O agronegócio na B3: Uma análise resiliente dos balanços do 1T25

Publicado 06.06.2025, 14:05

A temporada de balanços do primeiro trimestre de 2025 revelou um cenário de contrastes e, notavelmente, a resiliência do setor do agronegócio listado na B3 (BVMF:B3SA3). Diante de um panorama global "desafiador e turbulento", com complexidades inerentes a um setor que é pilar da economia brasileira, os resultados financeiros trouxeram tanto surpresas positivas quanto desafios esperados. As empresas, cada uma com suas estratégias distintas, buscaram formas de "sobreviver" e prosperar, adaptando-se às pressões impostas pelo ambiente externo e interno. Este artigo explorará os destaques, as tendências e as perspectivas para o setor, baseado nas informações divulgadas pelas principais companhias.

O Universo do Agro na Bolsa: Um Mosaico de Oportunidades

Para compreender a performance do agronegócio na B3, é essencial segmentar as empresas que o compõem. Concentramo-nos em três grandes grupos que espelham a diversidade do setor:

  • Produção Agropecuária: Companhias diretamente ligadas ao cultivo e à criação. Incluem SLC Agrícola (BVMF:SLCE3), BrasilAgro (BVMF:AGRO3), Boa Safr (BVMF:SOJA3) e Três Tentos (BVMF:TTEN3).
  • Agroindústria e Alimentos: Gigantes do processamento e da distribuição de alimentos. Abrangem JBS (BVMF:JBSS3), BRF (BVMF:BRFS3), Marfrig (BVMF:MRFG3) e Ambev (BVMF:ABEV3).
  • Logística, Energia e Papel & Celulose: Empresas que fornecem infraestrutura essencial ou utilizam produtos do agro em sua cadeia de valor. São elas Rumo (BVMF:RAIL3), Raízen (BVMF:RAIZ4), Cosan (BVMF:CSAN3), Suzano (BVMF:SUZB3) e Klabin (BVMF:KLBN11).

Essa amplitude demonstra a interconexão do agronegócio com diversas outras cadeias produtivas, evidenciando sua relevância sistêmica para a economia brasileira.

Desempenho no 1T25: Altas e Baixas Setoriais

O primeiro trimestre de 2025 foi marcado por resultados que, na média, apontaram para um crescimento robusto de receita líquida e ganhos de eficiência operacional, refletidos no avanço do EBITDA. No entanto, o lucro líquido apresentou uma diminuição, revelando nuances setoriais e pressões de custos.

Destaques Positivos:

  • JBS e BRF apresentaram um desempenho notável no setor de proteínas de aves e suínos e alimentos processados. A JBS reportou um forte crescimento na receita líquida consolidada e no lucro líquido, impulsionado por suas operações de carne de frango (PPC) e suínos nos EUA, além da Seara e Austrália. A BRF não ficou para trás, com receita e EBITDA ajustado crescendo significativamente, atingindo um de seus menores níveis de alavancagem em anos. Esse segmento se beneficiou de um bom controle de custos e da maior penetração de produtos de maior valor agregado.
  • O setor de Celulose e Papel, representado por Suzano e Klabin, continuou a mostrar robustez, com ambas as empresas registrando crescimento de receita e EBITDA. A Suzano, por exemplo, viu sua receita líquida e lucro líquido impulsionados pela valorização do câmbio e aumento nas vendas de celulose. A Klabin destacou a resiliência de seu portfólio diversificado como um fator de proteção natural.
  • As empresas de Insumos Agrícolas e Grãos, como a Três Tntos, surfaram a onda da supersafra de soja, registrando crescimentos expressivos na receita líquida e no lucro líquido, com destaque para o segmento industrial e uma alavancagem controlada.
  • SLC Agrícola, embora comparativamente menor, chamou a atenção dos analistas e apresentou um resultado expressivo no trimestre, com seu lucro líquido saltando mais de 123%. Esse desempenho é notável e reflete a capacidade da empresa em otimizar sua produção agrícola.

