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O setor de data centers está em forte expansão, com anúncios de incentivos governamentais e investimentos bilionários de hyperscalers e empresas de co-location, inclusive no Brasil. É um reflexo da crescente atividade de servidores, redes e outros dispositivos que, na nuvem ou localmente, processam e armazenam uma quantidade enorme de dados necessários para buscas online, transações bancárias e uma variedade de outras aplicações, inclusive o treinamento e hospedagem de aplicações de inteligência artificial. Toda a cadeia de valor envolvida — desde energia limpa até infraestrutura e tecnologia — pode oferecer oportunidades interessantes para investidores.
Abaixo apresento um panorama desse movimento, com diferenciais do Brasil, os principais elos da cadeia, empresas e ações mais expostas ao crescimento do setor, e recomendações gerais para quem quer investir. A maioria das empresas protagonistas não tem ações listadas na bolsa brasileira, mas há algumas opções relevantes e, claro, a possibilidade de internacionalização da sua carteira.
As médias de cada setor são calculadas excluindo múltiplos negativos ou acima de 100x. Os valores citados são aproximados e podem ficar desatualizados. Essa análise pode ser complementada com outros indicadores, como por exemplo, ligados à política de dividendos.
Por que o Brasil?
O Brasil destaca-se como um hub estratégico para data centers, com empresas como AWS, Microsoft, Ascenty, ODATA, Tecto e Elea anunciando investimentos vultosos. A principal vantagem competitiva apontada para o Brasil é sua matriz energética com abundância de renováveis (hidrelétrica, eólica, solar). Data centers consomem muita energia e há uma crescente busca pela redução nas emissões por meio da transição energética. Cabe ressaltar que há também no país um marco regulatório em evolução e um mercado interno pujante. Temos mão-de-obra especializada como diferencial, se comparados aos hermanos latino-americanos, mas escassez de talentos se comparados com mercados mais desenvolvidos.
Os principais obstáculos apresentados pelas empresas são a carga e complexidade do sistema tributário. Políticas públicas têm sido lançadas para superar esse obstáculo, sendo o Redata a mais abrangente atualmente em elaboração pelo governo federal: trata-se de um regime tributário especial na compra e importação de equipamentos essenciais para implantação e operação, exigindo contrapartidas em termos ambientais, de reserva de capacidade doméstica e de pesquisa e desenvolvimento.
Brasileiras mais inseridas nessa cadeia de valor
Em uma primeira camada, estão as alternativas que possuem exposição direta e material, ou seja, empresas cujo negócio principal ou parte significativa dele é diretamente impactado pela construção e operação de data centers.
- Controladoras de operadoras: Quase nenhuma operadora (como hyperscalers e empresas de co-location) com grandes planos de investir no Brasil é listada na B3, a não ser por BDRs ou fazendo parte de ETFs. A Ascenty, maior plataforma independente da América Latina, é controlada pela Brookfield Corporation (negociada na NYSE como BN e BN.TO), por meio de seus fundos de infraestrutura e em parceria com a Digital Realty. Uma opção é o BTG Pactual (BVMF:BPAC11), que controla a V.tal, que tem a Tecto como sua divisão de data centers que anunciou projeto de hiperscala de 200 MW no interior de São Paulo. O banco é negociado com um múltiplo acima da média do setor bancário (13,0x vs. 7,5x), e uma das razões é a gestão de ativos alternativos como esse.
- Equipamentos críticos: Empresas de tecnologia, software e eficiência energética também se beneficiam com o impulsionamento do setor de data centers. A Weg (WEGE3) fabrica motores, sistemas de resfriamento, automação e energia também para essa indústria. Seu P/L já foi maior, mas ainda está no patamar de 24,2x (frente a uma média de 7,7x do setor de máquinas e equipamentos), devido a seu crescimento consistente e exportações.
- Energia verde: A Neoenergia (NEOE3) atua em estados-chave como SP e RJ e no Nordeste, onde data centers estão se instalando. Seu múltiplo P/L atualmente está em 7,9x, abaixo da média de 9,7x do setor de energia elétrica. Também estão com múltiplos abaixo dessa média duas fortes em renováveis: a Engie Brasil (EGIE3), com alta exposição em contratos de longo prazo, e a CPFL Energia (CPFE3), mais presente em distribuição. Já a Eletrobras (ELET3), que se destaca pela expansão em transmissão e geração renovável, está sendo negociada com um P/L de 15,8x, bem acima da média do setor. A operação contínua dos data centers gera uma demanda firme sobre redes de transmissão e distribuição, que pode fomentar contratos de longo prazo e receitas mais previsíveis, investimentos em linhas de transmissão e subestações e acelerar projetos de geração, de off-grids e armazenamento. É preciso levar em conta, no entanto, desafios operacionais do sistema elétrico brasileiro: problemas de coordenação ou na capacidade das linhas de transmissão, bem como desequilíbrios entre oferta e demanda, têm levado a perdas significativas por curtailment (interrupção temporária de geração solicitada pelo regulador).
