Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com
- Novas máximas no Índice Dólar
- Perspectiva de alta de juros nos EUA favorece a moeda americana
- Commodities estão em disparada desde as mínimas de 2020
- As primeiras duas razões para preços mais altos: inflação e logística
- Outras duas razões: descarbonização e poder de precificação
O último bull market secular nas commodities começou quando seus preços atingiram as mínimas de 2008 e a crise financeira global paralisou os mercados. Os bancos centrais e governos aprofundaram suas políticas monetárias e fiscais para estabilizar as condições econômicas em todo o mundo. A redução dos juros de curto prazo, a compra de dívida de longo prazo via programas de flexibilização quantitativa e os pacotes de estímulos forneceram a estabilidade necessária para a economia atravessar a crise imobiliária americana e da dívida pública europeia.
Um dos efeitos colaterais desses tratamentos foi um bull market nas commodities, responsável por alçar seus preços até as máximas plurianuais e, em alguns casos, históricas, em 2011 e 2012.
Em 2020, a pandemia mundial de Covid-19 foi uma crise totalmente distinta, mas os bancos centrais e governos empregaram os mesmos instrumentos fiscais e monetários. A única diferença foi que os níveis necessários foram maiores em 2020 do que nos doze anos precedentes. Essas políticas acenderam um estopim altista nas commodities em 2020 e 2021. Os níveis sem precedentes de liquidez e estímulos podem fazer com que o legado do vírus continue empurrando os preços para cima nos próximos anos.
Muito embora o Federal Reserve tenha começado a enfrentar as pressões inflacionárias, o dano já foi feito. O banco central americano está atrás da curva, com os últimos dados do índice de preços ao consumidor (IPC) atingindo seus registros mais altos em três décadas.
Bull markets raramente se movem em linha reta, e com as commodities não é diferente: sua volatilidade pode provocar correções periódicas bastante dramáticas. No entanto, a expectativa é que vejamos mínimas e máximas ascendentes no mercado de matérias-primas nos próximos anos, já que a fatura a ser paga por causa da pandemia é enorme.
Novas máximas no índice dólar
O dólar continua sendo a moeda de reserva mundial. Embora a economia chinesa esteja no encalço da americana para roubar sua posição de liderança, a moeda de reserva deve ser livremente conversível. As restrições impostas ao iuane retiraram seu caráter de reserva. A segunda principal moeda de reserva é o euro. O iene japonês, a libra esterlina e outras divisas também têm status de reserva, mas quem domina o mercado de câmbio internacional é o dólar.
Ao longo de 2021, o Índice Dólar, que compara a moeda americana a outras divisas internacionais, registrou movimento de alta.
Fonte: CQG
Como destaca o gráfico, o índice atingiu a mínima de 2021 no início de janeiro a 89,165 no contrato futuro contínuo, Desde então, ele vem registrando mínimas e máximas ascendentes. O pico mais recente foi a 96,940 no fim de novembro, patamar mais alto desde julho de 2020.
Perspectiva de alta de juros nos EUA favorece a moeda americana
Muitos fatores determinam o valor de uma moeda em relação a outra, mas os diferenciais de juros exercem papel preponderante na sua valorização ou desvalorização. Agora que o Fed está reduzindo seu programa de flexibilização quantitativa, primeiro passo para alçar a taxa dos fundos do Fed, tudo indica que os juros nos EUA irão subir nos próximos anos. Uma posição mais hawkish, isto é, rígida em termos de política monetária para combater as pressões inflacionárias pode acelerar esse processo.
Como o euro tem um peso maior no Índice Dólar, com uma exposição de 57,6%, os diferenciais de juros entre as divisas dos EUA e Europa têm maior relevância no estabelecimento da taxa de câmbio e no valor da moeda americana. Dados econômicos dos EUA sugerem um crescimento mais rápido no país do que na Europa, ampliando a lacuna entre as taxas de juros norte-americana e europeia, o que dá suporte ao dólar e o faz se valorizar. A tendência do Índice Dólar é de alta desde a mínima da semana de 4 de janeiro de 2021, e esse comportamento altista deve continuar vigorando em 2022.
