A Ford (NYSE:F) (SA:FDMO34) teve um ano bastante agitado, com vários novos veículos em sua linha, falta de chips e um interessante foco em veículos elétricos (VEs). Suas ações subiram cerca de 87% no último ano, mas registram queda de 19,4% desde a máxima deste ano perto de US$15,99 em 3 de junho.
A disparada das ações da Ford no início de 2021 deveu-se principalmente a uma melhora na perspectiva, com base em seus novos modelos e, principalmente, em suas ofertas de VEs. A lógica para a rápida ascensão em sua cotação parece assentar-se na crença de que as empresas de VEs justificam valuations mais elevados do que as fabricantes tradicionais de automóveis. Exemplo disso é a Tesla (NASDAQ:TSLA) (SA:TSLA34), cujo P/L prospectivo é de 99, em comparação com 6,5 da Ford, segundo a Morningstar. As ofertas de VEs da Ford são impressionantes, em vista das boas avaliações do Mach-E e das reservas da F-150 Lightning (versão elétrica da F-150), as quais atingiram recentemente 130.000.
A Ford divulgou recentemente que as vendas totais em agosto de 2021 ficaram 33% abaixo do mesmo mês do ano, embora as vendas de VEs tenham saltado 67%. A Ford vendeu 8.756 VEs e um total de 124.126 veículos em todas as suas marcas e tipos em agosto de 2021.
Obviamente, são números decepcionantes de forma geral, e as vendas de VEs só podem sustentar esse crescimento por enquanto. Se as vendas de VEs continuarem aumentando no ritmo recente, e a F-150 Lightning se sair tão bem como o esperado, a Ford pode melhorar de situação.
As recentes reveses da General Motors (NYSE:GM) (SA:GMCO34) com os VEs também favorecem a Ford. A Ford parece estar particularmente bem posicionada para ampliar sua demografia em VEs. No curto prazo, entretanto, a escassez de chips representa um grande problema.
Quando analisei a Ford pela última vez, em 16 de março, suas ações estavam sendo negociadas a US$13,06, um pouco acima do preço atual. Eu dei uma classificação de queda para o papel, porque ele havia se valorizado muito mais rápido do que suas métricas justificavam.
Como ressaltei naquele momento, era difícil explicar por que as ações estavam 40% acima da máxima pré-Covid em 2020. Para respaldar essa visão, mostrei que as ações estavam 6%-8% acima do preço-alvo consensual de Wall Street para 12 meses, e o mercado de opções sugeria uma visão baixista.
Fonte: Seeking Alpha
A maioria dos leitores está a par das classificações e preços-alvo consensuais dos analistas de Wall Street. Quando os preços-alvo dos analistas são bastante uniformes, o consenso tem um valor preditivo razoável.
Além do consenso dos analistas, também observo a perspectiva implícita de mercado, que representa a previsão de consenso implícito para os retornos de preço refletidos nos preços das opções. O preço de uma opção representa a estimativa do mercado para a probabilidade de que o preço irá subir (opção de compra) ou cair (opção de venda) em relação ao seu preço de exercício (strike).
Os preços das opções, em uma faixa de strikes, podem ser usados para calcular a perspectiva probabilística de retorno de preço para a ação-objeto que reconcilia os preços das opções. Para quem ainda não está familiarizado com as perspectivas implícitas de mercado, escrevi um artigo com exemplos e links com a literatura financeira pertinente. Também já escrevi um grande número de análises usando essa abordagem.
Perspectiva dos analistas da Ford
A estimativa da eTrade para perspectiva de consenso de Wall Street combina as visões de 11 analistas ranqueados que divulgaram suas visões nos últimos 90 dias. A classificação consensual é altista e o preço-alvo para 12 meses é de US$15,57, ou seja, 28,6% acima do preço atual.
Dos 11 analistas, 7 forneceram classificação de compra na Ford e 4 a classificam como neutra. O menor preço-alvo dos analistas está 3,2% abaixo da cotação atual do papel.
Fonte: eTrade
A versão do Investing.com para a perspectiva de consenso de Wall agrega classificações e preços-alvo de 21 analistas. A classificação de consenso é altista, e o preço-alvo de 12 meses está 19,96% acima do preço atual. Dos 21 analistas, 2 recomendavam venda na Ford, sendo que o menor preço-alvo para 12 meses era de US$11.
Fonte: Investing.com
É bom ver que o consenso dos analistas é de valorização de 20%-28,6% nos próximos 12 meses e que a perspectiva prevalecente é altista. A questão é se os ganhos esperados justificam os riscos, um tópico explorado mais a fundo nas seções seguintes.
