A valorização do peso mexicano fez o dólar recuar aos menores níveis desde 2015 na 6ª feira (5.abr.2024). A alta é registrada em um cenário de preocupação internacional com as taxas de juros futuras e incertezas políticas internacionais.
O dólar fechou a semana a 16,52 pesos mexicanos. Esse foi o menor valor desde 3 de novembro de 2015, quando era 16,40 pesos. O “superpeso” foi beneficiado com a reformulação de rotas comerciais no mundo e outras mudanças feitas no país.
O México tem uma vantagem no processo de reconstrução das cadeias globais. Está ao lado do país mais rico do mundo, os Estados Unidos. A política comercial de “nearshoring” beneficia a atividade comercial com países geograficamente próximos.
O modelo de negócio foi potencializado depois do começo da guerra na Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022. Em 2024, o dólar caiu 2,9%.
POLÍTICA MONETÁRIA
O Banco Central do México aumentou, de fevereiro de 2022 a março de 2023, a taxa de juros em 5,25 p.p (ponto percentual). Ficou em 11,25% ao ano por 1 ano, até ser reduzida para 11% na última reunião, de 21 de março de 2024.
A medida foi tomada para controlar a inflação. O país viu a taxa anualizada subir de 7,28% em fevereiro de 2022 para 8,70% em setembro do mesmo ano.
Atualmente, a inflação acumulada em 12 meses é de 4,4%. O dado é referente a fevereiro.
A autoridade monetária mexicana mantém os juros em patamar elevado mesmo com a inflação já em queda. O movimento explica porque o país tem o maior juro real do mundo, na frente do Brasil.
O México pode estar resistindo em reduzir os juros enquanto não há uma flexibilização monetária nos Estados Unidos. O Fed (Federal Reserve, o Banco Central norte-americano) cobra o intervalo de 5,25% a 5,5% ao ano desde junho de 2023. A taxa de juros mexicana é mais que o dobro dos Estados Unidos.
A ata da última reunião de política monetária no México foi divulgada na 5ª feira (4.abr.2024).
ELEIÇÕES
Leonardo Monoli, sócio e diretor de gestão da Azimut Brasil Wealth Management, disse que o peso mexicano é a moeda com o melhor desempenho no ano. A “chave” para a força é a baixa volatilidade e as taxas de juros, que estão altas no país.
O especialista ponderou que os ganhos estão sendo registrados em 2024 –ano que poderá haver volatilidade com as eleições nos Estados Unidos e no México.
Nos EUA, uma eventual volta do ex-presidente Donald Trump poderá elevar o grau de volatilidade. O republicano defende que imigrantes são “animais” e “envenenam” o país.
No México, o presidente Andrés Manuel López Obrador apoia a ex-prefeita da Cidade do México, Claudia Sheinbaum. Obrador é considerado de esquerda. O diretor de gestão da Azimut Brasil avalia que há um “grau razoável” responsabilidade fiscal durante o governo.
No México, o pleito será em junho. Nos EUA, em novembro.
“Até o momento, o mercado vem levando a moeda a preços cada vez mais fortalecidos. Vem ignorando riscos decorrentes de cortes de taxas de juros e eleições”, disse Monoli.
O analista disse que a cotação elevada do barril do petróleo também contribui para o desempenho favorável da economia mexicana. Na 6ª feira (5.abr) o barril tipo brent estava cotado a quase US$ 92. O México é exportador da commodity.
JUROS NO MÉXICO
Monoli declarou que o Banco Central do México deverá cortar o juro base de forma gradual. O 1º corte, de 0,25 ponto percentual, indica qual será o ritmo para as próximas reuniões. O motivo para isso é a persistência da inflação de serviços mais elevada.
Os juros mais altos favorecem o peso mexicano, uma vez que atrai recursos estrangeiros pela diferença dos juros. Pelas contas do país estarem mais organizadas que os pares emergentes, o investidor vê o México com bom olhos para o aporte dos recursos.
“[O México se beneficia com] Volatilidade baixa, um governo que tem um grau razoável de responsabilidade fiscal, mesmo sendo de esquerda, o preço do petróleo subiu, está colado nos Estados Unidos, está com a economia rodando bem. Tudo isso ajuda bastante”, declarou.
