Por Nayara Figueiredo
SÃO PAULO (Reuters) - O preço do arroz no Brasil, que está em patamares nunca vistos diante de fortes exportações, queda nas importações e consumo interno elevado, deverá seguir firme apesar da isenção de tarifa de importação para algumas milhares de centenas de toneladas, avaliaram integrantes do setor e um analista.
A Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidiu nesta quarta-feira zerar a taxa de importação de arroz para uma cota de 400 mil toneladas do produto até o final do ano, a pedido do Ministério da Agricultura, diante do aumento de custos para a população.
O movimento do governo brasileiro, para isentar fornecedores de fora do Mercosul de tarifas de 12% sobre o grão beneficiado e 10% sobre o produto em casca, veio em meio a uma elevação generalizada de preços de alimentos básicos no país, incluindo o arroz, cuja cotação atingiu patamar recorde.
Na visão do setor produtivo, no entanto, a medida não tende a baixar significativamente os preços internos do grão, que foram impulsionadas pelo aumento na demanda decorrente da pandemia do novo coronavírus aliado ao dólar favorável para exportação.
O presidente da Federação dos Arrozeiros do Estado do Rio Grande do Sul (Federarroz), Alexandre Velho, disse à Reuters que a entidade foi surpreendida com a demanda do Ministério da Agricultura sobre a isenção da Tarifa Externa Comum (TEC), visto que o tema havia sido discutido recentemente.
"A Câmara (setorial) nacional tratou desse assunto na semana passada e foi unânime contra a isenção da TEC", afirmou.
Mesmo com a decisão da Camex, ele avaliou que não há espaço para queda de preço no Brasil tanto pelo nível de restrição da oferta quanto pelo calendário de safra dos fornecedores que seriam beneficiados com a medida.
"Não acredito na redução de preço, pela baixa disponibilidade do produto e também porque só terá produto para entrar aqui em novembro, de países como Estados Unidos e Índia, por exemplo. Não vejo mudança de mercado, mesmo baixando a TEC", disse.
O arroz em casca no Rio Grande do Sul, principal produtor nacional, fechou a terça-feira cotado em 104,17 reais por saca de 50 kg, alta de 10,8% na variação mensal e mais que o dobro da média de 45,15 reais registrada um ano antes, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
A Associação Brasileira da Indústria de Arroz (Abiarroz) ressaltou em nota publicada em seu site que o câmbio "praticamente inviabilizou as importações do produto de parceiros do Mercosul", que são isentos de tarifas. O fato contribuiu para a atual restrição de oferta no país, segundo a associação.
As importações de arroz pelo Brasil de janeiro a agosto somaram 373,3 mil toneladas, queda de 26% ante o mesmo período do ano passado, segundo dados do governo.
O analista da consultoria Safras & Mercado Gabriel Viana explicou que o Brasil já iniciou a temporada deste ano com estoques curtos devido a problemas climáticos no ciclo anterior.
Em meados de março, época de colheita no Rio Grande do Sul, a corrida pela aquisição do produto causada pelas incertezas referentes à pandemia impediu o tradicional recuo nos preços que deveria ocorrer.
"Essa preocupação com a segurança alimentar aconteceu em diversos países do mundo e os preços internacionais do arroz aumentaram... Para o Brasil, o câmbio tornou as exportações mais atrativas e ainda temos capacidade para exportação", disse Viana.
"Isso quer dizer que os preços podem subir ainda mais, é provável que subam... essa retirada da TEC não vai ter impacto significativo", acrescentou.
Dados do Ministério da Agricultura indicam que, até agosto, as exportações de arroz no ano alcançaram 982,9 mil toneladas, alta de 48% ante o mesmo período de 2019.
PATRIOTISMO
O presidente Jair Bolsonaro chegou a afirmar na semana passada que pediria "patriotismo" aos donos de supermercados para evitar aumentos de preços aos consumidores.
Na terça-feira, ele disse que tem pedido aos lojistas que produtos essenciais sejam vendidos com margem de lucro "próxima de zero".
Em entrevista à CNN Brasil na noite de terça-feira, a ministra Tereza Cristina disse que sua pasta tem monitorado os estoques de produtos agrícolas.
"Nossa grande preocupação é que não faltem alimentos nos supermercados", afirmou ela, ao citar mudanças na demanda devido a novos hábitos alimentares dos brasileiros durante a pandemia de coronavírus, com muitas pessoas ficando em casa após quarentenas decretadas por governos e prefeituras para reduzir a disseminação da doença.
A ministra garantiu que a próxima safra de arroz, que começa a ser plantada agora, ajudará a reduzir os problemas de oferta.
"Esse arroz ele começa a ser colhido em janeiro, em meados de janeiro ele já está sendo colhido, e nós teremos uma safra bem maior... ano que vem teremos um estoque bem maior de arroz", afirmou.
O Ministério da Agricultura disse no final de agosto que avaliava a possibilidade de isentar temporariamente de tarifas importações de arroz, milho e soja de países que não são membros do Mercosul para equilibrar o mercado doméstico e impedir aumentos de preços.