Faltando pouco menos de dois anos para a sucessão presidencial, o processo foi deflagrado de forma antecipada. Na semana passada, o ministro Edson Fachin, de forma monocrática, anulou os processos do ex-presidente Lula na Lava Jato de Curitiba, e pode ter liberado Lula para concorrer justamente nas próximas eleições de 2022.
Lula não se fez de rogado e, logo no dia seguinte, dava coletiva de imprensa usando máscara contra a covid-19, discorrendo sobre compra de vacinas e imunização acelerada e criticando a postura do presidente. Também deixou em aberto sua candidatura, já que contestações vão existir, como manda a prudência, mas também falou numa frente ampla para as próximas eleições. Aparentemente, o presidente acusou o golpe.
Quase que concomitante a isso, Bolsonaro apareceu em cerimônia mascarado (coisa que acontece com rara frequência), falou na aquisição de vacinas e assinou termo liberando o setor privado e governadores para compra de vacinas. Igualmente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, falou durante todo o final de semana, dizendo que a imunização massiva era fundamental para a retomada da economia, sobre seguro-emprego, sobre a substituição do auxílio emergencial pelo programa Renda Brasil e prometendo algumas novidades; além de prever que a reforma tributária sairá ainda em 2021, situação que poucos são os que acham possível ao ponto de cumprir os objetivos.
O fato é que o processo sucessório foi irremediavelmente antecipado, e há unanimidade de pensamento sobre a inevitável polarização entre direita e esquerda, com arroubos populistas de ambos os lados. Nesse contexto, não há como se esperar medidas impopulares na janela curta (e agora ainda menor), nos meses que restam para término do ano de 2021. Ou seja, 2022 já está batendo na porta para entrar.
Também foi possível observar movimentações no dito “centrão”. Parlamentares começam a querer protagonizar temas relevantes visando dar outra dinâmica e introduzir uma terceira via insatisfeita com essa polarização. Temos que lembrar que, embora com processos anulados, Lula segue com a peja da corrupção nos governos petistas, e Bolsonaro com a de não cumprir o projeto a que se propôs para mudar o país. Sobre isso, o presidente se defende dizendo que a covid-19 não permitiu o projeto liberal de Paulo Guedes, o Legislativo não ajudou e o Judiciário menos ainda.
Agora, Bolsonaro está sendo obrigado a conviver com uma convergência absolutamente nociva. O Brasil assumiu o segundo lugar no ranking mundial de infecção, os óbitos rondam 280 mil e as vacinas estão escassas no mundo, com lentidão num país que teoricamente deveria estar dando show de imunização rápida. O dólar mais valorizado, o estresse dos investidores externos com a situação política, a inflação acelerando, indicadores de conjuntura voltando a sinalizar desaceleração e Banco Central tendo que ampliar juros; tudo isso acaba sendo terrível para a pretensão de reeleição de Bolsonaro, se essa situação permanecer nos próximos meses.
Mais ainda com recordes de óbitos e infecção, o PR foi pressionado para trocar novamente o ministro da Saúde (quarto ministro), Eduardo Pazuello, num episódio aparentemente desastrado, em que a cardiologista que assumiria foi “fritada” antes mesmo de ser confirmada, e Pazuello negou que tivesse pedido para sair por motivos de saúde.
Os mercados começaram a segunda-feira novamente tensionados e isso fez com que a Bovespa abrisse em queda e dólar indo para alta, mesmo com a situação externa mais favorável e com treasuries contidos, dólar mais fraco e Bolsas sinalizando altas.
O Brasil precisa urgentemente mudar sua postura e seu discurso oficial, para não ser abandonado pelos investidores estrangeiros. Lembramos que precisamos fazer privatizações e concessões, reformas estruturantes e o governo não tem recursos para ser o patrocinador da recuperação, com orçamento nada flexível e eleições agora mais próximas, não pelo calendário, mas por posturas antagônicas.