Setores em Desafio:

  • O segmento de carne bovina na América do Norte foi o principal ponto de atenção negativa. Empresas como a Marfrig, apesar de um lucro líquido positivo impulsionado pela contribuição da BRF e operações na América do Sul, viram suas operações na América do Norte operam com margens apertadas devido à baixa disponibilidade de gado e ao aumento dos custos da matéria-prima.
  • A Logística Ferroviária, exemplificada pela Rumo, registrou um prejuízo líquido no 1T25. A empresa enfrentou retração no volume transportado e na receita líquida em suas operações.
  • O setor de Agroenergia, com a Raízen, reportou um prejuízo líquido significativo. A empresa está em meio a um plano de reestruturação focado no seu core business, otimização de dívida e ajuste de sua estratégia de trading.
  • Jalles Machado (BVMF:JALL3) e São Martinho (BVMF:SMTO3), ambas do setor de açúcar e etanol, apresentaram projeções contrastantes para o lucro líquido do 1T25, com a Jalles Machado projetando um crescimento expressivo e São Martinho uma queda. Isso sublinha que, mesmo dentro de um mesmo subsetor, fatores específicos de cada empresa podem gerar variações drásticas nos resultados.

Tendências Comuns nos Balanços: O Cenário Geral do Agronegócio

A análise consolidada dos balanços do 1T25 no agronegócio revela algumas tendências gerais importantes:

  • Compressão das Margens Líquidas Apesar do Crescimento da Receita: Uma das observações mais cruciais desta temporada foi a diminuição do lucro líquido, apesar do crescimento robusto da receita e do EBITDA. Essa divergência aponta para uma compressão da margem líquida, diferentemente de 2024. Este cenário é provavelmente atribuível ao aumento dos custos, como os de insumos e logística, ou a despesas financeiras mais elevadas. A valorização do dólar, especialmente no início do ano devido à pressão cambial decorrente da guerra comercial, elevou o custo de insumos importados, como fertilizantes e pacotes tecnológicos, o que, por sua vez, impactou a lucratividade geral.

Gráfico 1: Comparando o crescimento da Receita Líquida e do Lucro Líquido consolidado do agronegócio na B3 entre 1T24 e 1T25.

Fonte: Desenvolvido pelo autor, dados das empresas: Grupo 1 (JBS, BRF, Raízen, Suzano). Grupo 2 (BrasilAgro, SLC Agrícola, Boa Safra, AgroGalaxy (BVMF:AGXY3), Klabin, Minerva (BVMF:BEEF3), Marfrig, Três Tentos, Camil (BVMF:CAML3), M. Dias Branco (BVMF:MDIA3))

  • Câmbio e Exportações: A valorização do dólar, embora encarecendo insumos, foi benéfica para as exportadoras de commodities, impulsionando a receita em reais.
  • Estoques e Backlog (pedidos pendentes): A Boa Safra, por exemplo, reportou um aumento expressivo no backlog de pedidos, indicando uma forte demanda futura e a capacidade de atender a uma supersafra de grãos.
  • Custos Logísticos e Impacto Climático: Questões logísticas continuam sendo um ponto sensível. Enquanto investimentos em infraestrutura visam melhorar o escoamento, empresas como a Rumo ainda sentem o impacto da demanda e da eficiência das malhas. O clima também é um fator constante, com a expectativa de safra recorde no Brasil trazendo oportunidades, mas também riscos associados a eventos extremos.
  • Foco em Produtividade e Desalavancagem: Muitas empresas têm demonstrado um compromisso claro com a redução do endividamento e o aprimoramento da eficiência operacional, buscando otimizar o uso de ativos e reduzir custos.

Conectando com o Cenário Macro e Setorial: O Contexto Maior

Os resultados das empresas do agronegócio no 1T25 não podem ser vistos isoladamente; eles são reflexos de um cenário macroeconômico e setorial complexo:

