Uma hora na biblioteca…
Um dos diversos temas pelos quais sou fascinado é etimologia. Carrego comigo, como espólio de minhas parcas incursões pela língua alemã, uma expressão que condensa de maneira única um conceito que me é muito caro: “Erfahrung”. Não precisa buscar o dicionário: já já eu explico.
Lembro, vários anos atrás, quando estava ainda tentando sair do Rio Grande do Sul, que vim a São Paulo fazer algumas entrevistas. Calhou de um gestor carioca com o qual eu havia feito contato algum tempo antes estar por estas bandas, e acabamos almoçando. Eu sempre amei falar sobre o mercado: via, naquelas reuniões, oportunidades para discutir ideias. Qual minha surpresa ao perceber que o principal foco de interesse dele era em minhas credenciais acadêmicas.
Foi frustrante, por dois motivos: o primeiro — e não há maneira bonita de fazer essa confissão — é que meu desempenho acadêmico foi pífio. Isso não significa, nem de longe, desapreço pelo estudo: sempre sofri, isso sim, de um imenso sentimento de desajustamento ao modelo de ensino. Certa vez um professor proferiu: “uma hora na biblioteca vale mais do que três em sala de aula”, afirmação que virou meu mote até o final da graduação.
O mercado é uma guilda
O segundo motivo é a razão da alusão à etimologia. Uma tradução superficial de “Erfahrung” é “experiência” (de vida). A origem é “fahrer”, que é “viajar”. Erfahrung é, portanto o predicado daquele a quem costumamos coloquialmente chamar de “viajado”.
A origem remonta a maneira através da qual tradicionalmente se adquiria um ofício na idade média: aquele que desejasse ser — digamos — ferreiro, dava seus primeiros passos como aprendiz do ferreiro local. Tendo absorvido todos os ensinamentos que aquele tinha a transmitir, ia para outra cidade em busca de um tutor mais experiente e assim por diante. O ferreiro mais reputado era, portanto, aquele que tinha viajado por mais lugares, aprimorando suas técnicas com os melhores.
O mercado financeiro funciona, em grande medida, como uma guilda medieval. Por mais que haja muito a aprender nas instituições acadêmicas, as lições mais preciosas vêm das experiências em primeira pessoa que somente o correr do tempo proporciona. Ilude-se, portanto, aquele que pensa que, ao apenas se embeberar dos arcabouços teóricos, estará automaticamente habilitado a sentar na mesa dos adultos: além das inevitáveis colisões entre teoria e realidade, há uma infinidade de sutilezas que só se transmitem no ato de fazer.
Para além da própria experiência
Não sei de ninguém na Empiricus que não seja leitor compulsivo. Nós simplesmente amamos ler, em grande medida por serem os livros uma porta de acesso insubstituível a um sem-fim de experiências e circunstâncias que seria impossível a cada um de nós, individualmente, viver na totalidade. Ler é, antes de tudo, expandir o próprio horizonte de consciência para além da própria experiência.
Com esse pensamento, não é de surpreender que tenhamos todos acompanhado com enorme entusiasmo a gestação da Luciana. Não me refiro a um bebê, mas a um livro. Ela dedicou os últimos meses a capturar a essência do jeito de pensar dos principais gestores de recursos do país, e o resultado é o Conversas com Gestores de Ações Brasileiros .
Erfahrung puro, com valor inestimável e em quantidade que absolutamente ninguém seria capaz de capturar de outra forma em uma única vida.
Todo o restante da minha fila de leituras terá de esperar. Eu vou começar por aqui, e recomendo fortemente que você faça o mesmo.
Em Brasília, 26 graus
Consulto o weather.com e constato que é um dia cinzento com 26 graus de temperatura na capital federal. É igualmente amena a temperatura da bolsa paulista, que opera perto da estabilidade. Maior movimentação se vê no mercado de DI, corrigindo o aparente exagero na abertura de taxas na última sexta.
A mesma previsão aponta para chances de tempestades em Brasília. Nada mais apropriado. Se sair, leve guarda-chuva.
O restante da semana promete ser igualmente delicado: amanhã tem pacote anticorrupção na Câmara e PEC do Teto no Senado. Eventos importantes para aferir o capital político do governo após Calero.
De olho no próximo problema
No mercado americano, o trade-Trump perde força e investidores voltam a olhar para outras questões. Bolsas em queda, treasuries e ouro em alta, com foco na Itália.
O motivo de preocupação é o referendo constitucional que terá lugar no próximo final de semana. Na hipótese de serem rejeitadas as reformas propostas, vê-se riscos de o país ficar com governabilidade comprometida. Ações de bancos italianos, altamente problemáticos (e não há nada de novo nisso…), materializam a aversão a risco nesse cenário.
Tudo serve como lembrete de que, apesar do que davam a entender as últimas sessões das bolsas, não está tudo bem mundo afora.