Primeiro foram os jornais internacionais de influência, depois o considerado FEDERAL RESERVE americano com um “carimbo negativo” de peso, e agora, a agência de “rating” STANDARD & POORS, após ouvir economistas brasileiros e autoridades do próprio governo brasileiro, rebaixa a nota de crédito do Brasil de “BBB” para “BBB-”. A perspectiva foi alterada de negativa para estável, e isto indica que a nota deve permanecer neste nível, pelo menos este ano.
Não houve perda do “grau de investimento”, mas não deixa de ser um arranhão formal e oficial e terá suas repercussões no mercado internacional.
A agência informou que entre as várias razões ocorreram sinais mistos enviados pelo governo e suas implicações para as contas fiscais, baixa credibilidade da política econômica, e perspectiva de baixo crescimento menor nos próximos dois anos.
A atitude da S&P confirma o que temos colocado em nossos comentários de forma incisiva. Desta vez o governo precisará efetivamente “entregar” os compromissos assumidos de rigor fiscal e nos gastos, para posterior “receber” de forma gradual a credibilidade que foi abalada.
Naturalmente que o governo brasileiro, a exemplo do que ocorreu em relação do FED buscará desqualificar a atitude da S&P, contudo é inegável que para o mercado internacional pesa mais a forma com que somos vistos por organismos importantes do que o que pensamos a respeito de nós mesmos, pois a despeito de termos “reservas cambiais” em razoável montante, não somos uma ilha e dependemos de fluxos de recursos externos.
Ocorria, até ontem pelo menos, certo otimismo exagerado com o fluxo cambial para o Brasil, em especial neste mês de março, mas é preciso ponderação para não nos deixar enganar e começar a ver melhorias tão intensas que encubram as perspectivas ruins para as contas externas brasileiras e imaginar que os problemas internos relevantes do país foram dissipados tão somente com compromissos de ajustes anunciados pelo governo, e cuja retrospectiva evidencia que por inúmeras vezes não foram cumpridos.
Após o BC anunciar ontem dados e projeções para o setor externo brasileiro ficou evidente que há com que se preocupar neste setor.
A autoridade monetária elevou sua projeção de déficit em conta corrente para US$ 80,0 Bi, anterior US$ 78,0 Bi, e muito provavelmente deva superar o exuberante numero de US$ 81,3 Bi apurado em 2013. Em termos relativos ao PIB de 2014 o BC projeta 3,6% mas deve ficar acima deste percentual.
Como a projeção para os IED´s feita pelo BC é de US$ 63,0 Bi está evidenciado que esta fonte será insuficiente para financiar o déficit, e se considerarmos que a projeção dos IED´s da autoridade está acima do que se configura viável neste ano de 2014, algo em torno de US$ 55,0 Bi, então a insuficiência ganha maior destaque.
É possível que haja repercussões reduzindo estas projeções face a decisão da S&P que tem poder de influência.
Por outro lado, pouco se pode esperar da balança comercial, pois temos fraca demanda externa pelos produtos brasileiros, e como dissemos ontem a economia apresenta sinais de melhora, o que sugere que os volumes de importação cresçam colocando até a possibilidade do saldo da balança ser negativo neste ano.
Além disto, a questão energética também poderá afetar negativamente a balança comercial ao exigir maior volume de importação de petróleo para manter o funcionamento das usinas termoelétricas.
Ademais, não se pode desconsiderar o expressivo volume (estoque) de importações já efetivadas à liquidar e que pode vir a pressionar a demanda do mercado de câmbio à vista estimulado pelo baixo preço da moeda americana neste momento em relação a sua projeção que sugere elevação como tendência natural. Este movimento pode ganhar corpo imediatamente se o mercado de câmbio sinalizar acentuada tendência de apreciação do dólar de imediato.
Até a terceira semana de março deste ano a balança comercial acumula saldo negativo de US$ 6,294 Bi, adicionados o saldo negativo de US$ 461,0 M da ultima semana.
Temos ainda vincendo neste ano de 2014 algo como US$ 94,0 Bi de dividas de empréstimos do setor privado, sendo bastante provável que nem tudo seja rolado, o que representará demanda adicional.