Commodities estão em disparada desde as mínimas de 2020
Os mesmos instrumentos de política monetária empregados em 2008 e 2020 forneceram liquidez e estímulo ao sistema financeiro durante períodos turbulentos. Mas o enfrentamento da pandemia exigiu doses cavalares. De 2008 a 2012, os preços das commodities registraram um bull market secular, responsável por fazer seus preços atingirem máximas plurianuais e, em alguns casos, históricas.
Em 2020, a primeira commodity a exibir sinais de que as pressões inflacionárias se traduziriam em preços mais elevados foi o mercado do ouro. O ouro já havia registrado máximas recordes em várias moedas em 2019. Em agosto de 2020, seu preço ultrapassou a marca de 2000 dólares pela primeira vez. Em 2021, várias outras commodities deram continuidade a uma corrida de revezamento para cima, com uma entregando o bastão de alta para a próxima. O ouro corrigiu, mas, em fevereiro de 2021, a prata superou o patamar de US$30 por libra-peso pela primeira vez desde 2013, antes de as vendas ganharem força.
Em seguida, os preços das commodities agrícolas alcançaram máximas plurianuais, seguidos dos preços de energia. Em maio de 2021, a madeira serrada, o cobre e o paládio registraram novos recordes de preço, até a força da gravidade atuar para fazê-los corrigir. Em novembro de 2021, o café e o trigo futuro subiram até picos plurianuais. No início de dezembro, o café alçou-se a patamares ainda maiores, ultrapassando o nível de US$2,50 por libra-peso. Enquanto isso, até a recente liquidação nas ações e criptomoedas, elas já haviam alcançado máximas recordes.
O impacto da pandemia mundial de 2020 será sentido nos mercados nos próximos anos. A liquidez e os estímulos têm efeitos duradouros e abrangentes nos mercados de todas as classes de ativos. Como o dólar é a moeda de reserva mundial e a referência dos preços das commodities ao redor do mundo, sua valorização tende a pesar sobre os preços das matérias-primas. No entanto, podemos ver uma separação nesse relacionamento nos próximos meses e anos por quatro razões.
As primeiras duas razões para preços mais altos: inflação e logística
Os mercados de divisas são uma miragem, na medida em que medem o valor de um instrumento de câmbio internacional em relação a outro. Por isso, quando há uma desvalorização generalizada das moedas fiduciárias, inclusive o dólar, esse efeito não é imediatamente apreensível nas relações de câmbio internacional. A alta da inflação deteriora o poder aquisitivo do dinheiro.
A resposta global à Covid-19 cria uma situação única em que as moedas fiduciárias, em seu conjunto, estão perdendo valor. É plenamente possível que o Índice Dólar continue subindo nos próximos anos, juntamente com os preços das commodities durante sua corrida de revezamento altista. Na semana passada, em um sinal de que a inflação continua impactando o mercado, apesar da mudança de postura do Fed em relação à sua política monetária, o ilíquido mercado da madeira serrada voltou a superar a marca de US$900 por 1000 pés-tábua.
Fonte: CQG
O gráfico destaca a alta da madeira de US$448, em agosto de 2021, até mais que o dobro desse valor em 6 de dezembro. A madeira serrada é um mercado futuro extremamente ilíquido, mas geralmente é um precursor da ação dos preços em outros mercados de matérias-primas.
A logística é outro fator que contribui para a alta dos preços das commodities, apesar da valorização do dólar. Os gargalos nas cadeiras de fornecimento mundial continuarão em 2022 e posteriormente. Enquanto as taxas de vacinação nos EUA e Europa vêm aumentando, o mesmo não está acontecendo em outras partes do mundo. A produção de commodities ocorre em regiões onde a Terra é rica em reservas e onde o solo e o clima permitem o desenvolvimento da agricultura. Muitos países produtores continuam registrando bloqueios por causa da Covid-19, o que impacta a cadeia de fornecimento.
Outras duas razões: descarbonização e poder de precificação
O governo dos EUA e de outros países estão enfrentando a mudança climática e exigindo a transição de energia fóssil para fontes alternativas e renováveis. O caminho mais verde para a energia gera duas questões significativas para pressionar os preços das commodities para cima.
