Ninguém em sã consciência
Ontem lancei o desafio do “esclarecimento” da Petrobras.
Recebi uma infinidade de respostas por email. Agradeço a todas. Infelizmente, nenhuma chegou perto do desfecho. Na verdade, ninguém em sã consciência imaginaria tal desfecho...
Petrobras anunciou na véspera reajuste de 3% no preço da gasolina e de 5% no óleo diesel. O reajuste veio um dia após a empresa negar o mesmo, abaixo da pior expectativa (entre 4% e 7%) e não traz o alívio esperado para os fluxos de caixa da estatal - com a disparada mais recente do dólar, não traz qualquer alívio.
Muito mais do que isso, o reajuste reforçou a situação de uma estatal completamente refém de manobra do governo e sem qualquer respeito à sua base de acionistas. Foi mais uma lição de governança corporativa. De como não fazer.
Petrobras mentiu para o mercado
No comunicado divulgado na noite da quarta-feira, a estatal havia afirmado que “não há data ou percentual definidos para o reajuste” e “a orientação do Conselho de Administração tem sido pela manutenção dos níveis de preços”.
Poucas horas depois, a presidente Dilma falou justamente o oposto, que as acusações de represamento de tarifas se tratavam de “lorota” e que Petrobras já havia definido o reajuste.
Diante disso, pergunto...
Qual a credibilidade da comunicação da estatal? Qual a validade do esclarecimento publicado junto à CVM? Petrobras mentiu para o mercado em documento oficial? Ou teria a presidenta mentido?
Foi bom (foi?) enquanto durou
Os ADRs da Petrobras, ou recibos de ações negociados no mercado internacional, reagiram em primeiro momento com valorização.
Típico caso de respingo pontual para um mercado que já não esperava mais nada. O movimento se estendeu à abertura na Bolsa brasileira, mas não se sustentou. Ações passaram a cair com vigor. Agora há pouco, voltaram a subir. Minha percepção: qualquer alta pontual mais vigorosa é oportunidade para raquetar. Short (venda).
Além da nova falha de governança, o episódio deu clara indicação de que Petrobras segue mais do que nunca sujeita a ingerência política, fazendo uma conta de chegada: um reajuste cuidadosamente posicionado entre dar uma resposta qualquer para o mercado e não impactar a meta de inflação. Lembra da tese das migalhas ortodoxas em meio a uma essência heterodoxa? Bingo!
Grosso modo, foi um reajuste para inglês ver, após a empresa acumular um prejuízo consentido de mais de R$ 60 bilhões com a política de importação de combustíveis, rodar um ano com defasagem média em torno de 20% para os preços internacionais, e justamente no dia em que dólar disparou para a maior cotação desde 2005 (comprometendo a pontual paridade para os preços internacionais). A propósito, a estatal não havia anunciado no final do ano passado que sua nova metodologia de preços era de reajustes automáticos?
Ah, que isso, ela está descontrolada
Partindo para a agenda econômica do dia, temos como destaque por aqui a divulgação do IPCA de outubro, o indicador oficial de inflação.
A inflação desacelerou no mês passado, marcando 0,42%, mas continua acima do teto da meta, em 6,59% em 12 meses, contra 6,50% do teto da meta (nunca é demais lembrar, que a meta de fato é de 4,5%).
Falando nisso, já faz cinco meses que a inflação está, sim, acima do teto da meta, contrariando o que foi dito durante todo o período de campanha. E, com o desrepresamento de preços a todo vapor (não, ele não é “lorota”), caminhamos para mais um tento.
Não, não cometemos estelionato tampouco terrorismo eleitoral. E, sim, a inflação preocupa. Não preocupasse, teria motivo para aumentar o juro?
O problema é que, contrapondo o ligeiro aumento da Selic, para novembro temos reajustes de energia na próximos de 20% por todos os cantos (falamos neles ontem), aumento no preço da gasolina e no diesel na bomba, dólar disparando para perto de R$ 2,60...
Das duas uma, talvez as duas: a inflação está fadada a subir mais; o juro está fadado a subir mais.
Ôoo, o gatilho de fluxo voltooou
As ações de ALL (ALLL3), BR Properties (BRPR3) registram as duas maiores quedas do Ibovespa no momento que escrevo. Copasa (CSMG3) também despenca - esta não está no Ibovespa.
O que elas têm em comum?
Foram excluídas do índice MSCI Global (passam a compor o MSCI small caps). A nova composição passará a valer a partir do próximo dia 25.
O MSCI serve de referência para muitos fundos estrangeiros com restrição estatutária de investimento em ações que o integram: estar ou não no índice pode representar a abertura de uma fronteira de potenciais investidores de cerca de US$ 30 bilhões de patrimônio.
Trata-se obviamente de uma estratégia baseada em fluxo (não em fundamentos) e em performance passada, que nunca foram garantia de retorno futuro; mas vale ficar atento.
A propósito, lembra do trade idiota que funciona?
Comprar ações que entrarem no MSCI e vender as que saíram visando as próximas duas semanas – contando dessa, que traz o rebalanceamento da carteira teórica do índice. Infelizmente, não se espera a entrada de nenhuma ação brasileira desta vez no MSCI Global.
De toda forma, vale o alerta: elas não deixarão de ser empresas melhores ou piores por isso, mas estão sujeitas a volatilidade adicional sobre suas ações no curtíssimo prazo.