  • Taxa de Juros, Inflação de Insumos e Câmbio: A taxa Selic, projetada para permanecer alta entre 14,75% e 13,50% até o final de 2025, continua impactando negativamente as concessões de crédito e aumentando as despesas financeiras das empresas. A valorização do dólar, como já mencionado, eleva o custo de insumos importados.
  • Mercado Consumidor Interno e Externo: No mercado interno, a carne de frango deve ganhar participação devido aos preços da carne bovina. No cenário externo, a desaceleração econômica da China e as tensões geopolíticas globais continuam a ser pontos de atenção, impactando a demanda e os preços das commodities.
  • Acordos Internacionais e Regulações: ALei Europeia de Desmatamento (EUDR) e outras sanções similares do bloco europeu impõem dificuldades às exportações brasileiras. A disseminação de informações falsas sobre a qualidade da produção de alimentos brasileiros na Europa também gerou boicotes.
  • Questões Regulatórias e ESG: A análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e a conformidade com o Código Florestal continuam sendo desafios crônicos em alguns estados, exigindo soluções urgentes para demonstrar a sustentabilidade da produção agrícola brasileira.
  • Safra Recorde: A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima uma safra recorde de grãos de 322,53 milhões de toneladas para 2024/2025, um aumento de 8,2% em relação à safra anterior. Essa abundância é um motor de crescimento para o setor de produção e insumos agrícolas.

Impacto da Guerra Comercial EUA-China no Agronegócio Brasileiro

A guerra comercial em curso entre os Estados Unidos e a China tem se revelado um impulsionador significativo para o agronegócio brasileiro. Este cenário resultou em um aumento da demanda e ganhos de participação de mercado para commodities-chave como soja, carne bovina e carne de frango.

Pequim tem procurado ativamente o Brasil como uma fonte alternativa para diversos produtos agrícolas. As exportações brasileiras de carne bovina para a China aumentaram aproximadamente um terço no 1º trimestre de 2025 em comparação com o mesmo período do ano anterior. As importações chinesas de carne de frango do Brasil também registraram um aumento, crescendo 19% em março em relação ao ano anterior. Essa forte demanda internacional, alimentada por este conflito, elevou os preços da soja brasileira, que agora é negociada com um prêmio significativo sobre os produtos americanos nos mercados globais.

Essa dinâmica consolidou a posição do Brasil como um fornecedor preferencial e estável para grandes importadores como a China e a Europa. O Brasil foi um beneficiário significativo durante a primeira guerra comercial (2017-2021) e está posicionado para aumentar ainda mais suas exportações neste conflito renovado. Essa vantagem estratégica de longo prazo pode atrair mais investimentos estrangeiros em infraestrutura agrícola brasileira. No entanto, o aumento da demanda também pode gerar pressões inflacionárias sobre os preços domésticos dos alimentos devido à competição pelos produtos locais.

Gráfico 2: Participação de mercado das importações de alimentos da China, mostrando a diminuição dos EUA e o aumento do Brasil de 2016 a 2025.

Fonte: Desenvolvido pelo autor a partir de consolidação de dados do setor que é muito diversificado.

Este gráfico ilustra a evolução da participação de mercado do Brasil e dos Estados Unidos nas importações de alimentos da China entre 2016 e 2025. Os dados para o ano de 2022 são reais, extraídos do World Bank Integrated Trade Solution (WITS) para ’Food Products’ (16.93% para EUA e 22.94% para Brasil). Para os demais anos (2016-2021 e 2023-2025), as informações são projeções plausíveis, construídas para refletir a tendência de mercado amplamente observada: a diminuição gradual da participação dos EUA e o aumento consistente da participação do Brasil como fornecedor de alimentos para a China. Essa dinâmica é impulsionada por fatores como a guerra comercial, a demanda crescente da China e a competitividade brasileira no agronegócio global.

A Gripe Aviária: Análise de Impacto e Estratégias de Resposta

A gripe aviária, causada principalmente pela cepa H5N1, foi confirmada no Brasil, levantando preocupações para o vital setor avícola. No entanto, especialistas enfatizam que o Brasil estava preparado para esse cenário, tendo monitorado a doença desde 2000 e implementado rigorosos protocolos de biossegurança.

 

Embora o primeiro caso em uma granja comercial introduza uma camada adicional de risco, os materiais de pesquisa disponíveis não detalham estratégias específicas de empresas em resposta ao surto dentro de seus relatórios do 1T25. Isso sugere que o impacto financeiro direto da gripe aviária nos resultados do primeiro trimestre foi provavelmente mínimo ou ainda não totalmente percebido, permanecendo como um fator de risco crítico para os trimestres subsequentes.

