Em dia de ata do Fomc todos os mercados acabaram operando em “correção”, refletindo o que ela disse. Ainda considera a inflação transitória, mas deixou no ar a possibilidade de mudanças à frente, dado o desconforto de alguns diretores com a inflação. Isso acendeu um sinal de alerta entre os investidores. As bolsas recuaram, o dólar se valorizou e no mercado de juro a curva se “inclinou”.
Em síntese, o que interessa é saber quando deve acontecer este desmonte, ou “tapering”, do “Quantitative Easing” (QE), segundo o Fed, dependendo dos “progressos substanciais” nos preços e salários e emprego. Dito de outra forma, se a taxa de desemprego recuar abaixo do equilíbrio, 5% da PEA, e a inflação mostrar não ser “transitória”, é possível que o discurso do Fed comece a mudar.
Por enquanto, mantém a política acomodatícia, na leitura de que repiques de inflação são transitórios, causados pelos gargalos nas cadeias produtivas, em desequilíbrio entre oferta e demanda. Estes são causados pela reabertura da economia. Em alguns setores faltam insumos, o que vem “encarecendo” os bens ofertados. Caso a inflação se propague, este desmonte acabará inevitável. Resta saber quando isso deve ocorrer.
Robert Kaplan, diretor do Fed sem direito a voto, e James Bullard, com direito à voto, acham que o Fed está muito próximo deste debate sobre a retirada de estímulos. Muitos acham que este pode começar a partir de agosto, para o início da retirada dos estímulos no início de 2022 e a elevação do juro básico em 2023. Ainda há uma longa caminhada pela frente. Tudo isso, claro, irá evoluir, dependendo dos dados que forem sendo divulgados. Cabe observar, no entanto, que esta ata refletiu uma reunião do Fomc, ocorrida em abril, antes, portanto, do repique de inflação (CPI em 12 meses a 4,2%) e também de dados de atividade e de emprego (payroll a 266 mil quando se esperava 1 milhão) mais fracos do que o esperado.
Isso tudo acabou se propagando, nesta quarta-feira, como uma bomba por todo os mercados globais.
No Brasil foi dia de correção no mercado de ações, ainda mais para as empresas de commodities, dólar em alta e taxa de juros pressionada. O dólar, que vinha transitando em torno de R$ 5,25/5,20, foi a R$ 5,30 ao fim do dia e por este patamar deve permanecer. Acreditamos, inclusive, que o real deve se manter valorizado no patamar entre R$ 5,30 e R$ 5,40 ao longo do segundo semestre, desde que o nosso ciclo de vacinação se complete e a economia volte a crescer. Achamos também que, por enquanto, a inflação mais elevada nos EUA não deve alterar a estratégia do Fed.
No mercado norte-americano, as bolsas corrigiram nesta quarta-feira (DJ recuou 0,48%, S&P -0,29% e Nasdaq -0,03%), o dólar, pelo DXY, valorizou 0,49%, a 90,191 pontos, acima de 90 pontos depois de muitos dias, e os Treasuries Bonds operaram “esticados”. Os de 2 anos foram a 0,157%, 10 anos dispararam a 1,674% e 30 anos, a 2,37%. Para piorar, as criptomoedas despencaram neste dia e a Covid vem piorando nos países da Ásia, com destaque para Cingapura, Japão e Índia, este em caos ameaçando espalhar uma nova cepa.
No Brasil, o Ibovespa recuou 0,28%, a 122.636 pontos, com giro financeiro de R$ 35,3 bilhões. As maiores quedas ocorreram nas empresas siderúrgicas e de mineração. Na semana, a bolsa avança 0,6%, no mês 3,0% e no ano 3,1%. Já o dólar foi a R$ 5,3158, com valorização de 1,17%, no maior “tombo” do real entre 34 divisas. Na contramão, as commodities recuaram, assim como o barril de petróleo.
Isso se reflete também por um “ambiente político doméstico tóxico” e uma inflação ainda pressionada. A segunda prévia do IGP-M de maio foi a 3,83%, depois de 1,17% no mesmo período de abril, decorrente dos repasses das commodities de minério de ferro, cana de açúcar a soja em grãos. Isso nos leva a acreditar que a inflação ainda é um fator preocupante, o que reforça a necessidade de uma postura mais dura (hawkish) do Banco Central brasileiro. Tudo piora com a falta de chuvas nos reservatórios, o que vem pressionando por reajustes nas tarifas de energia, agora em bandeira vermelha.
Já o açodamento político, por variados fatores, segue o seu curso. Na CPI da Covid foi dia de “oitiva” com o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello que, ao longo de seis horas, negou tudo que lhe era perguntado.
Disse que nunca recebeu ordens do presidente para mudar sua conduta da gestão na Saúde, contradizendo que ele cumpria o que era determinado pelo presidente (lembremos da frase “é simples assim: um manda, outro obedece”); e disse também que não participou das negociações com a Pfizer (NYSE:PFE) (SA:PFIZ34) e que o ministério respondeu “inúmeras vezes” à empresa. Segundo declarações do ex secretário de Comunicação Fábio Wajngarten e do gerente-geral do laboratório na América Latina, Carlos Murillo, não foi isso que aconteceu. Enfim, o depoimento durou cerca de seis horas e foi marcado por várias contradições do ex-ministro.
Esta quinta-feira deve continuar com o ex-ministro Pazuello. Podemos selecionar alguns fatores positivos e negativos nas declarações de ontem. Dentre os positivos, observar que o ex-ministro, apesar de ter passado mal, manteve relativo controle e coerência na maior parte do tempo, além de ter respondido quase tudo e não ter se mostrado acuado. Como negativo, o fato de se observarem muitas contradições, e estas poderão ser confrontadas com documentos hoje (se houver tempo).
No Congresso foi dia também de votação da MP de privatização da Eletrobras (SA:ELET3), o que pode ser favorável ao governo. Se aprovado um modelo consistente, sem invenções, será um alento para a agenda de privatizações e, assim, um bom sinal para o mercado.
Segundo o RR, este fato “representará um contraponto à CPI e à apurações contra o Planalto e alimentará o discurso de que o governo trabalha e busca o interesse do país e das reformas, enquanto a oposição politiza o debate.”
Hoje teremos a retomada das negociações em torno da reforma tributária e da administrativa, ambas em comissão. Será dia também de discurso de Christine Lagarde do BCE.
Bons negócios!