O cobre é um metal não ferroso essencial para a infraestrutura e, por isso, serve de barômetro da saúde e bem-estar da economia global. Os preços do metal tendem a subir durante ciclos de crescimento econômico e a cair em momentos de contração. Em maio de 2021, o cobre atingiu uma nova máxima histórica a quase US$4,90 por libra-peso antes de corrigir. O metal vermelho estava perto do nível de US$4,30 no início desta semana.
Fonte: CQG
O gráfico trimestral mostra a ação altista dos preços de mínimas e máximas ascendentes no mercado futuro do cobre desde 2001, quando ele tocou a mínima de 60,50 centavos por libra-peso. Analistas do Goldman Sachs (NYSE:GS) projetam que o cobre pode subir muito mais nos próximos anos, estabelecendo o preço-alvo de US$15.000 por tonelada em 2025. Nesse patamar, seu contrato futuro na Comex teria que subir para mais de US$6,80 por libra-peso.
De acordo com o banco americano:
“O cobre é o novo petróleo, e a descarbonização não ocorre sem o metal”.
O cobre e diversos outros metais e minerais necessários para a construção de baterias verão um crescimento de demanda. São necessárias décadas para colocar em operação novos projetos de mineração, ou seja, teremos déficits de oferta no horizonte. O boom de demanda só exacerba o potencial dos preços em um ambiente inflacionário, criando uma tempestade altista quase perfeita.
Ao mesmo tempo, o governo Biden vem incentivando o desenvolvimento de fontes alternativas de energia, inibindo a produção de petróleo, gás e carvão no país. Em março de 2020, a produção diária de petróleo americano atingiu o recorde de 13,1 milhões de barris por dia (mbpd). Na semana encerrada em 26 de novembro, a oferta doméstica estava 11,5% mais baixa, a 11,6 mbpd. O governo cancelou o oleoduto Keystone XL, proibiu perfurações de óleo e gás em território federal no Alasca e está restringindo outros oleodutos com ameaças ambientais.
Ocorre que os combustíveis fósseis ainda movem o mundo, inclusive os EUA. China e Índia, países mais populosos do planeta, consomem mais petróleo, gás e carvão a cada dia. Nos EUA, apenas cerca de 1% dos carros nas estradas são elétricos. Levará décadas para que essa mudança para outras fontes de combustível ocorra.
A transição para um caminho mais verde e a repentina mudança na política energética dos EUA em 2021 entrega o poder de precificação do petróleo nas mãos da Opep e da Rússia. Depois de décadas para alcançar a independência energética, os EUA decidiram ceder o controle dos preços no curto prazo para Riad e Moscou.
A missão do cartel é fazer com que os preços do petróleo fiquem o mais alto possível para seus membros no equilíbrio de oferta e demanda. Um declínio na produção americana faz com que a equação gere mais demanda e menos oferta. Até a semana de 26 de novembro de 2021, os estoques americanos de petróleo e produtos derivados registravam queda no ano, de acordo com a EIA, agência de informações energéticas dos EUA, e o API, Instituto Americano do Petróleo.
- Petróleo – queda de 60,20 milhões de barris (EIA) / 52,375 milhões de barris (API).
- Gasolina – queda de 20,80 milhões de barris (EIA) / 1,4079 mb API
- Destilados – 28,10 milhões de barris (EIA) / 22,473 mb (API)
O fato é que houve uma queda tanto na produção quanto nos estoques de petróleo dos EUA durante o governo Biden, no momento em que a demanda por energia dispara. Embora o barril de petróleo tenha corrigido nas últimas semanas, a tendência de médio prazo continua altista durante os meses sazonalmente fracos do inverno.
Fonte: CQG
O gráfico mensal ilustra que o barril de petróleo futuro negociado na Nymex caiu para US$62,43 na mínima da semana passada. A commodity energética ainda não violou a mínima de agosto de 2021 a US$61,74, preservando o padrão de mínimas ascendentes desde que o preço do barril atingiu brevemente o território negativo em abril de 2020.
A tendência no Índice Dólar é de alta, e a elevação dos juros nos EUA nos próximos anos pode fazer com que a moeda americana se valorize contra outras divisas internacionais. O legado da pandemia global e da nova política energética nos EUA pode fazer com que o bull market secular nas commodities continue, mesmo com o dólar se valorizando. Eu continuo otimista com os preços das matérias-primas, apesar da recente fraqueza do mercado e espero que a corrida de revezamento para cima siga em frente.