Chegamos à metade do mês de fevereiro em uma semana que novamente foi ocupada pela interação entre o Banco Central e o governo, com impacto relevante sobre as expectativas de inflação. Como já discutimos amplamente o tema na semana passada, vale adicionar que ganhamos companhia na deterioração dos ativos de riscos advindos do cenário internacional. Dados da atividade dos EUA mostram persistência da pressão inflacionária e já levam a uma alteração nas expectativas de juros para o restante do ano.
Desde o último trimestre do ano passado que o cenário global contempla a perspectiva de “pouso suave” da economia americana. Neste ambiente, o esforço de retirada de estímulo monetário implementado pelo Fed já estaria causando impacto na demanda agregada dos EUA. Somado à desinflação dos bens advinda da reabertura chinesa, a ideia central era que os EUA poderiam passar um período crescendo abaixo do produto potencial e isso provocaria um aumento da taxa de desemprego gradual, suficiente para levar a taxa de inflação de volta à meta.
No entanto, tivemos nesta semana a divulgação dos dados de vendas no varejo muito acima do esperado e de dados de inflação ao consumidor e ao produtor ainda pressionados. Ou seja, não somente a inflação realizada permanece em patamar elevado, como também o consumidor dá sinais de reagir a uma taxa de desemprego que está no menor patamar dos últimos 53 anos.
Não podemos deixar de mencionar que, na divulgação das vendas no varejo, houve um fator sazonal relevante, pois o clima nos EUA esteve atipicamente mais quente, o que levou a um aumento considerável de vendas em restaurantes. Ainda assim, a perspectiva de alívio das condições financeiras observada no final do ano passado e começo deste ano leva, através do efeito riqueza, a um aumento no consumo. Ou seja, na medida em que o Fed contribuiu para o alívio das condições financeiras, acabou estimulando também uma atenuação no ritmo de desaceleração da atividade dos EUA.
Tudo mais constante, isso de fato sugere que o esforço de desinflação terá de ser maior, o que por sua vez eleva a perspectiva de juros mais altos por mais tempo (como temos argumentado incessantemente). Essa percepção também permeou o mercado, e vimos uma acentuação dos movimentos na curva de juros dos EUA, com o título de 10 anos chegando à maior taxa dos últimos três meses.
Assim, o cenário global positivo para emergentes começa a ser testado justamente pelo lado que pode ter seu maior impacto sobre a liquidez global. O mercado tende a reagir negativamente a surpresas de política monetária nos EUA, e a coletânea de dados deste começo de fevereiro coloca ao menos alguma dúvida sobre os próximos passos do Fed. Devemos, portanto, observar cautelosamente os sinais dos membros do comitê de política monetária em direção à reunião de meados de março. Na quinta-feira (16/02), já começamos a escutar clamores por mais juros. Os dados provavelmente corroborarão essa postura.