Essa ação é minha queridinha há muito tempo.
Tudo começou em março de 2016, quando eu descobri que o FGC (Fundo Garantidor de Crédito) tinha risco de crédito e sua disponibilidade era apenas 2,3 por cento daquilo que ele garantia.
Pensando nisso, era preciso analisar banco a banco antes de se investir em um CDB, LCI ou LCA.
Decidi fazer uma lista de uns 30 bancos para os meus clientes, mostrando se eles eram ou não confiáveis para investimento.
Numa dessas, conheci o Banco Pan (SA:BPAN4).
O primeiro balanço do banco que vi foi este:
O prejuízo acumulado crescia a cada trimestre!
Era um banco que ninguém gostava. Acho que muito em função do histórico de escândalos. Nos eventos da APIMEC, só ia eu, meia dúzia de gato pingado e o Carlos Herrera (que eu arrastava comigo para algumas reuniões).
Um filho com pais ricos
Depois de muito estudo, em setembro de 2016, eu escrevi um relatório recomendando investimentos de até 6 meses no banco, mas avisando que era uma aposta muito arriscada!
O racional do meu voto de confiança foi baseado em 2 pilares que são extremamente importantes para se entender o caso do banco:
1) Com a compra do Banco Pan pela Caixa e pelo Pactual em 2011 e 2010, o banco conseguiu um funding artificialmente barato –que ele não teria se esses dois gigantes não estivessem lá dentro. Isso viabilizou uma série de operações, como o crédito consignado.
O crédito consignado tem um spread bem mais baixo do que os outros empréstimos, pois é considerado de menor risco. O banco desconta as parcelas da dívida diretamente do salário do funcionário público ou aposentado, sendo que o pagamento tem risco governo (menor do mercado).
Por conta disso, todo banco quer dar esse tipo de crédito, mas nem todo banco consegue, pois o ganho é muito baixo. Se você é um banco arriscado (que precisa pagar juros mais altos para captar dinheiro), você não consegue rentabilizar seu balanço investindo esse dinheiro caro em produtos que rendem pouco.
Mas, com o funding barato (papai Pactual e mamãe Caixa), o Banco Pan conseguiu rentabilizar esse tipo de operação, que hoje é a maior parcela de crédito do banco.
Guarde isso na sua cabeça, vamos voltar para esse ponto mais tarde…
2) O Banco Pan tinha um acordo com a Caixa no qual ele poderia vender o excesso de carteiras de crédito originadas (desde que com certos padrões, que foram totalmente incorporados pela equipe de captação).
Isso é importante, pois permitia três consequências super relevantes...
Primeiramente, ele poderia trabalhar no limite da sua Basileia (alavancagem), uma vez que toda a originação em excesso que fizesse, seria imediatamente repassada para a Caixa.
Segundo, essa venda de carteira para a caixa gerava um lucro, dando a ele uma alavancagem operacional enorme e garantindo uma saída mais rápida do prejuízo no balanço.
Terceiro, ele podia vender os créditos que não queria, ficando com os melhores ratings de crédito no balanço, consumindo novamente menos Basileia.
Basileia (capital guardado para perdas) menor, significa ROE maior!
Se você consegue alavancar mais o seu patrimônio, consegue gerar um retorno maior para os seus ativos.
Por fim, o Banco Pan tinha um crédito fiscal de mais de 2 bilhões de reais, dos prejuízos dos anos anteriores. Assim que começasse a dar lucro, o tal crédito seria suficiente para abater o imposto de vários e vários anos.
Uma aposta que valia a pena
O lado ruim era uma dívida feita na época do escândalo, que era caríssima e só ia começar a sair do balanço lá entre 2021 e 2023. Ela pesava muito sobre as despesas financeiras.
Eu achei o case animal!
Do jeito que estava, me parecia uma "opção de graça". Claro que tudo dependeria do Pactual e da Caixa continuarem injetando dinheiro. O contrato com a Caixa tinha vencimento: dezembro de 2018. Então eu tinha que ficar de olho nesse risco, que poderia quebrar todo o ciclo de rentabilidade.
Nessa época, o banco negociava a 0,40 vezes book. Ou seja, as ações valiam o equivalente a apenas 40 por cento de todo o seu patrimônio.
Eu gostava tanto dessa ação que comecei a contagiar meus pares. Eu era apenas uma analista de renda fixa, mas achava que tinha fogo nessa fumaça.
No final de 2016 fizemos uma aposta entre todos o analistas da casa onde eu trabalhava na época: qual seria a melhor ação para 2017?
Todo analista deu o seu palpite, e mais um dinheiro, fazendo um grande bolão. O vencedor levava tudo. O perdedor pagava em dobro.