Em uma segunda camada, podem ser consideradas empresas com exposição indireta ou tangencial, ou seja, sua relação com data centers não é um driver primário de valuation. Essa camada é para uma tese de investimento mais ampla em digitalização da economia brasileira, onde data centers são apenas um componente.
Por exemplo, a construção de data centers exige investimentos pesados em infraestrutura elétrica, resfriamento e conectividade. A Motiva (MOTV3, novo nome do Grupo CCR), exposta indiretamente a ativos de infraestrutura digital, está sendo negociada a um P/L de 14,2x, acima da média do setor de transportes, que está em 11,5x. Já a TIM Brasil (TIMS3), com um P/L de 43,8x, beneficia-se da demanda por conectividade e data centers edge, que, por serem menores e mais perto de centros urbanos, vão ao encontro da crescente necessidade de baixa latência de algumas aplicações. Há também a Totvs (TOTS3), que fornece software de gestão e utiliza capacidade de data centers para servir seus clientes. Ela negocia com um P/L de 29,4x, enquanto a média do setor de software e serviços está em 32,6x.
Outros estudos podem ser ainda mais abrangentes em sua análise. Há, por exemplo, outras empresas de SaaS como Locaweb, Bemobi e Linx (comprada pela Stone), ainda que o menor porte de seus clientes faça com que boa parte de sua escala de infraestrutura seja terceirizada para os hyperscalers. Construtoras e incorporadoras como Even (EVEN3) e Cyrela (CYRE3) podem se beneficiar da demanda por galpões logísticos adaptados para data centers de edge computing. Por fim, demanda crescente por segurança cibernética coloca em evidência empresas como a Valid (VLID3), que atua em identificação e certificação digital.
Dicas para montar uma estratégia de exposição
1. Diversificar por subsetor: Ao distribuir a alocação nos elos da cadeia de valor de data centers de forma balanceada, o investidor mitiga riscos específicos de cada segmento e constrói uma carteira mais resiliente a rupturas pontuais e capaz de capturar o crescimento de todo o ecossistema. Cada segmento possui um perfil de fluxo de caixa, crescimento e sensibilidade econômica distinta. Investir em energia oferece exposição a contratos de longo prazo e à demanda inevitável por energia verde. O elo de operação captura o crescimento orgânico da construção e da receita de aluguel de espaço, sendo mais sensível aos ciclos de investimento em infraestrutura física. Por fim, o elo de equipamentos beneficia-se da necessidade contínua de inovação e eficiência, mas também está sujeito à volatilidade da concorrência tecnológica e dos ciclos de compra de hardware.
2. Atenção a múltiplos: A maior parte das empresas envolvidas já negociam com múltiplos elevados por um prêmio pela atuação com energia verde e outras dimensões de sustentabilidade, além de maior crescimento esperado pelos investimentos anunciados em data centers e outras frentes. É preciso muita cautela quanto a conclusões sobre a ação estar barata ou cara por meio da comparação com médias do setor por causa de diferenças nas expectativas de crescimento e no risco.
3. Investir no exterior: Como o Brasil possui poucas empresas listadas e tem escassez de ETFs setoriais específicos para tecnologia ou infraestrutura digital, o mercado global oferece opções mais maduras, líquidas e diversificadas. Porém, ampliar o leque dessa forma significa mais exposição a risco cambial, além de custos de transação e de obtenção de informações para se manter atualizado. Há ETFs que oferecem exposição direta às maiores empresas de infraestrutura digital e REITs de data centers do mundo: o Global X Data Center & Digital Infrastructure ETF (VPN), com Equinix, Digital Realty e American Tower na carteira; o iShares Digital Infrastructure and Real Estate ETF (IDGT), com Equinix, Crown Castle e Prologis na carteira; e o First Trust Cloud Computing ETF (SKYY), com AWS (Amazon), Microsoft Azure e Salesforce. De forma mais genérica, o IVVB11 ou B5P211 são ETFs que replicam o S&P 500, dando exposição indireta aos hyperscalers globais (Microsoft, Amazon, Google). Alternativa mais arrojada ainda seria investir diretamente nessas empresas e nas fornecedoras de equipamentos e infraestrutura, como NVIDIA, Vertiv e Eaton, ou ainda por meio de recibos de depósito ou nas próprias bolsas em que são listadas.
Conclusão
O setor de data centers no Brasil pode oferecer oportunidades de investimento em múltiplos elos da cadeia. A B3 infelizmente é carente no que diz respeito a operadoras, mas possui listadas no setor de energia e equipamentos com boa exposição. ETFs e ações listadas em bolsas estrangeiras são alternativas para um conjunto bem mais abrangente e diversificado. Os preços já reagiram bastante: é essencial monitorar os valuations e o fluxo de novos investimentos para ajustar a alocação conforme o momento do ciclo, e entender como o grau de regulação de cada setor e outros aspectos das operações da empresa afetam sua captura de valor nesse boom.