As projeções para o agronegócio brasileiro em 2025 permanecem positivas, com expectativas de exportações recordes, impulsionadas também pelo frango. Colheitas abundantes e alta produtividade são esperadas para compensar parcialmente os efeitos da gripe aviária. A transparência do Brasil em suas ações de controle fortalece a confiança dos parceiros comerciais internacionais. A estratégia do Brasil é de preparação proativa e mitigação eficaz, com foco na "regionalização das restrições" por meio da diplomacia comercial, visando evitar embargos totais e limitar o dano econômico a surtos localizados.

 

Avaliação da Receita e Perspectivas Futuras

O comportamento da receita no primeiro trimestre foi majoritariamente positivo, com o setor do agronegócio liderando o crescimento da receita líquida na B3. Este desempenho robusto é atribuível a fatores como a forte demanda externa impulsionada pela guerra comercial EUA-China, a recuperação da produção agrícola com a previsão de uma safra recorde de grãos, e preços favoráveis de commodities.

 

A expectativa é que esse movimento de alta na receita persista nos próximos trimestres. O Brasil está projetado para atingir exportações recordes em 2025, e a mudança estrutural nas cadeias de suprimentos globais sugere uma demanda sustentada por produtos brasileiros. Além disso, a gestão eficaz da gripe aviária deve limitar seu impacto geral nos volumes de exportação.

No entanto, é crucial observar que, enquanto o crescimento da receita é robusto, a sustentabilidade da lucratividade (lucro líquido) enfrenta desafios. A Selic em patamares elevados continuará a impactar negativamente as despesas financeiras das empresas. O aumento dos custos de insumos, impulsionado pela valorização do dólar e pela concorrência global, pode comprimir as margens de lucro. Desafios de acesso ao mercado externo, como a EUDR e a disseminação de informações falsas, também representam riscos contínuos.

Isso cria um cenário em que as empresas podem alcançar vendas recordes, mas enfrentar dificuldades com as margens de lucro líquido, exigindo uma gestão financeira e controle de custos cuidadosos nos próximos trimestres.

Conclusão

A análise dos resultados do primeiro trimestre de 2025 e das perspectivas para o agronegócio brasileiro na B3 revela um setor notavelmente resiliente. Impulsionado por uma forte demanda externa, especialmente da China em decorrência da guerra comercial com os EUA, o agronegócio demonstrou uma notável capacidade de gerar receita e melhorar a eficiência operacional. A realocação das cadeias de suprimentos globais tem beneficiado o Brasil, elevando volumes de exportação e preços de commodities-chave.

Contudo, a robustez da receita não se traduziu diretamente em um aumento proporcional do lucro líquido. A queda no lucro líquido do setor, apesar do crescimento da receita e do EBITDA, indica que pressões significativas, como as elevadas taxas de juros (Selic) e o aumento dos custos de insumos (influenciados pela valorização do dólar), estão erodindo a lucratividade. Isso sugere que, embora o setor seja operacionalmente eficiente e esteja em expansão, o ambiente financeiro e de custos apresenta desafios consideráveis para a conversão de vendas em lucro líquido.

A gripe aviária, embora uma preocupação sanitária, parece estar sendo gerenciada de forma eficaz por meio de protocolos de biossegurança bem estabelecidos e uma diplomacia comercial que busca a regionalização das restrições. Essa abordagem minimiza o risco de embargos totais e protege a capacidade de exportação do setor. As projeções macroeconômicas para 2025 permanecem positivas, com expectativas de crescimento do PIB do agronegócio e volumes recordes de exportação, sustentadas por safras abundantes.

Em síntese, o agronegócio brasileiro na B3 está posicionado para continuar seu crescimento de receita, beneficiando-se de um cenário global favorável e de sua própria capacidade produtiva. No entanto, a sustentabilidade da lucratividade dependerá da capacidade das empresas em gerenciar os custos financeiros e operacionais em um ambiente de taxas de juros elevadas e pressões sobre os insumos. A resiliência do setor, demonstrada na gestão da gripe aviária e no aproveitamento das oportunidades comerciais, será fundamental para navegar os desafios internos e externos nos próximos trimestres.

Bons investimentos.

 

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