Em dia de IPCA-15 bem acomodado em junho, mas de falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra a "Faria Lima", e de novo déficit nas contas do Governo Central, o Ibovespa oscilou à tarde entre leves perdas e ganhos moderados, apesar do prosseguimento da pressão sobre o câmbio, movimento que colocou o dólar a R$ 5,52 na máxima desta quarta-feira de avanço também para a curva de juros doméstica. O índice oscilou pouco menos de 1.300 pontos entre a mínima (121.402,00) e a máxima (122.701,20, +0,30%), quase no fechamento da sessão, ainda em alta de 0,25%, aos 122.641,30. Hoje, saiu de abertura aos 122.331,39 pontos, com giro a R$ 19,3 bilhões nesta quarta-feira.
Assim, retoma trilha positiva após perda de 0,25% no dia anterior, que havia interrompido sequência de cinco altas, a mais longa desde fevereiro. Depois de permanecer aos 119 mil entre 12 e 18 de junho, o Ibovespa conserva alguma recuperação rumo ao fim do mês, aos 122 mil pontos nas últimas três sessões. Faltando a quinta e a sexta-feira para o fim de junho, o Ibovespa sobe 0,44% no mês e 1,07% nesta última semana do intervalo. Caso se confirme o avanço depois de amanhã, será o primeiro desempenho positivo para o índice desde fevereiro - em alta então de 0,99%, até aqui o único mês de ganho em 2024. No ano, cai 8,60%.
Apesar da proximidade do fechamento de junho, é cedo para antever o resultado, na medida em que o mercado segue muito atento aos ruídos fiscais, com percepção de risco doméstico aguçada ao longo deste último mês do semestre, em que o Ibovespa se descolou de Nova York: por lá, os ganhos em junho chegam a 3,80% para o índice amplo (S&P 500) e a 6,39% para o tecnológico (Nasdaq), até esta quarta-feira.
A despeito do comportamento desfavorável do câmbio e da curva do DI na sessão, "o Ibovespa teve fluxo comprador, com o estrangeiro voltando a injetar recursos desde a semana passada" e hoje, mesmo com a pressão nos demais ativos, a Bolsa conseguiu operar "perto da estabilidade, refletindo também um IPCA-15 melhor do que o esperado", diz Andre Fernandes, head de renda variável e sócio da A7 Capital. Com o leve ganho desta quarta-feira, o Ibovespa se mantém no maior nível de fechamento desde 6 de junho.
Bernard Faust, sócio da One Investimentos, destaca que tal fluxo de entrada, ainda que venha a se confirmar, não é comparável ao que tem sido visto tanto no mercado americano como nos europeus. "Há propensão a risco, mas o cenário aqui é um pouco diferente, com a abertura bem expressiva vista na curva de juros desde cedo e o ganho de força do dólar ao longo do dia, o que demonstra o fluxo de saída de capital do mercado brasileiro", diz. "A política explica esse descolamento, com perspectiva fiscal deteriorada", acrescenta Faust.
Não obstante a leitura benigna sobre a prévia (IPCA-15) da inflação oficial de junho, os investidores ainda monitoram os sinais sobre as contas públicas - e a fala do presidente Lula contra a "Faria Lima", pela manhã, não contribuiu para mitigar esse mal-estar, observa Charles Burrows, chefe de investimentos internacionais do Neela Bank. "Se o setor está com visão pessimista, tem seus motivos. Escolhas políticas acabam gerando um ambiente que não favorece o crescimento. Para estimulá-lo, é importante controlar os gastos governamentais."
Analistas apontam que, apesar dos esforços do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para manter vivo o discurso da responsabilidade fiscal, a relutância do presidente Lula quanto a cortes de gastos tem permanecido sob o escrutínio dos investidores. "A Faria Lima não está contra o Brasil: pelo contrário, depende de um Brasil cada vez mais forte", diz Burrows.
Em entrevista ao UOL nesta manhã, o presidente Lula disse que "as pessoas da Faria Lima pensam no lucro, e o Brasil precisa ter alguém que pensa no povo". No dia seguinte à presença, fora de agenda, do diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, a uma reunião no Palácio do Planalto com participação do mandatório, Lula afirmou hoje que Galípolo é um "companheiro altamente preparado", mas que ainda não está pensando na sucessão de Roberto Campos Neto. "O Galípolo veio aqui numa reunião em que a gente estava discutindo a meta inflacionária. A novidade foi estabelecer a meta contínua", resumiu o presidente.
Confirmada hoje, a regulamentação do novo sistema de meta de inflação contínua pode servir como reforço positivo para frear a desancoragem das expectativas do mercado, na avaliação da economista-chefe da Galapagos Capital para o Brasil, Tatiana Pinheiro, reporta o jornalista Cicero Cotrim, do Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
Divulgado pelo Tesouro nesta tarde, o resultado primário do governo central em maio, com déficit de R$ 60,983 bilhões, confirmou que o governo está conseguindo ganhos importantes pelo lado da arrecadação, mas a magnitude do aumento permanece abaixo da elevação das despesas, diz o economista da Buysidebrazil Italo Faviano, reporta o jornalista Daniel Tozzi Mendes, do Broadcast.
Assim, prossegue o desequilíbrio entre receitas e despesas, que alimenta a narrativa do mercado de que um ajuste efetivo nas contas públicas dependerá de cortes de gastos: na comparação com o mesmo intervalo do ano passado, a arrecadação teve alta real de 8,3%, enquanto as despesas subiram 14,0%.
Em entrevista coletiva após a divulgação dos números de maio, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que o presidente Lula tem dado apoio, de forma "irretocável", à agenda de revisão de gastos. "Sinalizações são de total apoio à equipe, muitas vezes há interpretações sobre trechos das colocações. Mas digo que o presidente tem nos apoiado de forma irretocável", afirmou.
O resultado de maio, contudo, levou o Ibovespa ao negativo do meio para o fim da tarde, após ter ensaiado leve recuperação no começo da etapa vespertina, mesmo na contramão do dólar e da curva dos DIs, mais cedo - a piora do câmbio e dos juros futuros, em paralelo, firmou o índice da B3 (BVMF:B3SA3) um pouco abaixo da estabilidade em direção ao fechamento, mas ao fim o Ibovespa sustentou o sinal positivo.
Na ponta do Ibovespa nesta quarta-feira, destaque para Usiminas (BVMF:USIM5) (+3,32%), Prio (BVMF:PRIO3) (+2,38%) e IRB (BVMF:IRBR3) (+2,36%). No lado oposto, Pão de Açúcar (BVMF:PCAR3) (-7,77%), Azul (BVMF:AZUL4) (-5,56%) e Petz (BVMF:PETZ3) (-4,08%). Entre as ações de primeira linha, Vale ON (BVMF:VALE3) fechou em alta de 1,24%, com Petrobras (BVMF:PETR4) também no positivo no encerramento (ON +0,51%, PN +0,16%), o que deu um pouco mais de fôlego para o Ibovespa na reta final. Destaque também para Gerdau (BVMF:GGBR4) (PN +2,07%), na máxima do dia no fechamento.
Entre os grandes bancos, o encerramento foi em geral moderadamente negativo. Bradesco (BVMF:BBDC4) PN conseguiu flutuar para cima, em leve alta de 0,24%: na máxima do dia no fim da sessão assim como Itaú (BVMF:ITUB4) PN (-0,18%) e Bradesco ON (também -0,18%), embora estas duas tenham conservado o sinal negativo no fechamento.