A ausência de surpresas negativas vindas de Brasília e o ambiente externo de apetite por ativos de risco abriram espaço para que dólar recuasse no pregão desta segunda-feira, 25, em um movimento de correção após a alta de 3,16% na semana passada, quando chegou a ser negociado acima de R$ 5,70 diante da proposta de mudança do teto de gastos e de rumores de saída de Paulo Guedes do ministério da Economia. Segundo operadores, contribuíram também para a recuperação parcial da moeda brasileira a entrada de fluxo estrangeiro para a Bolsa brasileira e a perspectiva de que o Comitê de Política Monetária (Copom) acelere o passo do aperto monetário na quarta-feira, 27, elevando a Selic em 1,25 ponto ou 1,5 ponto porcentual.
Afora uma leve alta logo na abertura dos negócios, o dólar operou em queda durante todo o dia, rompendo o piso de R$ 5,60 ainda pela manhã. Ao longo da tarde, em meio à renovação de recordes das Bolsas em Nova York e aceleração dos ganhos do Ibovespa, a moeda americana registrou sucessivas mínimas, descendo até R$ 5,5377 (-1,59). Com desaceleração das perdas na reta final dos negócios, o dólar fechou o dia em baixa de 1,27%, a R$ 5,5557, o que reduziu a alta acumulada em outubro para 2,01%.
Vale ressaltar que o giro com o contrato de dólar futuro para novembro, que havia superado US$ 20 bilhões na sexta-feira, foi hoje de cerca de US$ 12,8 bilhões. Isso sugere, segundo operadores, que o movimento mais agressivo de ajustes de posições fiscal pode ter ficado para trás. Dados compilados pela corretora Renascença mostram que, na sexta-feira, os fundos locais lideraram as movimentações, reduzindo posições vendidas (que ganham com a queda do dólar) em 20.650 contratos (US$ 10,3 bilhões).
No exterior, o índice DXY - que espelha a variação do dólar frente a seis divisas fortes - operou em leve alta, mas a moeda americana recuou em relação à maioria dos emergentes, com destaque para o peso chileno, o rand sul-africano e a lira turca. O real, que tanto apanhou na semana passada, nesta segunda foi o destaque do pelotão.
Para diretor de operações da Câmbio Curitiba, Lucas Schroeder, o movimento de alta do dólar na semana passada, em meio ao noticiário fiscal e político conturbado, foi desproporcional. "Houve muita especulação com notícias de fim do dia que impactaram o dólar e hoje a moeda cai com correções. Estamos vendo também um movimento muito forte de compra de estrangeiros na Bolsa, para aproveitar oportunidades", afirma.
As ações da Petrobras (SA:PETR4) dispararam ao longo da tarde, turbinando o Ibovespa, após informação da CNN de que a União estuda vender ações da petroleira em volume suficiente para deixar de ser acionista majoritária da empresa. O governo manteria, contudo, a chamada "golden share", preservando o direto de indicar o presidente e evitar determinadas operações.
Schroeder também chama a atenção para o aumento das apostas em uma aceleração do ritmo de alta da Selic, em meio à deterioração recente das expectativas de inflação, ratificadas nesta segunda pelo Boletim Focus. Embora avalie que é preciso ter cautela por conta das questões político e fiscais, ele vê espaço para que o dólar volte a ser negociado na casa de R$ 5,40 até o fim do ano. "Não deve cair muito mais do que isso porque o cenário político, com as movimentações para as eleições do ano que vem, já começa a impactar o dólar", diz.
No Boletim Focus, houve aumento da medida das expectativas para o IPCA neste ano (8,69% para 8,96%) e para 2022 (de 4,18% para 4,40%). Já a estimativa para a taxa Selic no fim deste ano subiu de 8,25% para 8,75%. Ao longo do dia, diversas casas divulgaram relatórios alterando a expectativas tanto para alta da Selic no Copom desta semana (de 1 ponto para 1,25 ou 1,50 ponto porcentual) quanto para a extensão do atual ciclo de elevação.
Capitaneada pelo ex-diretor do BC Mário Mesquita, a equipe de economistas do Itaú Unibanco passou a trabalhar com alta de 1,5 ponto da Selic, para 7,75%, nesta semana e com taxa básica de 11,25% em março de 2022. O banco também elevou a estimativa para a taxa de câmbio de R$ 5,25 para R$ 5,50 no fim deste ano e do próximo, argumentando que, "apesar das taxas de juros mais altas, a maior incerteza fiscal, como indicado pela reação recente do mercado, limita o espaço para a valorização do real".
O sócio e economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, não espera um ingresso expressivo de recursos externos para aproveitar uma Selic mais elevada "enquanto durar a pressão sobre o prêmio de risco, o juro real negativo e a expectativa de desvalorização média do real ainda elevada".
"Há incertezas presentes em relação ao valor do Auxílio Brasil em patamar até superior à R$ 400 e tentativas de novas exclusões de gastos da regra do teto", afirma, em relatório, o economista, que revisou o cenário de "Selic mínima" de 10,50% para 10,75% e vê chance de 50% da taxa básica atingir 11,50% no fim do ciclo de aperto. "A PEC dos Precatórios é uma solução de curtíssimo prazo para dar espaço de gasto no orçamento de quase de R$ 85 bilhões, mas para o mercado o fato concreto é que a política fiscal mais expansionista veio para ficar."