Novo mapa da riqueza: Mudança na tributação redesenha planejamento patrimonial

Publicado 15.07.2025, 16:30

As famílias brasileiras de alta renda estão enfrentando uma ofensiva tributária sem precedentes sobre seus ativos no exterior. Uma ampla reforma (Lei nº 14.754/2023), em vigor a partir de 2024, pôs fim ao antigo diferimento de impostos sobre rendimentos no exterior, marcando a mudança mais significativa no regime tributário brasileiro para rendas estrangeiras. Agora rendimentos de ativos fora do país, incluindo empresas offshore, trusts, criptoativos e contas bancárias estrangeiras, passaram a ser tributados anualmente a uma alíquota fixa de 15%, paga na declaração anual de imposto de renda.

As novas regras têm um alcance extenso. Agora, o termo offshore” cobre praticamente qualquer ativo ou estrutura no exterior: de depósitos bancários remunerados e contas de valores mobiliários a ativos virtuais” e carteiras digitais em exchanges estrangeiras. Os trusts, usados por muitos brasileiros ricos para planejamento sucessório, foram explicitamente incluídos no radar tributário. Na prática, eles deixam de ser blindagem fiscal: distribuições são tributadas como doação ou herança quando realizadas.

Ao mesmo tempo, o Brasil revogou isenções que antes beneficiavam elites globais. O efeito acumulado é um sistema que tributa, em tempo real, a acumulação de riqueza global, fechando brechas que antes permitiam que fortunas offshore crescessem sem impostos.

O programa da declaração de IR de 2024 foi atualizado e agora é preciso informar detalhes antes ignorados, como saldo final de cada conta ou entidade offshore sob o campo rendimentos abrangentes”, o qual será alvo de atenção especial da Receita. Isso força a transparência de informações que antes ficavam escondidas em balanços financeiros offshore, munindo a Receita com dados para detectar ocultação ou diferimento de lucros. O Brasil também aderiu ao padrão global de troca automática de informações (CRS), reduzindo ainda mais o sigilo.

O governo estendeu o cerco a fundos exclusivos e outras estruturas fiscalmente eficientes usadas pelos ultra-ricos, com o come-cotas” semestral sobre fundos fechados, garantindo a tributação de ganhos não realizados duas vezes ao ano. Também foi proibida a criação de fundos de previdência exclusivos acima de R$ 5 milhões por pessoa, medida que visou conter uma migração de ativos para essas estruturas após o aperto sobre offshores. Com cerca de R$ 1 trilhão em ativos brasileiros em estruturas offshore e outros R$ 750 bilhões em fundos exclusivos, os riscos fiscais são enormes.

Seja nas Ilhas Cayman ou em um fundo privado no Rio, as autoridades brasileiras pretendem proteger a arrecadação fechando brechas. Gestores de patrimônio devem assumir que qualquer estrutura criativa pode ser alvo de mudanças repentinas ou escrutínio.

Diante desse ambiente doméstico mais severo, indivíduos de alta renda e family offices estão olhando mais para o exterior, tanto para seus ativos quanto para si mesmos. Muitos buscam a diversificação jurídica, obtendo segunda residência ou cidadania e transferindo domicílio fiscal para fora do alcance do fisco brasileiro. Alguns se mudam fisicamente, outros apenas garantem um plano B”, como um Golden Visa ou passaporte europeu por descendência.

Em 2024, cerca de 800 milionários deixaram o Brasil, e a estimativa é que esse número chegue a 1.200 em 2025: maior êxodo de riqueza da América Latina. O Brasil está entre os 5º e 6º países do mundo com maior saída líquida de milionários, que levam consigo mais de US$ 8 bilhões. Ao longo da última década, a população de milionários no país já encolheu 25%.

Esses expatriados buscam países que garantam segurança, estabilidade política, alta qualidade de vida e eficiência tributária. Destinos como Estados Unidos (principalmente a Flórida), Portugal, Ilhas Cayman, Panamá, Costa Rica e Uruguai estão entre os preferidos. Contudo, Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, destacou-se em 2024 como o principal destino mundial para milionários, atraindo 6.700 novos residentes com alto poder aquisitivo.

