Missão impossível
Durante a Segunda Guerra, o comando militar americano reuniu seu melhor time de estatísticos, lógicos, engenheiros, economistas (etc) para fazer previsões meteorológicas para a Europa: como estaria o clima no cenário de guerra para então traçar as estratégias do exército americano.
O time dispunha das melhores mentes e toda a tecnologia disponível na época. Depois de fazer o trabalho durante algum tempo, esse time de grandes mentes começou a perceber que a taxa de acerto era baixíssima. Por mais que se esforçassem, aquilo não tinha embasamento algum. Assim, resolveram enviar uma carta ao alto comando do exército, dizendo que não fazia sentido continuar com aquilo.
A resposta?
"O comandante-geral sabe que as previsões não são boas. No entanto, ele precisa delas para fins de planejamento."
Apesar de você, amanhã há de ser...
Esse causo foi contado por Kenneth Arrow, um dos grandes economistas do século XX, em suas memórias. Arrow participou do time. O mesmo causo foi lembrando recentemente pelo economista Eduardo Gianetti, no último evento da Empiricus, quando em palestra justamente sobre a impossibilidade de se fazer previsão em economia.
Todos entenderam o recado, certo?
Xi....
Qual a primeira pergunta feita ao Gianetti no Q&A? “Qual a sua previsão sobre quem vai ganhar a eleição?”
Quem é mais anti-ético?
Tanto a resposta dos militares quanto a pergunta ao Gianetti levam à mesma questão. Há aqueles que se acham capazes de fazer previsões; e aqueles que não se acham capazes, mas continuam fazendo. Então, pergunto: quem é mais anti-ético: quem topa uma missão impossível, ou quem exige dos economistas uma missão impossível?
Na divisão do trabalho intelectual, a sociedade atribui aos economistas esta função. De alguma forma, eles toparam. Como se o me-engana-que-eu-gosto fosse o melhor caminho. Enrolam-se reciprocamente, e quando os erros aparecem, a culpa recai somente sobre um lado. É obviamente ultrajante a arrogância epistemológica dos sábios das previsões. Mas a sociedade precisa saber de sua corresponsabilidade.
Ensaio sobre a cegueira
Empresas investem com base em cenários projetados. Governos precisam de previsões para formular as suas políticas. O mercado financeiro usa expectativas (baseadas em projeções) para a formação dos preços...
Em economia e finanças estamos sempre trabalhando com premissas heróicas, cenários prováveis. Sem esquecer de entornos perigosos, como o tal ceteris paribus; ou “tudo mais constante”.
Supondo (premissa heróica) que Petrobras de fato produza 4 milhões de barris de petróleo por dia em 2020 (o dobro da produção atual), qual seria o impacto sobre o resultado e as ações da empresa? Não bastasse o problema da suposição em si, há também o problema de como estará “tudo mais”.
E aí, como é se sentir no escuro?
Vivendo em um mundo sem previsões
Admitir que nada sabemos, ou ao menos que somos incapazes de prever o futuro com um mínimo de precisão, não deve ser entendido como um impeditivo. As empresas deixariam de investir, os governos de trabalhar e a economia e os preços de se moverem?
Definitivamente não é a minha proposta.
Dá sim para conviver em um mundo de incerteza e imprecisão (volatilidade), e ser bastante rentável nele. Há uma infinidade de casos para provar. Mesmo o que talvez seja o exemplo clássico (embora clichê) do velho Warren Buffett.
Diferente do Buffett das frases, o Buffett prático é um cara antifrágil. Se o frágil se fere ao choque, seu contrário não é o “resistente” ou o “robusto”, que aguentam o choque, mas sim aquele que se BENEFICIA do choque.
Como a hidra de Lerna, da mitologia. A cada cabeça que se corta dela surgem outras duas no lugar.
Portanto, você tem que gostar da volatilidade, e não condená-la. Se expor de uma forma que perca pouco quando vier uma grande porrada negativa, mas ganhe muito quando a porrada for positiva. Capisce?
Explico...
A partir do momento que você assumiu que não sabe nada, o que lhe resta?
Comprar o mais barato possível e torcer para que as surpresas venham do lado positivo. Assim (barato), o espaço para perder é muito menor do que o espaço potencial para ganhar. Por si só, o próprio ato de comprar barato já é tentativa de fazer as surpresas estarem do lado positivo.
Exemplo prático
Hoje emprestei minha beleza ao Diário de Mercado, video diário normalmente conduzido pelo Rodolfo, que você pode assistir no site da Empiricus. Por lá comentei sobre a polêmica recomendação de Eletrobras.
Polêmica pois não gosto de Eletrobras como empresa, sempre deixei claro. Também por ter subido com base no gatilho eleitoral (expectativa de troca de governo) mesmo sem eu ter me posicionado se acredito ou não em uma vitória da oposição - não que esteja em cima do muro, simplesmente porque não faço ideia do que irá acontecer.
Apenas buscamos a opção mais barata possível (0,2x valor patrimonial), ou a assimetria de retornos possíveis mais aguda com exposição a um provável evento eleitoral.
Um tanto melhor que ELET tem um atrativo extra, o dos dividendos gordos. Hoje a empresa anunciou em seus resultados um lucro de R$ 1 bilhão no primeiro trimestre. Ou seja, ela resolver distribuir o resultado só destes 3 primeiros meses como dividendos para os acionistas, já teríamos um retorno de 10% sobre as ações, mesmo com operacionais frágeis em linhas gerais.
No atual ponto deste rali, o esforço está em identificar as próximas Eletrobrazes As minhas já achei.
Cuidado: armadilha!
O Buffett prático é muito diferente do Buffett das frases, mas os dois sempre buscaram as ações mais baratas. A ideia de antifragilidade pode ser ainda mais simples do que a ideia do Graham, quem inspirou o Buffett.
Polêmica: teriam eles acertado por linhas tortas?
A ideia original do value investing de Buffett e Graham visava comprar barato mas esperar a convergência para o valor intrínseco da companhia. E aqui chegamos ao outro grande problema: o conceito de valor intrínseco é um tanto objetivo, e até então ninguém conseguiu apontar uma fórmula de calcular que não envolva uma imensa dose de previsões sobre o futuro.
Como você vai definir esse Valor Intrínseco? Talvez não haja armadilha de valor, o valor em si é uma armadilha.
A gente se vê.
Para visualizar o artigo completo visite o site da Empiricus Research.