Billions ou The Crown?
Tanto eu quanto muitos colegas da Empiricus gostamos muito de séries. Quem nos acompanha no Twitter já deve ter percebido comentários esporádicos sobre as últimas produções.
Muito tem se falado a respeito de Billions, que retrata o dia-a-dia de um gestor de recursos extremamente agressivo e cujas estratégias não necessariamente se mantêm dentro da lei. “Não estou incerto disso” — frase com a Axelrod dá a entender que tem informação privilegiada sobre a recomendação que acabou de fazer — virou a piada interna dos participantes do mercado.
O mercado financeiro só parece atraente como objeto de uma produção cinematográfica ou televisiva quando visto como um ambiente extremamente arrojado, dinâmico, em que tudo muda a todo o tempo e os vencedores são aqueles capazes de surfar as ondas desse mar turbulento.
E complemento: há toda uma indústria — falo de corretoras e agentes autônomos — com incentivos de sobra para levá-lo a tentar se comportar precisamente assim. O mercado vive da atividade, então é melhor mantê-lo excitado ou apavorado. Medo e ganância geram corretagem igualzinho.
Não me levem a mal: a série é divertida e eu recomendo a todos que assistam. Mas transpor aquele estilo de atuação para a realidade de seus investimentos não vai, a meu ver, levá-lo muito longe.
Conselho muito melhor eu extraio de outra série recém-lançada: The Crown retrata a ascensão de Elizabeth II ao trono britânico.
Em certo momento, ainda com pouco tempo de reinado, a jovem rainha se mostra inconformada com quão restrita é sua margem de manobra como chefe de Estado. “Não posso fazer nada!”.
O trabalho mais difícil de todos
A resposta-conselho vem de sua avó, Rainha Mary: “Não fazer nada é o trabalho mais difícil de todos, e consumirá cada centelha de sua energia.”
Não se trata, obviamente, de um elogio ao ócio. O conselho, na verdade, é de resistir à tentação de sobrepor os sabores e dissabores do momento aos princípios norteadores da instituição que ela representa.
Desnecessário dizer que a observância a esse conselho contribuiu, em muito, para que Elizabeth II se tornasse uma das monarcas mais longevas dos tempos modernos.
Onde quero chegar? Desculpe decepcioná-lo mas, ao contrário da imagem que é vendida, a história da maciça maioria dos investidores bem-sucedidos é… chata.
Investir bem é chato. Consiste, em essência, a ter um punhado de bons princípios e agarrar-se a eles em todos os momentos.
Você é visto como antiquado em meio aos momentos de euforia do mercado — como assim você não comprou isso? Era tão óbvio que ia subir! — e como agressivo em meio aos momentos de desespero generalizado — ninguém sabe o que vai acontecer com Trump na presidência; é hora de correr para as montanhas!
É nesses momentos de incredulidade generalizada que “não fazer nada” — não no sentido de permanecer passivo, mas de permanecer atido aos seus princípios de investimento — consome toda a sua energia.
Busque a perenidade
Passada a tormenta, o que efetivamente importará?
Empresas sólidas e bem testadas, com management consistente e capacidade reconhecida de geração de bons resultados.
De tempos em tempos, rompantes de insanidade temporária do mercado nos permitem comprar as Melhores Ações da Bolsa a preços extraordinariamente convidativos.
Em meio às incertezas, atenha-se ao que é perene.
Senta que o leão é manso
Passada a histeria da última semana e superado o feriado local, bolsa opera com cara de segunda-feira e maior tranquilidade, com investidores se reposicionando principalmente em nomes de mercado doméstico que, em meio à surpresa com Trump, foram acometidos muito mais por fluxo do que por fundamentos.
Como sempre.
Movimento análogo se vê no mercado de juros, com curva voltando a recuar . Câmbio também cede, com ajuda da maior atuação do Banco Central.
Lá fora, expectativas seguem em torno dos eventuais impactos das políticas trumpianas na inflação, dívida e — por consequência — juros de longo prazo. Apostas ainda sustentam a elevação de yields, mas vozes mais ponderadas já questionam tanto a amplitude do movimento quanto a sua materialidade.
Apenas mais um
A volatilidade do mercado lá fora já está próxima aos níveis pré-Trump.
Que, aliás, permaneceram aquém do visto no Brexit — após o qual, a propósito, o mundo também contrariou as previsões e não acabou.