Os últimos dias de setembro e, de quebra, do terceiro trimestre do ano, devem ser marcados pela cautela no mercado financeiro, com a volatilidade reinando. Antes de virar a folhinha, o mundo deve alcançar a marca sombria de 1 milhão de óbitos por covid-19 e os investidores seguem preocupados com a adoção de novas medidas restritivas na Europa, que vive o temor de uma segunda onda, enquanto democratas e republicanos não conseguem destravar as negociações sobre um novo pacote fiscal antes das eleições de novembro.
Seis meses após a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar pandemia, esses focos de tensão nos dois lados do Atlântico Norte trazem dúvidas em relação ao ritmo da recuperação econômica global, que já dá sinais de perda de tração. E por mais que tratamentos e medicamentos estejam tornando a doença menos letal, o coronavírus continuará sendo uma ameaça, ao menos que surja uma vacina 100% eficaz.
Isso significa que a covid-19 deve continuar fazendo parte da vida diária ainda em 2021. E o receio é de que a atividade real sofra um novo baque, com as pessoas voltando a se afastarem uma das outras para se protegerem de uma eventual segunda onda, à medida que o inverno no hemisfério norte se aproxima, ou simplesmente deixando de consumir por falto de emprego (e de renda). Isso afetaria os pequenos negócios sem acesso ao crédito.
Diante dessas incertezas, os investidores tendem a redobrar a postura defensiva, evitando maior exposição aos ativos de risco. Ao mesmo tempo, a liquidez sem precedentes jorrada pelos principais bancos centrais ainda dá sustentação aos negócios, abrindo espaço para compras de ocasião e impedindo uma correção mais forte nos preços. Tal comportamento deixa os mercados globais na gangorra, vulneráveis aos riscos de um cenário ainda frágil.
De qualquer forma, as ações globais caminham para registrar o primeiro mês de resultado negativo desde março, quando a pandemia de coronavírus abalou os mercados, demandando uma ação coordenada e inédita dos BCs. Em se confirmando, o desempenho negativo em setembro reflete os crescentes riscos para a recuperação econômica em meio a novas ondas de covid-19 e o impasse fiscal nos EUA.
Caca por pechinchas
E é exatamente esse comportamento que se observa nos mercados internacionais nesta manhã. As bolsas europeias abriram em alta, com os investidores procurando pechinchas principalmente entre as ações dos bancos. O HSBC lidera as altas, após atingir na semana passada o nível mais baixo desde 1995, na esteira de notícias sobre supostas atividades envolvendo lavagem de dinheiro. Em seguida, aparece o setor de viagens e lazer.
O noticiário de fusões e aquisições entre empresas, tão comum em um cenário pós-crise, também movimenta os negócios. Do outro lado, os índices futuros das bolsas de Nova York exibem ganhos firmes, relegando a decisão da Justiça dos Estados Unidos de bloquear temporariamente a ordem do presidente Donald Trump de banir as operações do aplicativo TikTok no país. Restrições adicionais seguem previstas para 12 de novembro.
Na Ásia, pesaram as restrições dos EUA contra empresas chinesas de tecnologia, afetando fabricantes de chips e semicondutores. O índice Xangai Composto fechou levemente no vermelho, enquanto a Bolsa de Shenzhen caiu 0,8%. Tóquio e Hong Kong subiram pouco mais de 1%, cada. Nos demais mercados, o euro está de lado, mas a libra avança antes da rodada final sobre um acordo pós-Brexit. Já o petróleo está abaixo de US$ 40 o barril.
A ver, então, como esse comportamento no exterior irá influenciar o mercado doméstico hoje, que segue desconfortável com os riscos fiscais e o acúmulo de pressão inflacionária. Essas questões têm dificultando as tentativas do Ibovespa de reaver os 100 mil pontos e içando o dólar para além de R$ 5,50. A moeda norte-americana vem subindo há três semanas, enquanto a Bolsa brasileira não fecha o período no positivo há um mês.
O movimento dos ativos locais reflete a saída recorde de recursos externos do país, que somam quase US$ 30 bilhões pela via financeira, segundo o Banco Central. Esse volume nunca antes vistos reflete a desconfiança dos estrangeiros com o grau de responsabilidade do governo com as contas públicas. Desmatamento e queimadas em biomas e a marca de uma morte por covid-19 aqui a cada sete no mundo também estão na lista de desagrado.
Mas os malabarismos da equipe econômica para contemplar as demandas do governo, que não desistiu de um novo programa social, e do empresariado, que insiste na eficácia da desoneração da folha de pagamentos para gerar emprego, podem encaminhar a aprovação no Congresso da reforma tributária, que inclui também um novo imposto sobre transações financeiras. Resta saber se será suficiente para não furar o teto dos gastos.
Atividade e emprego em destaque
É nos indicadores econômicos que os investidores devem concentrar as atenções, de modo a aferir a realidade do cenário a ser traçado em tempos de pandemia, em busca de sinais de reversão de tendência. Com isso, merecem atenção os dados sobre o desempenho da indústria no Brasil e no exterior, ao longo da semana, e também os números sobre o mercado de trabalho aqui (Pnad) e nos EUA (ADP e payroll).
Entre outros pontos de relevo, destaque ainda para a terceira e última leitura do Produto Interno Bruto (PIB) norte-americano no segundo trimestre de 2020, que deve confirmar o tombo de 32%, no dado anualizado. Também serão conhecidos índices de confiança da atividade doméstica e do consumidor norte-americano. Na China, o feriado nacional pelos 71 anos da Revolução Popular paralisa o país por uma semana, a partir de quinta-feira.
Confira a seguir os principais destaques desta semana, dia a dia:
*Horários de Brasília
Segunda-feira: Como de praxe, a semana começa com as tradicionais publicações no Brasil, a saber, o relatório de mercado Focus do Banco Central (8h25) e os dados semanais da balança comercial (15h). O dia por aqui conta ainda com a divulgação da sondagem da indústria neste mês (8h). No exterior, o calendário econômico está esvaziado.
Terça-feira: O calendário doméstico segue carregado, trazendo os resultados deste mês do IGP-M e do índice de confiança do setor de serviços, além do índice de preços ao produtor (IPP) em agosto. Já nos EUA, saem os estoques no atacado no mês passado e a confiança do consumidor norte-americano em setembro. No fim do dia, a China anuncia o índice dos gerentes de compras (PMI) do setor industrial neste mês.
Quarta-feira: Dados sobre o mercado de trabalho no Brasil (Pnad) e no setor privado dos EUA (ADP) estão em destaque, mas também merece atenção a terceira e última estimativa do Produto Interno Bruto (PIB) norte-americano no segundo trimestre deste ano.
Quinta-feira: A agenda doméstica faz uma pausa, o que desloca o foco para o exterior, onde serão conhecidos números sobre a renda pessoal e os gastos com consumo nos EUA, além do índice de preços PCE. Destaque ainda para os índices PMI e ISM sobre a atividade industrial na zona do euro e nos EUA em setembro. Na China, o feriado nacional mantém a Bolsa de Xangai fechada até o próximo dia 8.
Sexta-feira: A semana chega ao fim trazendo como destaque o desempenho da indústria brasileira em agosto e os números oficiais sobre a geração de postos de trabalho e a taxa de desemprego nos EUA (payroll). Também serão conhecidas as encomendas às fábricas norte-americanas e a leitura final do sentimento do consumidor no país, medido pela Universidade de Michigan.