Os gastos atribuídos a viagens internacionais atingiu o recorde para o mês de fevereiro com US$ 1,915 Bi, tendo havido ingressos da ordem de US$ 591,0 M, resultando em saída liquida de US$ 1,324 Bi. O BC procedeu à revisão da projeção negativa anterior de US$ 19,0 Bi para US$ 18,5 Bi, e pelo que se observa há baixa expectativa de fluxos com a realização da Copa no Brasil.
Após ter divulgado os números do setor externo que sinalizam que podemos ter em 2014 um ano pior do que 2013, o BC tornou conhecido o fluxo cambial até o dia 20 com um saldo positivo de US$ 5,095 Bi, quem sabe até como fator para atenuar o impacto dos números e projeções para as contas externas.
Numa leitura inicial parece ser um número bastante expressivo. Deste montante, US$ 4,833 Bi é de origem financeira.
Até o dia 14 de março último tínhamos um saldo positivo de origem financeira de US$ 2,417 Bi frente ao mesmo período de 2013 com US$ 2,490 Bi, portanto este ano era menor a despeito de termos uma taxa SELIC atual de 10,50% e em março de 2013 tão somente 7,25%, ou seja, soberbamente menor.
Então, é preciso sensatez com o entusiasmo com números colocados isoladamente em destaque, podem parecer bons, mas por vezes nem tanto, pois se o volume de recursos que está ingressando no país é especulativo o volume deveria estar sendo bem maior com uma diferença de 3,25% a mais na taxa de juro em relação a 2013.
Se não ocorre é porque a atratividade pelo Brasil não é tanta quanto se propaga havendo aversão ao risco e que acentuar-se com a decisão da S&P ou pode estar presente algum ou alguns fatores que provocam a contração e este pode ser o preço da moeda americana excessivamente depreciada e assimétrica aos fundamentos, que acaba se constituindo um risco para o especulador que tem que realizar “hedge” a um custo caro, que pode estar corroendo parte do esperado ganho financeiro líquido.
A Bolsa brasileira não desperta atratividade e vive de movimentos pontuais e nem sempre fundamentados, “vivendo” de uma “esperança” aqui e outra acolá, pois a despeito de sinais de melhora da economia brasileira no primeiro bimestre há duvidas quanto a sua sustentabilidade e, como evidenciou o FOCUS desta semana, os analistas continuam projetando baixo crescimento para o país, inflação crescente e taxa SELIC em alta.
É claro o conflito que deve estar sendo enfrentado pelo BC. Precisa combater a inflação e isto obriga a elevar a SELIC e tem a necessidade de que a moeda americana seja apreciada para atenuar os problemas em torno das contas externas, melhorando o fluxo cambial, mas isto seria mais inflacionário e exigiria mais alta na SELIC.
Como já salientamos algumas vezes, o setor externo é neste ano o grande desafio para a política monetária do governo, e cada vez mais deixa evidente que será muito difícil conciliar os pontos conflitantes.
No momento, embora possa estar desejando um preço de dólar mais apreciado para atrair capitais estrangeiros, o governo vem agindo para mantê-lo depreciado para conter pressões inflacionárias presentes que já requisitam alta da SELIC, e tem contado com a ajuda dos “players” que estão vendidos que forçam a queda.
Mas é notório que os estrangeiros acreditam que o dólar será apreciado, razão pela qual vêm aumentando suas posições compradas aproveitando os preços baixos.
Agora o cenário certamente mudará para o Brasil e o preço da moeda americana tenderá a subir, até porque poderão ser precipitados movimentos de saída no mercado de câmbio com a perspectiva de que o preço será maior no curto/médio prazos.
Este será um momento já colocando o real em depreciação e que deve acentuar-se ao final do ano, até porque os movimentos mais intensos de reversão de capitais deverão começar a ocorrer com a proximidade do final do ano dada a perspectiva de mudança do juro nos Estados Unidos no 1º semestre de 2015, e a ocorrência de eleição no Brasil pode coincidir com o início deste movimento.
Hoje deverá ser um dia estressante e com volatilidade, mantendo viés de alta do preço da moeda americana.
A rigor, a grande maioria do mercado financeiro já considerava fora do radar uma redução do “rating” do Brasil este ano.