O problema do João
Na última sexta-feira, trouxe a seguinte descrição de personagem:
João tem 28 anos. É um cara extrovertido, e muito inteligente. Ele é formado em engenharia. Como estudante, sempre foi muito ativo e bastante preocupado com questões de discriminação e justiça social, especialmente casos de bullying dentro da faculdade. Nos tempos de faculdade, João estava gordinho. Hoje ele mudou essa história.
Para as possíveis respostas:
Na sua opinião, hoje João é:
(A) Analista financeiro
(B) Decorador de interiores
(C) Analista financeiro e fisiculturista
(D) Corretor de imóveis
(E) Jogador de pólo
(F) Arquiteto
G) Fisiculturista
Com 68% das respostas, a alternativa C venceu a enquete por maioria esmagadora.
Você percebe que esse resultado viola uma regra de lógica elementar?
João de dia, Linda à noite...
Não, o nosso amigo não é decorador de interiores, como afirmou o leitor Felipe (“resolveu assumir de vez”).
Na verdade, não nos importa o que ele de fato é.
Minha pequena pesquisa junto aos leitores do M5M apenas consolida a conclusão de uma pesquisa mais abrangente, conduzida pelo psicólogo israelense (e Nobel de economia) Daniel Kahneman: o “Linda problem”.
Kahneman utilizou a personagem Linda em pesquisa de contexto semelhante ao do nosso João para dar evidências conclusivas sobre o papel de heurísticas de julgamento e de sua incompatibilidade com a lógica nas decisões humanas.
Quando você especifica um possível evento em maior detalhe, só pode diminuir a sua probabilidade. Ou seja, apesar de um possível viés a partir da descrição do personagem, quem apostou na alternativa “C” ignorou a maior probabilidade de “A” ou “G”. Um subconjunto só pode ter probabilidade inferior ao conjunto.
Quem estivesse certo com “C” também estaria se apostasse em “A”, por exemplo, mas teria chances muito maiores de acerto.
Por que tudo isso?
O problema da Linda/João é um problema de finanças comportamentais. Do papel das emoções e ilusões cognitivas que levam os agentes de mercado a cometer erros sistemáticos em cálculos de probabilidade e, por conseguinte, na avaliação de riscos e valor de ativos.
Também mostra como plauseabilidade (todos se atentam às características e buscam uma narrativa histórica) está inclusive à frente da probabilidade e do manual científico. Remetemo-nos, assim, de novo, também à importância da retórica na Economia, conforme bem demonstraram Deirdre McCloskey e Persio Arida, não necessariamente nessa mesma ordem.
A questão em pauta ajuda a explicar as distorções de preços de ativos, a inconsistência de modelos de projeção (ex. modelos de fluxo de caixa descontado e preços-alvo de ações) e a contestar a hipótese de mercados eficientes (de E. Fama) quando levada a rigor.
Ou, por que filosoficamente uma teoria de antifragilidade (de N. Taleb) é superior ao argumento estrito de valor intrínseco (Graham/Buffett).
O prêmio secreto
Peço desculpas por não ter respondido um a um pessoalmente, mas o volume de emails à pesquisa tornou humanamente impossível.
Tanto eu quanto Felipe Miranda temos trabalhos acadêmicos na área de finanças comportamentais, e os resultados obtidos com os leitores do M5M serão utilizados em estudos que estamos elaborando sobre o tema. Portanto, agradeço imensamente a participação de todos. O sonho do Felipe é fazer um livro (o segundo dele) levando a abordagem teórica das finanças comportamentais à prática de investimentos.
Para todos que enviassem respostas, havia prometido o sorteio de um prêmio secreto. Três sortudos levaram a série completa Como Investir em Opções, que possui cinco relatórios.
Temos explorado os exageros e distorções de mercado na Carteira Semanal de Opções, buscando ganhar com a volatilidade. Na maioria das vezes, é melhor apostar em uma assimetria de retornos potenciais do que jogar todas as fichas na alternativa “C”.
O salto da inflação
Passando do interessante ao burocrático, hoje é dia de relatório Focus, bebê.
Chamou atenção o salto da projeção para inflação, que foi de 6,01% para 6,11% da semana passada para esta.
Alguém tem dúvida que o mercado errou na sua avaliação anterior?
Alguém tem dúvida que o Bacen errou em subir a Selic em apenas 25 pontos-base na última reunião?
Os três pontos-chave dos mercados
Os mercados apanharam bem na semana passada. Nosso Ibovespa foi abaixo de 45 mil pontos, buscando seu menor patamar desde 2009, enquanto os índices de ações americanos S&P 500 e Dow Jones sofreram sua pior semana desde janeiro, com China, Crimeia e Fed como pano(s) de fundo.
1. A reviravolta: perspectivas de desaceleração e bolha de crédito na China arrasaram commodities. Em resposta, os governantes locais anunciaram um pacote de urbanização, com a meta de aumentar a população das cidades de 53,7% para 60%. Isso envolve cerca de 90 milhões de pessoas (!). A Vale (VALE5) agradece.
2. O cai no boato, sobe no fato: o referendo devolveu a Crimeia à Rússia por vitória ainda mais esgamadora do que a enquete do João: 97% (!). O resultado era esperado. Talvez tão esperado como o fato de EUA e União Europeia não reconhecerem o resultado. Aqui, a eventual surpresa segue surpresa. Como e de quanto serão as eventuais sanções? As ações de frigoríficos aguardam...
3. O autista: essa semana tem reunião do Fed. As apostas predominantes são de intensificação do tapering, o programa de retirada dos estímulos, com redução de mais US$ 10 bilhões no programa. Com menos dólares circulando, como o dólar (real) deve(ria) reagir?
04:17- Alô, acionistas da Oi
Chegou a hora de partir do manifesto para prática contra a proposta de fusão de Portugal Telecom e Oi. Uma operação que julgamos danosa aos minoritários da Oi e ao mercado de capitais brasileiro.
Em dezembro, publicamos um texto convocando os acionistas da Oi a formalizar suas reclamações, com o objetivo de brecar esse importante retrocesso em termos de governança corporativa.
Agora estamos divulgando um modelo de procuração para facilitar o voto pequeno acionista na assembleia que avaliará a operação, no dia 27. Já que somente a necessidade de viajar até o Rio de Janeiro poderia inviabilizar o plano de união de forças contra o negócio.
Neste link você encontrará as instruções do pedido de procuração. Basicamente, no caso do investidor pessoa física, pede-se cópia autenticada de documento de identificação com foto e comprovante da titularidade das ações da Oi.
E aqui está disponível o modelo a ser preenchido da procuração. A documentação deve ser entregue até o dia 26.
Para visualizar o artigo completo visite o site da Empiricus Research.