Não é de hoje que eu tenho gostado de ficar exposto a esse setor que historicamente não apresenta bons resultados operacionais (sejamos sinceros). Porém, devido à Gripe Suína Africana e agora à Gripe Aviária do tipo H5N6, o setor tem ganho atratividade por ser o único a conseguir suprir a queda da oferta nos países que foram atingidos.
A JBS apresentou outro resultado ótimo e com vários recordes, tanto na top line quanto na bottom line dos seus resultados. Para quem não se lembra, eu escrevi no 3T19 sobre a companhia. Quem quiser relembrar o que eu comentei, basta clicar no link:
JBS (JBSS3 (SA:JBSS3)) –AINDA VALE (SA:VALE3) A PENA COMPRAR FRIGORÍFICOS?
QUADRO DE RESULTADOS
É muito bom quando você abre os resultados e de cara a companhia já mostra que houve recordes, ou que ela apresentou ótimos números, não?
Recorde de Ebitda Ajustado (ex – goodwill da compra da Tulip incluindo parcelamento fiscais, trabalhistas e sociais), o qual cresceu 33,9% em 2019 vs 2018. Isso quer dizer que a proxy do fluxo de caixa operacional da companhia, que mostra para os investidores o quão eficiente a companhia é em vender carnes, foi recorde. A margem Ebitda, cresceu também, saindo de 8,2% para 9,7% no final de 2019, outro ponto positivo.
Mas vamos nos perguntar: como esse crescimento aconteceu?
Olhando para o lucro líquido da companhia, podemos notar que ele cresceu 23.981% (foi isso mesmo que você acabou de ler).
E por que o lucro cresceu desta forma? Isso tende a se repetir?
Antes de responder essa pergunta, vamos olhar para a receita da companhia, já segmentada pelas unidades de negócios:
Conseguimos perceber que a companhia vendeu muito bem em relação a 2018. Basta olhar para a receita líquida YoY (comparação anual) de todas as unidades e constatamos que houve crescimento relevante em todos (menos em Outros, mas tudo bem, o grosso do resultado vem das operações US, então para mim é isso que importa ir bem no momento).
Outro ponto positivo, como eu já comentei, mas agora visualmente melhor, é a margem Ebitda. Notem que todas as operações tiveram crescimento (menos Outros). Isso demonstra que a companhia está conseguindo aumentar a lucratividade operacional. Em outras palavras, isso mostra para o investidor que a melhora do resultado está vindo das operações dela e é nisso que todos queremos que ela melhore sempre.
Então temos dois pontos já positivos: receitas cresceram bem em relação a 2018 e operacionalmente a companhia parece estar melhorando.
Falta explicar o lucro líquido, com um crescimento astronômico….
Aqui eu terei que ser um pouco mais didático.
A receita líquida cresceu bastante em relação a 2018. Consequentemente, faz sentido o CPV aumentar um pouco também. Mas, mesmo tendo esse aumento normal, o lucro bruto foi maior (a margem bruta também foi, porque a receita líquida cresceu muito mais que o CPV).
Temos um lucro bruto, então, 21% maior do que em 2018. Passando para as despesas administrativas e gerais, notamos que houve uma melhora. O desembolso da companhia com essa despesa foi menor em relação a 2018, porém com vendas maiores do que em 2018, mas não muito. Isso se deve à companhia estar vendendo mais produtos do que em outros anos, o que aumenta a despesas com marketing, pessoal da área comercial, entre outros.
A linha “outras despesas” também foi melhor, mas outras receitas cresceram 100%. Aqui temos que ficar atentos porque, dependendo do crescimento dessa linha, isso pode afetar os resultados. Neste caso, agora, pouco impacta o crescimento de 100% no resultado operacional dela. Imagine (é para supor!!!) que fossem os mesmo R$ 214.863 de 2018. As despesas operacionais ficariam em R$ 18.732.777. Ou seja, não teriam um impacto tão grande assim. Então eu descarto que isso tenha levado o lucro líquido para os céus.
Rapidamente, para quem deve estar se perguntando: o que diabos são essas outras receitas (rs)? Outras receitas incluem resultado da venda de ativos imobilizados, plantas industriais e baixa de outros resultados abrangentes de subsidiárias liquidadas, dentre outros. Tem que ficar atento a esse número, porque muitas vezes ele acaba por inflar o balanço para cima, e este resultado não é o negócio principal da companhia.
Indo para o último que me importa: receita financeira e despesas financeira (porque na parte de tributação, há pouca coisa ou as vezes quase nada que a companhia possa fazer… são tributos, né). Receitas financeiras cresceram 48% vs 2018, enquanto as despesas financeiras caíram quase 28% em relação a 2018. Entrando nas notas explicativas para entender melhor como se deu essas variações, eu pude constatar que:
Juros ativos cresceram 61% em relação a 2018. Esses são os juros que a companhia recebe de aplicações financeiras. Enquanto isso, os juros passivos cresceram quase 15% em relação a 2018. Esses são os juros que a companhia tem como despesas por conta dos seus empréstimos ou financiamentos tomados.
Notem também que os resultados de variações cambiais foram bem melhores que em 2018, e teve queda de quase 68%. É basicamente isso que fez ela brilhar no resultado financeiro. Foi uma boa gestão dos ganhos e perdas com essas operações.