Perspectiva implícita de mercado para a Ford
Eu analisei os preços das opções de compra (calls) e venda (puts) para uma faixa de strikes, a fim de elaborar as perspectivas implícitas de mercado para a Ford. Para elaborar a perspectiva de curto prazo (4,5 meses no futuro), analisei as opções que expiram em 21 de janeiro de 2022. Para uma visão um pouco mais longa (6,3 meses), analisei as opções que expiram em 18 de março de 2021. A negociação de opções em F está muito ativa, o que aumenta a confiança na perspectiva implícita de mercado.
A apresentação-padrão da perspectiva implícita de mercado se dá na forma de uma distribuição de probabilidades de retornos de preço, com a probabilidade no eixo vertical e o retorno no eixo horizontal.
Fonte: cálculos do autor usando cotações de opções no eTrade
A perspectiva implícita de mercado é bastante simétrica, com probabilidades comparáveis para uma faixa de retornos positivos e negativos da mesma magnitude. Não existe uma probabilidade de pico bem definida, mas há uma inclinação moderadamente negativa, com elevada possibilidade de retornos negativos. A volatilidade anualizada derivada dessa distribuição é de 44,2%. Isso é bastante elevado para uma ação individual, como seria de se esperar, em vista dos rápidos ganhos e recuos da F em 2021.
Para facilitar a comparação de probabilidades de retornos positivos e negativos, considero uma versão da perspectiva implícita de mercado em que rotaciono o lado negativo do retorno da distribuição em relação ao eixo vertical (abaixo).
Fonte: cálculos do autor usando cotações de opções no eTrade Lado negativo do retorno da distribuição foi rotacionado em relação ao eixo vertical.
Essa visão mostra as elevadas probabilidades de retornos negativos para a faixa de retornos de cerca de -20% a +20% (a linha vermelha pontilhada está consistentemente mais acima do que a linha azul pontilhada no gráfico acima, de 0% a 20% no eixo horizontal). A maior probabilidade elevada para um retorno negativo corresponde a um retorno de preço de -9,8%.
Em geral, nossa expectativa é que as perspectivas implícitas de mercado para as ações fiquem, de certa forma, com viés levemente negativo, porque os investidores avessos ao risco na F podem se dispor a pagar mais pelas opções de venda, a fim de limitar sua exposição a quedas. A compensação por esse efeito é subjetiva. Eu interpreto essa perspectiva implícita de mercado como neutra, mas com um viés levemente baixista.
Fonte: cálculos do autor usando cotações de opções no eTrade Lado negativo do retorno da distribuição foi rotacionado em relação ao eixo vertical.
Quando observo a perspectiva implícita de mercado para os próximos 6,3 meses (usando opções que expiram em 18 de março de 2022), a visão é algo mais baixista, com uma probabilidade de pico mais bem definida a -10% de retorno. As probabilidades de retornos negativos são ainda maiores em relação aos retornos positivos do que na perspectiva de curto prazo (existe uma distância maior entre a linha pontilhada vermelha e a linha azul sólida). Mesmo levando em consideração a tendência de ver uma inclinação negativa, a perspectiva implícita do mercado é levemente negativa. A volatilidade anualizada derivada dessa distribuição é de 44,2%.
A perspectiva implícita de mercado sai de neutro, com viés levemente baixista, para os próximos 4,5 meses, a moderadamente baixista para os próximos 6,3 meses. Os dois períodos em perspectiva encontram correspondência com a volatilidade anualizada de cerca de 44%. As perspectivas implícitas de mercado da minha última análise eram muito mais baixistas.
Resumo
A indústria automotiva parece estar em um grande ponto de transição, com os tradicionais motores de combustão interna sendo cada vez mais substituídos por motores elétricos. Os mercados de capital estão bastante entusiasmados com o potencial dos VEs, conforme refletido nos valuations das empresas que os fabricam.
A Ford está se recuperando dos impactos da Covid-19, ao mesmo tempo em que enfrenta a escassez de chips usados na fabricação de carros e caminhões. Paralelamente, a Ford deu grandes passos na construção de VEs, além de contar com um sólido portfólio de veículos que devem entrar no mercado (Bronco e Maverick, por exemplo).
O mercado está enfrentando dificuldades para avaliar as ações da Ford, como evidenciam suas grandes oscilações de preço. O consenso de Wall Street projeta que as ações se valorizarão 20%-29% nos próximos 12 meses. A perspectiva implícita de mercado é neutra, com um viés levemente baixista, entre agora e meados de janeiro de 2022, porém fica mais baixista em meados de março.
O contraste entre o consenso altista dos analistas e a perspectiva implícita de mercado neutra a levemente baixista, me faz classificar a ação como neutra.