As condições de mercado não são das mais favoráveis para as ações das empresas de varejo, tanto no aspecto macroeconômico quanto em relação ao nível de otimismo do mercado acionário com a bolsa brasileira.
Em função das incertezas relativas à intensidade e à duração do efeito inflacionário pós-pandemia, os bancos centrais ao redor do globo estão sinalizando elevações nas taxas básicas de juros de suas economias.
No cenário doméstico, a situação ainda é agravada pelo fato de que nossa situação fiscal já não era das melhores antes da pandemia e ainda estamos vendo uma pressão por uma elevação dos gastos públicos neste período pré-eleições, o que fez com que os nossos juros futuros subissem ainda mais do que no resto do mundo.
Com isso, o mercado de varejo acaba sendo um dos que mais sofrem com os efeitos causados pela inflação em alta, fluxo de circulação nas lojas ainda abaixo dos níveis regulares e pelo baixo poder de compra atual da população.
A tese de reabertura fracassou
Em função do salto no varejo online durante a pandemia (2019) e da crença de que a demanda no varejo físico voltaria com mais força após a vacinação e reabertura econômica, os investidores precificaram as empresas de varejo quase que à perfeição, sem olhar para os múltiplos esticados.
Contudo, como as vendas acabaram não saindo como esperado (2020 e 2021) e somado aos resultados fracos no varejo, as companhias desabaram ao frustrar as expectativas do mercado.
É hora de investir em ações das varejistas?
Se você já tem ações de varejistas brasileiras deve estar amargando um prejuízo bem grande.
Via
A Via (SA:VIIA3) apresentou resultados do 3T21 abaixo das expectativas do mercado, com forte impacto contábil. Os resultados sem os efeitos contábeis também não foram satisfatórios.
Em 2021, diante da evolução do estágio processual da carteira de reclamações trabalhistas, a Via atualizou o montante referido a provisões em 1,2 bilhão. O impacto nas despesas com o provisionamento no 3T21 foi de 887 milhões de reais, o que é consideravelmente alto (quase 10 por cento da receita bruta do trimestre).
A companhia possui um plano de ação baseado em créditos tributários em um montante consideravelmente superior ao impacto trabalhista atual para eventualmente compensar o efeito caixa, porém, há dois problemas com essa estratégia: (i) a probabilidade da Companhia conseguir ganhar uma ação tributária do governo é menor do que receber uma condenação trabalhista e (ii) há uma diferença na linha do tempo entre o fluxo de pagamento de ações trabalhistas e a reversão de créditos tributários no balanço da companhia.
No nosso entendimento, mesmo considerando dados positivos no e-commerce, o resultado operacional ligado à performance nas lojas físicas no 3T21, que são os dados que temos até o momento, está aquém do esperado. A companhia encontra dificuldades em conseguir retomar o faturamento das lojas para um patamar relativamente próximo do que era na pré-pandemia.
No gráfico, observamos os resultados da companhia ao longo dos últimos anos. Vemos que, desde 2015, o preço de tela (linha azul) acompanha a queda dos resultados (linha verde).
Fonte: Bloomberg
Em vista dos resultados ruins, nos preços atuais, Via não é um bom investimento no momento. O provisionamento trabalhista não só reflete nos resultados como também cria um sério problema de confiabilidade na governança corporativa da Via, o que pode enfraquecer os ganhos operacionais que a empresa possa vir a auferir entre, pelo menos, os dois próximos trimestres de 2022.
Magazine Luiza
No 3T21, o fraco crescimento na receita da Magazine Luiza (SA:MGLU3) (+3,7 por cento) com as provisões nos estoques, a maior participação do online e do marketplace nas vendas (que tem margem menor que das lojas físicas) e maiores gastos com marketing, tendo em vista a entrada de players asiáticos no país (Shopee) e a competição local mais agressiva, fizeram com que o lucro do Magalu caísse -89,5 por cento no 3T21.
Soma-se a tudo isso o fato de as ações terem alcançado um patamar de preço, na metade de 2021, que dificilmente o Magalu conseguiria justificar com seus fundamentos no longo prazo. Mesmo que a empresa venha crescendo a cada dia, aperfeiçoando o seu ecossistema, se digitalizando ainda mais, realizando importantes aquisições e melhorando toda a sua logística, o preço ainda estava muito distante do seu valor e não era razoável o suficiente para cobrir os riscos e incertezas do negócio.
Essa combinação inoportuna de fatores é o que está causando uma forte pressão vendedora nos papéis da empresa e, ao menos no curto prazo, não há muita perspectiva de que a situação se reverta. Mesmo com as quedas recentes que chegaram a mais de 70 por cento, isso não significa necessariamente que as ações estejam baratas, e o cenário atual ainda é um fator de preocupação.
Assim sendo, como falamos em relação a Via, o momento para o Magalu também não é muito favorável.
O veredito
As incertezas em relação ao macro continuarão presentes pelo menos até as eleições deste ano, as expectativas de recuperação econômica não são das melhores no momento, e a competição da empresa deve permanecer com um comportamento mais agressivo, ao menos no curto prazo.
Assim sendo, faz mais sentido esperar por sinalizações concretas de mudança deste cenário antes de montar uma posição em Via ou Magalu, mesmo que às custas de abrir mão de parte do movimento inicial de alta quando o humor do mercado mudar em relação às varejistas.