Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou nesta sexta-feira que não desistiu da implementação de um imposto sobre transações, nos moldes da antiga CPMF, para bancar a ampla desoneração da folha das empresas dentro de plano para impulsionar a geração de empregos.
Em evento promovido pela XP Investimentos, ele também negou que o governo irá estender o auxílio emergencial para 2021, frisando que haverá respeito à regra do teto de gastos após o período de calamidade neste ano em função da pandemia de Covid-19.
Na véspera, Guedes havia dito à CNN Brasil que talvez desistisse do novo imposto. Nesta noite, contudo, ele justificou ter dado uma informação equivocada no lugar da sua usual explicação sobre a necessidade de um tributo dessa natureza para promover um bem maior --a geração de postos de trabalho.
"Eu não me importo se o tributo é feio desde que ele funcione criando novos empregos. É válido. Mas então eu dei uma informação errada ontem, porque é esse o sentimento. Primeiro eu disse: 'Bem, talvez eu deveria ter falado com ela (repórter)'. Aí quando eu falo com ela, é o mesmo assunto, a mesma porcaria, que é: 'Você está criando uma nova CPMF?'. Não, de jeito nenhum. Ao invés de explicar, eu disse: 'Escute bem, eu esqueci, eu desisti'", afirmou ele, em participação em inglês.
O ministro disse que "de modo algum" desistiu da investida.
"Eu não sou um homem de desistir facilmente das coisas", emendou.
Guedes sempre se mostrou a favor da instituição de um imposto sobre transações de base ampla para bancar a desoneração da folha de salário das empresas, mas a equipe econômica ainda não chegou a formalizar sua proposta.
Sobre a eventual extensão do auxílio emergencial para o próximo ano, o ministro se posicionou após preocupações nesse sentido terem novamente mexido com o mercado financeiro nesta sexta-feira.
"Não há qualquer plano para estender o auxílio, nenhum. Isso não é verdade. Isso não é nossa intenção, não é o que o presidente disse. Não é o que o ministro da Economia quer. De jeito nenhum", afirmou ele.
"A doença (Covid-19) está diminuindo e, à medida que diminui, o Brasil está em recuperação em 'V', e nós devemos ter responsabilidade quanto ao nosso orçamento e devemos mostrar que somos responsáveis, e fortes, e resilientes o suficiente para pagar pela nossa guerra ao invés de rolar para nossas crianças no futuro", completou.
Ecoando falas recentes, o ministro voltou a defender que, caso o país seja novamente atingido por uma pandemia num outro ano, a reação será rápida e forte tal qual em 2020. À parte essa possibilidade, ele reiterou que é necessário respeitar o teto de gastos, que limita o crescimento dos gastos públicos à inflação medida no ano anterior.
"Quando a pandemia nos atingiu, nós criamos um regime emergencial. Agora, nós não podemos utilizar a desculpa do regime emergencial para explodir o teto de gastos", disse.
ESTRESSE NO MERCADO DE DÍVIDA
Quanto à reação recente do mercado de dívida, com elevação dos prêmios e inclinação da curva de juros, Guedes avaliou que isso está acontecendo porque os agentes estão vendo problemas na disposição de "pessoas" de quebrar o teto e de "políticos ruins" de usar o coronavírus como desculpa para a implementação de políticas populistas.
Guedes destacou que o governo não irá fazer uma operação "twist" para endereçar o problema, em referência a eventual compra de títulos longos pelo Banco Central numa tentativa de achatamento da curva.
"Nós não queremos falsificar o negócio. Queremos dar ouvidos aos sinais do mercado e reagir corretamente para criar expectativas apropriadas", afirmou ele.
PROMESSAS QUEBRADAS
Em meio a cobranças de que não estaria entregando compromissos firmados publicamente, o ministro voltou a dizer que o "timing" da apreciação de reformas é dado pela política.
Sobre promessa feita no início de julho de que quatro grandes privatizações ocorreriam em 90 dias, ele afirmou ter feito a previsão após conversas com a base política para operações envolvendo Correios, Eletrobras (SA:ELET3), os contratos de petróleo da PPSA e o Porto de Santos.
Mas Guedes sinalizou que, nesse ínterim, as aspirações foram barradas pela política.
"Nós concordamos politicamente entre nós. E, então, eu falo de novo: 'Em 90 dias nós vamos anunciar quatro grandes privatizações'. E, então, 90 dias se passam e não há anúncio. O que ocorreu? Política novamente", disse.
O ministro defendeu que, em meio à turbulência da crise, avanços que têm sido feitos pelo governo acabam despercebidos.
De acordo com Guedes, apesar da gravidade do surto de Covid-19, o governo não abandonou seus planos de domar a explosão dos gastos previdenciários (com a reforma aprovada no ano passado), as despesas com juros da dívida pública (com a Selic em seu menor patamar histórico) e o aumento dos salários do funcionalismo --em relação a essa última frente, o congelamento foi aprovado até o próximo ano em troca da ajuda extraordinária a Estados e municípios neste ano.
Guedes disse também que algumas medidas já implementadas, como para o mercado de gás, estão surtindo efeito.
"As pessoas cegas não veem nada, elas continuam gritando e reagindo aos ruídos. Elas não veem nada. Elas não veem que o gás natural já está caindo, futuros contratos já estão sendo feitos com 30%, 40%, 50% de redução de custos", disse.
O ministro pontuou que os gastos públicos em função do quadro de pandemia chegarão a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, mas afirmou que não há arrependimento quanto a esse volume.
"Nós faríamos tudo de novo, provavelmente até mais, caso pudéssemos, mas agora nós devemos retornar à agenda de reformas. Nós saímos do caminho para apagar o incêndio na floresta e estamos de volta ao caminho, o caminho de reformas", disse.
Guedes afirmou que tanto as reformas quanto as privatizações serão aceleradas nos próximos dois anos da gestão Jair Bolsonaro e que o governo está "só começando", após os dois primeiros anos do mandato terem sido marcados pela "tentativa de sobrevivência" e "fuga do escuro".
A avaliação do ministro foi de que uma maioria de centro-direita está sendo construída e que o Congresso está fazendo "grande e maravilhoso trabalho". Ele voltou a elogiar a atuação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também citando os deputados Ricardo Barros (PP-PR), que é líder do governo, e Arthur Lira (PP-AL), líder do centrão.
(Por Marcela Ayres e Gabriel Ponte)