Vale lembrar que, mesmo com um resultado financeiro melhor, ela entregou um resultado operacional muito mais significativo em relação a 2018.
Posso esperar que isso ocorra de novo? Talvez por mais um ano, dois anos? Aí já não sei! Devemos entender que muito dessa melhora se deve efetivamente ao cenário positivo para os frigoríficos. Mas, por hora, JBS está de parabéns.
Já que ficamos muito tempo nesta explicação, prometo ser breve nas duas últimas e ir direto ao ponto!
Vamos passar no endividamento da companhia e ver como está essa dinâmica no momento.
Primeiramente, JBS encerrou 2019 com R$ 10 bi de caixa. Adicionalmente, a JBS USA possui U$ 1,9 bi disponível em linhas de créditos rotativas e garantidas, o que equivale a R$ 7,8 bi ao câmbio de fechamento do último resultado. Somando essas duas disponibilidades, chegamos a R$ 17,8 bilhões, um valor superior em mais de 8x à dívida de curto prazo.
A amortização da dívida na companhia nos próximos três anos não me preocupa nem um pouco. Além disso, a relação dívida líquida/Ebitda encerrou 2019 em 2,16x (R$) e 2,13x (U$), bem inferior aos 3,18x e 3,01x, respectivamente.
Por fim, a empresa gerou um caixa operacional livre de R$ 17,1 bi, um aumento de 49,1% frente ao ano anterior. O fluxo de caixa livre foi R$ 9,5 bi e teve alta de 109,1% comparado a 2018. É uma geração de caixa muito expressiva e que devemos continuar vendo crescer devido ao cenário favorável para a companhia.
COVID-19 ATRAPALHA OS PLANOS DA JBS?
Chegamos ao ponto mais interessante para muita gente. Com o lockdown e os impactos do Covid-19, tanto agora quanto depois que começarmos a retomar a “normalidade”, como será que a companhia irá reagir? Ela será muito impactada agora?
Existiam três preocupações que deixam os investidores receosos em relação aos cases de frigoríficos: (i) Logística; (ii) Operação das Plantas e (iii) Demanda do Consumidor.
Em uma entrevista do BTG Pactual com o CEO da JBS, o senhor Gilberto Tomazoni, explica que, na logística, eles possuem uma variação de containers com refrigeração. Até o momento a logística não tem sido um problema para a companhia, mas, ao mesmo tempo, ele acredita que o risco ainda exista, vai depender se o cenário se deteriora ainda mais.
Sobre operações das plantas, já vimos algumas notícias de que a JBS fechou uma unidade nos EUA por conta do Covid-19, e players concorrentes também começaram a fechar, como Smithfield Foods, Tyson Foods e Cargill Inc. Enquanto o nível de absenteísmo começou a aumentar em algumas plantas (Greeley Beef caiu 20% o abatimento, a JBS em Alta Floresta já estão abatendo animais abaixo da sua capacidade também), a companhia tem conseguido acelerar a produção em outras plantas, buscando por um equilíbrio. Tomazoni comenta que, assim que companhia acabar de aumentar a comunicação e os procedimentos de proteção contra o vírus, os níveis de produção deverão começar a voltar à normalidade em algumas plantas.
Sobre a demanda, a Tomazoni comentou que a parte de “food service” está apanhando um pouco. Porém, isso tem sido minimizado graças a uma forte performance no segmento de varejo, em que a demanda continua muito forte. O último resultado da companhia foi muito forte e a deixou em um patamar confortável, não só para continuar com seu plano de investimentos no Brasil, como agora ela pode procurar por oportunidades de M&A.
No mais, a depreciação da nossa moeda, a demanda inelástica por conta da bagunça no cenário macro e a posição em que a companhia está inserida me deixam mais tranquilizados em relação aos seus resultados.
MEU OUTLOOK PARA JBSS3
Como comentado anteriormente, o conjunto de: depreciação da nossa moeda, cenário macro favorável para a companhia, posição em que ela se encontra, disponibilidade confortável para possíveis M&A e continuação do plano de investimento me deixam mais tranquilo em relação ao case.
Será que seus múltiplos dizem o mesmo?
De fato, dizem. O setor de frigoríficos no geral está descontado, não é somente JBS que está negociando por uma barganha de 4,8x EV/Ebitda e 6,4x lucros para 2020 (segundo minhas estimativas). Além disso, eu estimo um ROE de 26% e um Dividend Yield de 3,5% para 2020. Nada mal ao meu ver! A linha azul na tabela acima indica o mínimo que eu acho justo para a companhia, só aí temos cerca de 45% de upside.
Além disso, quando olhamos historicamente o EV/Ebitda (não é forward) de JBS, percebemos que ele se encontra abaixo de 1 desvio-padrão atualmente:
Para quem não está familiarizado com o desvio-padrão, ele nada mais é que o grau de variação de um conjunto de elementos ou dados em relação à média. Ou seja, é uma medida de dispersão. Se com os dados históricos do EV/Ebitda de JBS eu encontro que este indicador está negociando abaixo de 1 desvio-padrão ou tocando 1 desvio para baixo, isto indica para os investidores que a companhia está negociando a um desconto frente a sua negociação média histórica. Logo, isso traz mais margem de segurança para se expor no ativo.
Era isso, valeu!