeiros. Como os bancos devem manter o fluxo financeiro intertemporal equilibrado para evitar uma descontinuidade no processo de intermediação que pode levar à sua falência, Mt representa uma garantia de não falência para o banco individual e, portanto, Mt deverá ser sempre maior que zero. Esta condição é fundamental, pois as famílias só permitem que os bancos desempenhem seu papel de intermediários na medida em que estes têm sua solvabilidade assegurada ao longo do tempo.

Continua no próximo mês....

Claudio de Moraes – Professor e Pesquisador do Coppead, especialista em Banking, com artigos publicados em diversos periódicos internacionais. Atua no Banco Central do Brasil na área de estabilidade financeira, com experiência em regulação e supervisão bancária.

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