Por Geoffrey Smith
Investing.com – O veredito parece estar dado: 2023 será o ano em que os títulos darão o chute que as ações estavam pedindo nos últimos 12 anos.
O consenso em Wall Street e na Europa sugere que a renda fixa terá melhor desempenho no ano que vem, após o que alguns classificam como “redefinição histórica” da inflação global, crescimento e taxas de juros, jogando o mundo desenvolvido em uma recessão e ajuste de contas.
Os soluços de alívio dos gestores financeiros – principalmente na Europa, onde os juros zero fizeram com que os títulos fossem uma péssima aposta na última década – são particularmente intensos, e não poderia ser diferente. Na maioria dos casos, o investimento em títulos requer um discernimento maior por parte do gestor do que simplesmente fazer alocações em fundos de índice, que permitiram aos investidores de ações ganhar muito dinheiro fácil até a debacle deste ano. E a gestão mais ativa requer taxas de administração mais elevadas, possibilitando que a indústria retorne para um modelo de negócios mais simples e – verdade seja dita – mais honesto, após cinco anos de “lavagem verde” sistemática na forma de fundos com temática ESG.
Mas chega de cinismo. O consenso está certo? Certamente há bons argumentos para acreditar que sim.
Depois de oferecer um pouco mais do que migalhas na última década, os títulos estão agora gerando retornos significativos: os papéis referenciais livres de risco nos EUA, Reino Unido e zona do euro rendem 4,47%, 3,20% e 2,01%, respectivamente, no momento da redação. Já os títulos corporativos de alta qualidade, hipotecários e subsoberanos rendem muito mais. Ainda que estejam abaixo das taxas atuais de inflação, a probabilidade de esta cair nos próximos dois anos faz com que a manutenção desses papéis em carteira não seja mais uma forma de destruir lentamente o patrimônio, como vinha acontecendo durante a era da flexibilização quantitativa.
A recessão já está se consolidando na Europa e deve chegar aos EUA em torno de meados do próximo ano, enquanto os últimos acontecimentos deixaram claro como será difícil para a China escapar da armadilha da Covid Zero, aumentando as chances de que a segunda maior economia do mundo registre mais um ano de baixo crescimento.
Não é um cenário muito favorável para bons retornos com ações. Analistas do Morgan Stanley acreditam que as ações ainda têm mais espaço para cair, com a recessão vindoura deprimindo os resultados. Lisa Shalett, diretora-chefe de investimentos da unidade de gestão de patrimônio do Morgan Stanley (NYSE:MS), declarou em uma publicação nesta semana que o lucro das empresas do S&P 500 será de apenas US$ 195 por ação no ano que vem, em vez dos US$ 230 esperados atualmente.
Em um ambiente de juros mais altos, “a extraordinária capacidade das empresas de aumentar as vendas e a rentabilidade nos últimos anos é insustentável e deve se reverter em breve”, argumentou.
O foco do público no atual estado da economia, em vez das projeções, fará com que as ações tenham uma reação menos imediata e previsível do que os títulos, à medida que os bancos centrais deixam o aperto e passam a flexibilizar sua política.
Mas o primeiro sinal de flexibilização costuma ser suficiente para persuadir as instituições financeiras a manter abertas as linhas de crédito para as grandes empresas, daí a recomendação do estrategista-chefe de mercado do BNP Paribas (OTC:BNPQY), Daniel Morris, no sentido de que o crédito corporativo de nível de investimento é o melhor lugar para estar nos próximos meses.
“Os valuations menores (isto é, spreads elevados) não refletem com precisão o que acreditamos ser fundamentos favoráveis”, escreveu em nota aos clientes nesta semana. Por outro lado, ele afirmou: “Ainda não estamos prontos para adicionar ativos mais arriscados à carteira, como ações, já que ainda pode haver uma queda maior no crescimento e nos lucros”, sem falar no risco sempre presente da geopolítica, capaz de piorar ainda mais as coisas no ano que vem.
Sem dúvida, o ano de 2022 não tem sido nada bom. O típico portfólio de 60/40 para ações e títulos gerou um retorno negativo de 20% até outubro, em comparação com a média de 9%-10% dos últimos 50 anos, de acordo com Morris, do BNP. Mesmo em 2008, esse portfólio só perdeu 14%.
Mas muitos especialistas ainda alertam para o perigo de apostar em uma recuperação rápida demais.
“Manter qualquer um dos ativos trará mais resultados no ano que vem do que neste”, declarou Tom Stevenson, diretor de Investimento da Fidelity Personal Investing, em uma publicação nesta semana. “Mas fazer uma rotação do maior peso em títulos governamentais, no início do ano, para uma preferência por ações no fim do ano pode acabar tornando um ano bom ainda melhor”.