O Brasil, por exemplo, tem um diferencial de taxa de juros menor para oferecer aos investidores. Além disso, a situação fiscal do país é mais delicada com a expansão dos gastos públicos em meio à dívida bruta maior que seus pares. O intervencionismo do governo nas estatais também é um fator que afugenta investimento estrangeiro.
Por esses e outros motivos o México sai na frente do Brasil. O real não teve o mesmo desempenho que o peso mexicano. A moeda brasileira tem se desvalorizado em relação ao dólar.
O peso mexicano é a mais negociada na América Latina e a 3ª mais negociada da América. O diretor de gestão da Azimut Brasil afirmou que o desempenho esperado para os próximos meses dependerá do cenário político. Atualmente, os investidores estão muito expostos e talvez seja necessário se proteger às volatilidades da moeda.
A ata da reunião de política monetária do México demonstra preocupação com a inflação e com uma eventual desvalorização da moeda.
“Os investidores estão muito posicionados na moeda. Se tiverem que se proteger, pode dar um tranco. Por isso que o Banco Central do México já estão sendo preventivos e estão cortando menos os juros”, afirmou Monoli.
“NEARSHORING”
A presença de mexicanos nos EUA, com a facilitação da ida de imigrantes para o país, aumentou a remessa de moeda estrangeira para o México. Monoli afirmou que, mesmo com Trump, a expectativa é de positiva em relação ao país vizinho.
O analista afirmou que um eventual discurso de separação econômica dos EUA com a China deve favorecer o México.
“Eventualmente, a gente pode ter um processo eleitoral nos Estados Unidos e, mesmo com a vitória de Trump, o peso pode não ter um choque tão grande como teve em 2016 [na eleição do republicano]”, declarou.
O economista Fabio Zaclis, gestor de fundos macro e renda fixa da Daycoval Asset, disse que a união entre visibilidade fiscal, endividamento mais controlado e juros reais altos fez o peso mexicano um dos “destinos preferidos de investidores que buscam melhor carrego ajustado ao risco”.
Para o analista, a política do nearshoring é um dos fatores para o desempenho do peso mexicano. “Existem diversos benefícios de ter fronteira com os Estados Unidos, dentre eles a proximidade logística do centro consumidor, a participação em acordos econômicos específicos e o próprio interesse americano de controle de fronteiras. É um país já conhecido do mundo corporativo americano como alternativa competitiva para instalação de indústrias para exportar ao mercado americano”, declarou Zaclis.
Há, porém, outras razões estruturais e outras conjunturais, defendeu. O país se beneficiou das políticas econômicas adotadas durante e depois da pandemia de covid.
“O México, comparado a outros emergentes, como Brasil e África do Sul, fez estímulos fiscais menores no período pandêmico, saindo com endividamento e equilíbrio fiscal mais saudável que os pares. Passado aquele período, fez forte aperto monetário para conter a inflação, chegando a taxas nominais”, disse.
Outro motivo é a forte aceleração da economia norte-americana, com grande entrada de imigrantes na força de trabalho. “Refletiu em recordes de remessas de trabalhadores para suas famílias no México, uma tradicional fonte de fluxo para o país”, declarou Zaclis.
Segundo o gestor de fundos macro e renda fixa da Daycoval Asset, a “aparente sincronia monetária que observamos hoje está ligada a uma origem comum do choque inflacionário originado nas políticas fiscais e monetárias adotadas em larga escala durante a pandemia”.
O especialista declarou que a sincronia do Brasil e México não era comum e, portanto, comparações diretas entre nível de juros, velocidade de aperto ou afrouxamento monetário não são tão diretas.
“Cada Banco Central toma as ações olhando as suas condições de contorno específicas para atingir seus objetivos. O Brasil, por suas particularidades, fez um aperto monetário maior e mais rápido que levou à queda da inflação também antes do que observado no México, possibilitando um início de cortes ainda no meio do ano passado. Acredito que a prudência mexicana está mais ligada à convergência da inflação lá”, disse.