Prezado leitor,
Nos anos mais recentes, um fenômeno tem sido observado no mercado acionário brasileiro. Além de vivermos um cenário histórico de seca de IPOs na B3 (BVMF:B3SA3) (o mais recente ocorreu em 2021), muitas companhias têm optado pelo caminho inverso: o fechamento de capital. Após a pandemia, cerca de 460 empresas apresentavam ações negociadas em bolsa localmente, enquanto no momento são cerca de 420. Para efeito ilustrativo, cito o recente caso do Carrefour (BVMF:CRFB3) Brasil, aprovado pelos acionistas por meio de assembleia realizada no fim da semana passada.
É possível que esse tipo de movimento cause certa estranheza, visto que o IPO por muitas vezes é o grande sonho de acionistas e executivos à frente de companhias em notável crescimento. Afinal, após atingir esse objetivo, o que leva uma empresa a sair da bolsa de valores? Alguns aspectos podem explicar essa decisão.
Um primeiro ponto relevante é a mudança na base acionária decorrente da abertura de capital. Enquanto uma empresa de capital fechado costuma ser controlada exclusivamente por um seleto grupo, aquelas com capital aberto por muitas vezes apresentam milhares de acionistas minoritários. A Petrobras (BVMF:PETR4), por exemplo, atingiu a marca de um milhão de investidores na B3 em setembro de 2024. Naturalmente, os processos para tomada de decisão em uma companhia cujo controle é difuso são mais complexos e menos ágeis, havendo ainda risco de desalinhamento de visões entre os diferentes sócios. Após a abertura de capital, pesa também para os controladores o risco de um “hostile takeover”, tema sobre o qual escrevi na coluna do mês passado.
Ainda no tema Governança Corporativa, abrir o capital de uma companhia requer transparência pública. Empresas listadas em bolsa devem divulgar de forma recorrente seus resultados para o mercado, o que causa a disponibilidade de informações estratégicas (faturamento, margens, iniciativas de pesquisa e desenvolvimento etc.) não somente para os investidores, mas também para atuais e/ou novos possíveis concorrentes. Essa perda de sigilo pode ser interpretada como um “custo” do IPO.
Sobre custos, em específico os financeiros, ressalta-se os montantes necessários para manter uma companhia com capital aberto. Para cumprir adequadamente as obrigações decorrentes do IPO, a empresa em geral contrata uma série de serviços, tais como assessoria, auditoria, produção de relatórios financeiros e sistemas de TI. Cita-se ainda taxas necessárias para manutenção do registro e toda a estrutura de Conselho de Administração e seus comitês. Em pesquisa realizada pela Deloitte e divulgada em 2021 pela B3, 6% das empresas respondentes indicaram um dispêndio anual médio superior a R$ 10 milhões para operar como companhia aberta.
Em que pese os desafios acima citados, abrir (ou manter aberto) o capital traz excelentes oportunidades para a companhia, principalmente com relação a visibilidade, acesso a diferentes fontes de financiamento para captação de recursos e liquidez para os acionistas. Trata-se, portanto, de uma constante análise de prós e contras.
Em épocas de mercados pressionados por aversão a risco por parte dos investidores (seja por um cenário macroeconômico adverso e/ou por incertezas políticas e fiscais, por exemplo), os preços dos ativos são descontados a patamares inferiores. Se os sócios/executivos entendem que a empresa está subvalorizada pelo mercado e que os benefícios de listagem em bolsa já não se justificam mais, é natural que um possível fechamento de capital seja visto como oportunidade.
Nesta coluna mensal, busco trazer conceitos de Finanças Corporativas e Mercados de Capitais conectados a temas atuais e relevantes. Ficarei muito feliz com feedbacks e/ou sugestões para artigos futuros por meio dos comentários.
Uma ótima semana!