Um dia desses, estava ouvindo grandes nomes do movimento de Jazz denominado BeBop – ou, revolução moderna – que marcou a cidade de Nova York (EUA) no início da década de 40 e que representava uma revolta dos músicos ao público da época, assim como, ao denominado “barulho comercial”, e contava com grandes nomes, como: Dizzy Gillespie, John Coltrane, Charlie Parker, Thelonius Monk, Art Blakey, entre tantos outros (HOBSBAWN, 1989).
Nesse dia específico, comecei a refletir um pouco sobre o que conhecia da história do Jazz e, acreditem ou não, comecei a linkar com a história recente do sistema de investimentos alternativos em participação no Brasil - Private Equity (PE) e Venture Capital (VC) -; e, apesar da ligação inusitada (ou um pouco “Workholica”), há uma lógica em meu raciocínio.
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A década de 50 e início dos anos 60 foi um período especial para o Jazz. Grandes nomes como Chet Baker, Miles Davis, John Coltrane, Stan Getz, Art Blakey e muitos outros se apresentavam em lugares icônicos, como o Birdland, lugar bem representado no filme Born to be Blue; aliás, filme que não representou somente o local com maestria, mas também a década de 50 aos olhos do trompetista Chet Baker, enfim, uma década marcada pela florescência de estilos marcantes do Jazz (Hard Bop e Cool) e um ambiente rico.
Ao ter esse breve insight a respeito da indústria musical, e por viver uma imersão no mundo do Venture Capital brasileiro, fiquei analisando o quão semelhantes tais épocas seriam. E, de fato, os últimos anos reportados à indústria de investimentos no Brasil, ou seja, de 2018 em diante, foram marcantes para o VC em projeção midiática, participação na carteira dos investidores (fundraising para os Fundos), e principalmente, em prática de investimentos e desinvestimentos.
Nessa perspectiva, ao aproximar por analogia o Jazz dos anos de 1950-1960 e o Venture Capital de 2018-2021, ficou claro para mim que o VC iniciou um movimento de crescimento semelhante ao movimento de ascensão daquele gênero musical.
Apesar dessa provável semelhança entre matérias bem distintas, ao analisar numericamente a evolução do setor de investimentos em participação no mercado brasileiro, ou seja, ao verificar os dados de PE e VC, mais especificamente a partir de 2015, observei que o VC detinha uma participação irrelevante no setor de investimentos alternativos. De forma resumida, os dados demonstram que em: (1) 2015 e 2016, o PE participou de 93% dos R$ 18,5 (2015) e R$ 11,3 (2016) bilhões de investimentos da indústria, e o VC com cerca de 7% restantes em ambos os anos, e (2) 2017, o PE teve participação de 94% dos R$ 15,2 bilhões de investimentos da indústria, e o VC com cerca de 6% restantes. Apenas em 2018, o Venture Capital passou a ter uma participação relevante no mercado brasileiro de investimentos em participação, de forma que em: (1) 2018, o VC participou de 44% dos R$ 13,5 bilhões de investimentos, (2) 2019, o VC teve participação de 42% dos R$ 25,6 bilhões de investimentos, (3) 2020, o VC participou de 62% dos R$ 23,6 bilhões de investimentos, e por fim (4) 1T21, o VC teve participação de 82% dos R$ 10,7 bilhões de investimentos (ABVCAP, 2020 e 2021).
Somados os fatos da recente história do VC e a perspectiva positiva para o segmento, e mencionando o relato feito pelos amantes de Jazz de que “revisitar Nova York depois de 1963 era uma experiência deprimente para àqueles que amavam o Jazz e haviam participado da cena até os anos 60” (HOBSBAWN, 1989), indicando perda de relevância do gênero, decidi, nesse momento de reflexão, adicionar um terceiro elemento para compor a análise: o Rock n’ Roll (Rock) dos anos 50 e 60.
O Rock n’ Roll foi um movimento iniciado em 1955 com três principais inovações: (1) Tecnologia; (2) Conceito de “conjunto”, ou seja, fomento de uma unidade coletiva em detrimento a um grupo de “virtuosos” demonstrando habilidades; e (3) Ritmo insistente e palpitante (HOBSBAWN, 1989).
Além dessas e outras inovações, um grande estado de transformação foi observado na cena musical com o surgimento do Rock n’ Roll. A partir do ano de nascimento do Rock (1955), as vendas de discos nos Estados Unidos cresceram cerca de 35% ao ano, marcando US$ 600 MM em 1958 contra US$ 227 MM em 1955, e chegando a mais de US$ 2 BI em 1973 – dos quais, 75%-80% representavam o Rock n’ Roll e estilos afins. A composição era tão desigual, que por volta de 1972, quando as vendas de discos já estavam próximas dos US$ 2 BI, o Jazz detinha 1,3% do Market Share, a música clássica 6,1%, enquanto o Rock já havia conquistado os 75% de participação (HOBSBAWN, 1989).
Todas essas características do Rock podem, de certa forma, se ligar ao VC. Num primeiro aspecto, o VC liga-se fortemente à tecnologia pela própria característica das empresas investidas – Startups; num segundo, o VC se desenvolve consistentemente a partir de um ecossistema que propicia sua existência plena, ou seja, um ecossistema de inovação com recursos, empresas a serem investidas, incentivos estruturais, entre outros – o que pressupõe uma consciência de “conjunto”; em terceiro, o VC é dotado de profissionais, empreendedores, gestores, intelectuais, e outros participantes que realizam seu trabalho e promovem o segmento de forma vigorosa; e num último aspecto, o VC tem sido competente na atração de capital e aumento dos investimentos realizados, fortalecendo a relevância dos investimentos alternativos em participação no Brasil e liderando o atual cenário dessa classe de aplicação.
Lógico que, guardadas as devidas diferenças, consigo perceber semelhanças entre o Venture Capital após o ano de 2018 e o Rock n’ Roll de tempos atrás. Dessa forma, acho difícil não esperar que perspectivas gloriosas para o Venture Capital Brasileiro só estão começando. E diante desse cenário promissor no mercado de investimentos, deixo a seguinte analogia: Let there be Rock, Let there be Venture Capital.