Por Fabricio de Castro
(Reuters) - O dólar voltou a disparar nesta sexta-feira no Brasil, chegando a ser cotado a 5,60 reais durante a sessão e encerrando no maior valor desde janeiro de 2022, em mais um dia de tiroteio retórico entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, com as cotações sendo impulsionadas ainda pela disputa em torno da taxa Ptax de fim de mês e trimestre.
A moeda norte-americana à vista encerrou o dia cotada a 5,5907 reais na venda, em alta de 1,50%. Este é o maior valor de fechamento desde 10 de janeiro de 2022, quando encerrou em 5,6723 reais. No mês, a divisa acumulou alta de 6,47% e, no trimestre, elevação de 11,47%.
Às 17h27, na B3 (BVMF:B3SA3) o contrato de dólar futuro de agosto -- que passou a ser o mais líquido nesta sexta-feira -- subia 1,57%, aos 5,6135 reais.
Taxa de câmbio calculada pelo Banco Central com base nas cotações do mercado à vista, a Ptax serve de referência para a liquidação de contratos futuros. No fim de cada mês, agentes financeiros costumam tentar direcioná-la a níveis mais convenientes às suas posições, sejam elas compradas (no sentido de alta das cotações) ou vendidas em dólar (no sentido de baixa).
Nesta sexta a disputa se tornou ainda mais importante já que a Ptax também era a do encerramento do trimestre, que serve de referência para balanços de empresas com operações internacionais.
Neste cenário, após atingir a cotação mínima de 5,5861 reais (+1,41) às 9h01, pouco depois da abertura, o dólar foi puxado pelos investidores comprados e se firmou rapidamente no território positivo -- na contramão do exterior, onde a moeda norte-americana cedia ante as demais divisas de emergentes.
Além da pressão dos comprados, o dólar foi novamente impulsionado pelo mal-estar em torno da situação fiscal e por novas declarações de Lula contra o Banco Central, com Campos Neto também voltando a passar recados ao governo.
No início do dia, Lula afirmou em entrevista à rádio FM O Tempo, de Minas Gerais, que o atual patamar da taxa básica Selic, de 10,50% ao ano, é "irreal" diante de uma inflação que está controlada. Ao tratar do câmbio, disse que o dólar está subindo ante o real porque há "especulação com derivativos".
Por sua vez, após afirmar na véspera que falas recentes de Lula têm impactado negativamente os preços dos ativos, Campos Neto disse no fim da manhã durante evento em Lisboa que ajustes fiscais muito focados em ganho de receita são menos eficientes e podem ter como resultado menor investimento, menor crescimento econômico e inflação mais alta.
Em apresentação repleta de recados sobre o tema fiscal, Campos Neto afirmou ainda que a desconfiança sobre as contas públicas impacta os juros de longo prazo e as expectativas de inflação.
Profissionais ouvidos pela Reuters afirmaram que a disputa verbal entre Lula e Campos Neto azedou mais uma vez os negócios com dólar, juros futuros e ações, fazendo os ativos brasileiros apresentarem resultados piores que os dos demais emergentes.
O dólar à vista atingiu a cotação máxima de 5,60 reais (+1,66%) às 15h47 -- já após o fechamento da Ptax em 5,5583 reais para venda.
Operador ouvido pela Reuters pontuou que os investidores seguiam desconfortáveis com a incapacidade do governo em cortar despesas para fazer o ajuste fiscal e com o futuro do BC após a saída de Campos Neto, programada para dezembro. Em função disso, as cotações permaneceram em patamares elevados, com investidores comprados na moeda norte-americana mantendo posições.
Em evento durante a tarde, em Belo Horizonte, Lula voltou a afirmar que não fará ajuste fiscal “em cima das pessoas mais pobres”.
Enquanto o dólar tinha forte avanço ante o real, no exterior a moeda norte-americana cedia ante divisas como o rand sul-africano, o peso chileno e o peso mexicano. Às 17h24, o índice do dólar -- que mede o desempenho da moeda norte-americana frente a uma cesta de seis divisas -- tinha variação negativa de 0,01%, a 105,880.
Durante evento na tarde desta sexta-feira, o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, afirmou que o tema que chama mais atenção no momento é justamente o câmbio, que deixa o Brasil “bastante descolado” de economias similares e segue de maneira rápida para a desvalorização.
Apesar da pressão, o BC segue cumprindo a promessa de somente intervir no mercado de câmbio em momentos de disfuncionalidade -- e não em função da alta do dólar por si só. Assim, pela manhã a instituição fez apenas sua operação regular de rolagem de swaps, na qual vendeu todos os 12.000 contratos de ofertados para postergar os vencimentos de setembro.