A crise fiscal exacerbada e no limite e a complexidade de fatores que estão envolvidos e que devem ser contornados para que o quadro macroeconômico brasileiro ganhe homogeneidade mínima, além dos problemas na área da saúde pública agravadas pela crise do coronavírus com sinais de recidiva e a absoluta necessidade de evitar corte abrupto nos programas assistenciais às classes menos favorecidas, num ambiente de absoluta exiguidade de recursos por parte do governo, tornam dia a dia mais nebulosa as perspectivas de curto/médio prazos e quase inimaginável no longo prazo.
Neste cenário todo presságio é possível, e o Ministro Guedes continua pontificando diariamente fatos novos que envolvem esperanças, anseios e necessidades absolutas, mas ainda carentes de proposituras consistentes em torno das mesmas e sem as articulações fundamentais, sem o que ficam limitadas a simples ideias colocadas, procedentes é verdade, mas carentes de melhor formalização e indispensável articulação política.
Como temos salientado, são mais “pítacos” para suscitar manchetes e impactos nas manchetes dos jornais e repercussões temporárias no mercado financeiro, típicas de um quadro em que o governo está encurralado por enormes desafios para os quais não tem estratégias claras e pontua uma infinidade de ideias na busca de massa crítica.
O ministro Paulo Guedes, afirmou ontem que depois das eleições municipais há conversas em curso para a realização de mais reformas, destacando ter certeza quanto à aprovação pela Câmara dos Deputados da autonomia formal do Banco Central, projeto que já foi chancelado no Senado, temas requentados e que sabidamente encontrará resistências na Câmara, que deseja antes discutir a Reforma Tributária, que deve ensejar longo período de debates, dada a existência de inúmeros pontos de conflito.
Na Firjan, Guedes destacou que há uma pauta mínima que deve avançar, pois tem baixo custo político e muito retorno social. Em outro evento destacou que poderão ser aprovados até o final deste ano, projeto de modernização da lei de falências, PEC que crie programa fiscal rápido de ajuste nas contas públicas, etc…
Enfim, tudo se houve, mas o ambiente perdura inquietante com desafios relevantes se avolumando e sem que haja a percepção de definições de estratégias factíveis principalmente para as questões pontuais e emergenciais em torno da crise fiscal, inflação em ascendência, pressão sobre o juro e câmbio e o relevante problema envolvendo os programas assistenciais do governo às classes menos favorecidas, que pode ter que ser estendido se a crise da pandemia se prolongar como há sinais primários, o que acentua o risco de mais gastos num ambiente de recursos exíguos.
Ademais, o governo sabe que os seus programas assistenciais foram o grande fomentador do consumo ao longo da crise da pandemia e que permitiu que a economia tivesse oxigenação mínima para recuperação, porém não sabe exatamente em que dimensão, por isso tem visão menos otimista em relação a recuperação do PIB no 4º T e ressalvas quanto a dinâmica de geração de empregos.
Neste ambiente em que “tudo parece funcionar e ninguém sabe ainda o por quê?" as incertezas campeiam e não são poucas.
O governo pode estar esperando chegar a demanda do “overhedge” para vender parte das reservas cambiais ao mercado, algo como US$ 15,0 Bi de dólares que ajudaria a conta fiscal, anseio propagado pelo Ministro Guedes e para o qual é fundamental que haja causa e não somente o anseio e esta seria uma oportunidade.
Embora não seja muito, esta hipótese pode sugerir que o BC não deseje que o preço do dólar seja depreciado precocemente por fatores externos e melhora do fluxo de recursos para o país após longo período, pois diminuiria sua margem de ganho com a eventual venda, já que esta deve ser a ação do BC para a demanda prevista e não a oferta de linhas de financiamento e/ou contratos de swaps cambiais novos.
Não se pode descartar a hipótese de que haverá mais um ano e meio de discussões sobre reformas, privatizações, etc.... e continuaremos “patinando” até ingressarmos outra vez em ambiente eleitoral, quando o acirramento político praticamente inviabiliza avanços para reformas estruturais.
Salvo se o governo materializar as proposituras de suas ideias alardeadas, assumir o protagonismo na implementação das mesmas e construir base de sustentação política consistente, o que, neste momento, não sugere ainda haver ambiente favorável.
Sem isto será difícil o país reconstruir os alicerces da credibilidade e atratividade, e continuaremos convivendo com os desencontros de IPCA projetando-se ao dobro da taxa de juro Selic e a um sexto do IGP-M que reajusta serviços e contratos comerciais, crise fiscal explosiva e incertezas, e, desta forma, os principais ativos do mercado financeiro podem ter comportamento volátil, sem tendências consistentes e confiáveis.
O dólar ontem abriu a R$ 5,3780 e fechou a R$ 5,4341 com alta de 1% enquanto o peso mexicano, também ligado a commodities, teve baixa de 0,66%, o que deixa evidente o impacto dos fatores internos do Brasil na formação do preço local do dólar, ainda que se considere como atenuante o fato do país não ter risco cambial.