Eu escolhi Banco Pan! O preço era 1,24 reais.
E o resultado do balanço ainda era de muito prejuízo.
Eu não ganhei a aposta de final de ano, afinal, em 2017 a ação se valorizou apenas 46 por cento.
A recomendação de Ação feita pela analista de Renda Fixa
Em janeiro deste ano, começamos com a tese da MORTE DA RENDA FIXA. Em resumo, eu expliquei aos leitores que a renda fixa estava com um risco retorno ruim, pois as taxas estavam em mínimo histórico e com pouco upside para o futuro.
Por outro lado, naquele momento, as ações eram uma excelente alternativa de investimento. Ainda haviam alguns papéis muito baratos.
Então, se estávamos reduzindo a exposição em renda fixa, era natural dizer onde alocar parte desse dinheiro.
Foi aí que nossa equipe interna me pediu para escrever um relatório com AS 4 AÇÕES RECOMENDADAS POR UMA ANALISTA DE RENDA FIXA.
Ahhhh, essa era a minha hora!
O relatório ficou pronto no dia 18 de janeiro.
Adivinha quem foi uma das 4 ações recomendadas??? Que estava negociada a 2,04 reais, mas cujo balanço já estava com lucros crescentes e ROE acima de 6 por cento?
Pois é...
Desde então, a ação fez isso:
Como é natural, depois de tudo esse crescimento, todo mundo que me acompanha não para de perguntar: Marília, e agora? O que faço com Banco Pan?
A nova onda das ".com"
Fui olhar os múltiplos, para ver se a ação seguia barata.
Quase caí para trás!
A ação negocia hoje a 1,5 vezes o book.
Veja como é esse múltiplo em outros bancos:
Banrisul (SA:BRSR6) negocia a 1,27 vezes book.
Banco do Brasil (SA:BBAS3) negocia a 1,32 vezes book.
Banco ABC (SA:ABCB4) negocia a 1,03 vezes book.
Daycoval negociava a 0,7 vezes book, até fechar o capital.
Sofisa (SA:SFSA4) negociava a 0,8 vezes book antes de fechar o capital.
Por que o Banco Pan seria tão melhor que esses outros?
Ainda mais tendo uma estratégia de rentabilização sendo 100 por cento dependente do financiamento barato dos controladores?
Se o Banco Pan não tivesse os controladores que tem, dando linha de liquidez barata, a quanto ele captaria no mercado? E isso seria suficiente para rentabilizar um balanço de crédito consignado?
Essa estratégia se sustenta no longo prazo?
E mais do que isso: o próprio controlador diz querer vender a empresa assim que conseguirem.
À primeira vista, aquele múltiplo não me fez sentido nenhum.
Mas, se olhando mais a fundo, vi que o mercado paga muito mais caro se um banco adicionar certos adjetivos ao seu site: "100% digital"; "disruptivo", "orgânico", "fintech", "vegano".
Piadas a parte, o Banco Inter (SA:BIDI4) é um excelente exemplo.
Ele negocia a incríveis 6,82 vezes patrimônio.
O banco aumenta agressivamente o número de clientes a cada trimestre, investindo forte em propaganda e tecnologia, e os investidores pagam altíssimos múltiplos pela esperança de que eles consigam monetizar isso de alguma forma.
Nesses meus anos de conversa com o Banco Pan, não me recordo nenhuma vez de ter ouvido que a intenção deles fosse ser um banco digital, disruptivo, com taxas zero e várias soluções inovadoras para os clientes.
Eles me pareciam muito mais preocupados em rentabilizar o balanço e seguir fazendo consignado e veículos, do que aumentar muito o capex com investimento em marketing e tecnologia, como faz, por exemplo, o Banco Inter.
Por tudo isso, e pela dependência de sua estratégia na continuidade dos controladores (um deles quer sair), eu não vejo um potencial grande de valorização da ação daqui para frente.
Acho um pouco de wishful thinking (fé) achar que o Banco Pan pode vir a ser um banco digital disruptivo.
Pode acontecer? Claro que pode.
Mesmo não acontecendo, a ação pode continuar subindo? Claro que pode.
Mas, diante dos fatos, acho que temos alternativas muito mais baratas e com mais potencial do que Banco Pan no momento. Foi excelente, mas é preciso desapegar.
Sendo assim, minha recomendação para os investidores é:
Aproveitar o otimismo recente e colocar o dinheiro no bolso, pois imagino que será isso que os controladores vão tentar fazer.
Espero que você seja um dos que tenha aproveitado a oportunidade. Recebi muitos feedbacks positivos e agradecidos na última semana, que me deixaram muito feliz e orgulhosa.
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