Dubai oferece isenção total de imposto sobre renda, ganhos de capital e herança. Com infraestrutura moderna, segurança excepcional, vistos de longa duração e políticas altamente favoráveis aos negócios, o Emirado tornou-se conhecido como a "Suíça tropical com praias", nas palavras de um gestor brasileiro.

A estratégia fundamental dos Emirados para atrair essa elite financeira consiste em oferecer máxima flexibilidade aos investidores. Muitos desses milionários mantêm sua residência fiscal em Dubai sem necessidade de morar permanentemente no país, dividindo seu tempo entre seus países de origem e outras residências pelo mundo. Essa estrutura permite que eles estejam livres de impostos globais sem precisar de complexas estruturas como trusts ou empresas offshore. Um investidor pode manter sua residência em Dubai sem se quer passar um dia por ano lá.

Adicionalmente, algumas empresas especificamente autorizadas pelo governo emiradense oferecem acesso facilitado ao cobiçado Golden Visa sem a exigência obrigatória de investimentos diretos no país. Essa abertura seletiva visa atrair exatamente o perfil desejado pelos Emirados, sem contrapartidas imediatas, refletindo a segurança e confiança que o país deposita em sua estratégia.

Os Emirados lideram essa tendência por serem integralmente voltados para investidores e empreendedores, enquanto outros países possuem múltiplas prioridades concorrentes. Os brasileiros, especificamente, estão começando a descobrir que é possível manter residência fiscal em Dubai enquanto vivem entre Brasil, EUA e Europa, desde que não ultrapassem seis meses consecutivos em nenhuma dessas jurisdições.

Para o investidor moderno e profissional, ter uma única base deixou de ser suficiente. Diversificar jurisdições é agora o ponto de partida essencial em qualquer planejamento patrimonial estratégico. E hoje o centro magnético, a sede dos milionários do futuro, é Dubai.

Portugal também segue atraente, mesmo após ajustes no regime de Residente Não Habitual (NHR). Suíça e Uruguai aparecem como opções para quem busca proximidade ou estabilidade. No Uruguai, novos residentes podem ter isenção de IR por 11 anos sobre rendimentos externos, um atrativo para brasileiros que desejam escapar da tributação global sem sair da região.

Muitos brasileiros estão reavaliando holdings offshore à luz das novas regras – encerrando estruturas, adotando regimes transparentes ou usando tratados internacionais. Planejamentos antes da mudança de residência são essenciais: por exemplo, se mudar para os EUA exige ajustes para evitar o imposto sucessório americano, que pode chegar a 40%. Já em Portugal, planejava-se qualificar para o NHR antes das mudanças, usando trusts ou doações familiares isentas.

Mesmo quem permanece no Brasil está documentando tudo com rigor para evitar penalidades. O uso de tratados para evitar bitributação, compensação de prejuízos e estruturas como seguros de vida luxemburgueses também se popularizou. A nova lei exige que os trustees de trusts concordem explicitamente com a tributação brasileira em até 180 dias, sob pena de penalidades.

As mudanças rápidas vindas de Brasília são um alerta. Investidores brasileiros estão percebendo que, para proteger e ampliar seu patrimônio, precisam pensar globalmente e agir de forma estratégica. A ideia de que se pode ser cidadão de um país, mas financeiramente cidadão do mundo, está ganhando força. Diversificar residências, jurisdições e estruturas virou estratégia de proteção e liberdade.

Se o Brasil continuar apertando o cerco sem considerar a competitividade, corre o risco de expulsar os que mais investem e geram empregos. Mas essa é também uma oportunidade para que os investidores brasileiros adotem uma mentalidade mais global, pensando em onde vale a pena alocar seu capital e seu futuro. O investidor do futuro se pergunta: Qual país merece sediar meu patrimônio?” A resposta moldará seu destino.

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