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A meta de inflação deve ser elevada ou não? Veja o que pensam os especialistas

Publicado 07.02.2023, 13:51
Atualizado 07.02.2023, 21:05
© Jessica Bahia Melo
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Por Jessica Bahia Melo

Investing.com - Diante da meta inflacionária estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), as falas contra o patamar atual da taxa básica de juros da economia brasileira de 13,75% ao ano foram constantes nas últimas semanas. Quem defende a manutenção da meta acredita que uma mudança no entendimento pode desancorar as expectativas e resultar em juros mais altos do que o projetado no futuro. Já a visão de economistas que querem a revisão é de que a meta não é praticável e vai exigir juros elevados ainda neste ano, podendo comprometer níveis de emprego e de atividade econômica.

O último Boletim Focus divulgado pelo Banco Central nesta segunda-feira, 06, mostra que os economistas consultados pela autoridade monetária esperam que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), termine 2023 a 5,78%, bem distante do centro da meta de 3,25%, com 1,5 ponto percentual de tolerância, ou limite superior de 4,75%. No ano de 2022, a meta do indicador oficial de inflação já foi descumprida. O consenso é de que a Selic feche o ano a 12,5%.

Revisão pode desancorar expectativas

Ainda que a meta não seja cumprida, o mercado resiste à ideia de alterar o indicador que já foi estabelecido e enxerga como negativas as últimas falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre os juros e a independência do Banco Central.

Marcelo Costa, diretor de treasury sales & structuring do banco BR Partners (BVMF:BRBI11), destaca que os pronunciamentos para uma possível revisão da meta são prejudiciais porque deterioram as expectativas de inflação, conforme entrevista publicada no Investing.com Brasil. “Temos outra variável importante no curto prazo que é a troca do nosso diretor de política monetária, o Bruno Serra. O Roberto Campos quer trazer uma pessoa de mercado e o governo está tentando trazer alguém mais do front político. Tudo isso mexe muito com as expectativas de inflação”.

O time macro do BTG (BVMF:BPAC11) possui o mesmo entendimento. Em relatório divulgado aos clientes e ao mercado, o banco alertou que uma possível elevação da meta de inflação pode ser interpretada como pouco compromisso da política econômica com inflação baixa, o que resultaria em inflação mais alta à frente. “Nada garante que as taxas de juros reais seriam mais baixas com meta de inflação mais alta. De fato, a história mostra pouca correlação”, aponta o documento. O relatório do BTG estima qual seria um impacto da revisão da meta para 4,5% de 2024 em diante, por exemplo. Os analistas calculam que as projeções de inflação subiriam 6,0% e 5,6% em 2023 e 2024, respectivamente, se a trajetória da Selic for a mesma da pesquisa Focus.

Com essa desancoragem, o BTG afirma que haveria o risco de o BC ter que subir a Selic para o patamar próximo de 15% ainda neste ano. “A manobra de elevar a meta para a inflação parece, portanto, arriscada, com benefícios no máximo temporários, e com riscos de ocasionar uma elevação maior do que a almejada da taxa de inflação”, conclui o banco.

Felipe Camargo, economista da América Latina da Oxford Economics, considera o Regime de Metas de Inflação um sucesso, pois conseguiu ancorar as expectativas ao longo do tempo ao redor da meta, ainda que com oscilações. Camargo é contrário à revisão da meta, mas explica que um argumento mais “ortodoxo” sobre o assunto seria a relação da política fiscal, que é mais indexada à inflação, levando em consideração que o orçamento público é muito baseado na inflação passada. Na política econômica, poderia haver maior flexibilidade para o governo reduzir o gasto em termos reais em algumas rubricas.

Em relação ao argumento “heterodoxo”, Camargo explica por que não considera a definição de juros pela política monetária como discricionária, apenas determinada pela autoridade monetária. “Eu não concordo com esse argumento porque eu não acho que a taxa de juros seja exógena. Eu acho que ela é endógena. Eu acho que ela depende de condições de mercado”.

O economista da Oxford Economics traz exemplo de investidores em títulos públicos pré-fixados, que escolhem determinado ativo que promete pagar um valor adicional à inflação, por exemplo. Se a meta muda, o investidor pode ser prejudicado, exigindo uma compensação maior para ter que comprar um título no futuro, pois perdeu a confiança de que aquele seria um bom negócio. “Na minha opinião, isso vai gerar esse risco de prêmio de inflação. O investidor vai querer um retorno nominal mais alto, mais prêmio pela incerteza que há sobre qual vai ser a inflação média no período do investimento”.

Meta não deve ser cumprida e juro alto pode prejudicar indicadores

Em contraponto, Julia Braga, professora de economia da Universidade Federal Fluminense (UFF), avalia que as expectativas aumentaram não por uma falta de credibilidade na política monetária, mas porque houve um erro de avaliação ano passado por parte dos analistas, quando a inflação ao consumidor foi reduzida devido às desonerações dos combustíveis.

“Ficou a sensação de que o processo estava controlado, mas esse tipo de medida surte um efeito apenas temporário. Ocorreu em 2021 e 2022 um choque de oferta muito forte e existe uma inércia natural que acaba propagando os choques para além de um ano, já que vários preços (especialmente os administrados) são reajustados levando em consideração a inflação do ano anterior”, contrapõe a professora.

Na visão de Braga, não somente o centro, mas também o intervalo de tolerância da meta deveria ser revisto para cima. A meta atual é considerada irrealista para a professora, tanto para o histórico brasileiro como na comparação internacional. “Para 2023 o Fundo Monetário Internacional (FMI) espera uma inflação média de 6,4% para o grupo de economias emergentes, 5,1% na média mundial e 3,1% para as economias avançadas. Essa discussão de alterar a meta não está ocorrendo somente no Brasil, mas também nos EUA. Não faz sentido o Brasil ter uma meta de país avançado”, completa.

Metas de inflação e tolerâncias


A professora lembra que o próprio mercado já precificou uma inflação acima da meta esse ano e acha que, nesse caso, seria benéfico mudar para um patamar exequível, pois mantê-la no limite atual exigiria juros mais elevados para tentar viabilizar o cumprimento, encarecendo mais o crédito e prejudicando a atividade econômica.

As expectativas de médio prazo iriam se ancorar naturalmente para essa nova meta, segundo Braga, por três razões: “Primeiro, não existe a perspectiva de um novo choque acontecer. A desinflação está acontecendo nos EUA no mundo. É improvável que o preço das commodities nos mercados internacionais dispararem como aconteceu nesses últimos dois anos. Tem acontecido um processo de valorização do real o que contribui muito para esse processo de desinflação. Além disso, a economia brasileira não está em pleno emprego. Os indicadores amplos do mercado de trabalho mostram uma situação ainda frágil para o trabalhador”, pondera.

O professor de economia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Daniel Vasconcelos concorda com Braga, pois considera a meta irrealista. “A tendência é de que o Banco Central suba muito a taxa de juros, e já estamos com um patamar bastante elevado. Assim a economia brasileira acaba penalizada por um excesso de rigor”, critica Vasconcelos, que indicou que muitos fatores, como a alta das commodities, que impactaram a inflação brasileira, são problema a nível internacional após a Guerra da Ucrânia.

Quer saber mais detalhes sobre o Regime de Metas de Inflação? Confira o vídeo abaixo:

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