Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou nesta quarta-feira pelo recebimento parcial de denúncia contra o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), uma decisão que se confirmada tornará o deputado réu em ação ligada à Lava Jato.
Pouco antes da leitura do voto do relator, ministro Teori Zavascki, os ministros acertaram que encerrariam a sessão desta quarta tão logo ele concluísse seu voto.
Mas em inesperada movimentação, outros cinco ministros adiantaram seus votos, formando em poucos minutos uma maioria a favor do recebimento da denúncia contra Cunha --seis dos ministros concordaram em levar o presidente da Câmara à condição de réu. A ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ) também teve a denúncia parcialmente recebida pelos ministros.
Cunha é acusado de ter recebido ao menos 5 milhões de dólares em propina relacionada à contratação para o fornecimento de navios-sonda para a Petrobras (SA:PETR4).
Em seu voto como relator, Zavascki decidiu acolher parcialmente a denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que chegou a usar o termo "propinolândia", durante sua sustentação oral no julgamento, para referir-se ao sistema de pagamentos envolvendo o parlamentar e a estatal.
Zavascki entendeu que "nada foi produzido, em termos probatórios" para comprovar uma conduta ilícita de Cunha à época da celebração dos contratos dos navios-sonda.
Admitiu, no entanto, a existência de indícios de recebimento de valores ilícitos, da utilização do mandato para pressionar pelos pagamentos e da prática de lavagem de dinheiro.
O relator decidiu acolher parcialmente a denúncia por entender que há indícios contra o parlamentar somente no segundo momento da denúncia elaborada pela PGR, na pressão que teria sido feita por Cunha, juntamente com a ex-deputada, sobre o delator Júlio Camargo para recebimento de propina.
"A peça acusatória narrou com segurança os fatos em tese delituosos e a conduta dos agentes", disse o relator em seu voto.
"Em suma, a análise dos autos mostra que há indícios robustos para, nestes termos, receber parcialmente a denúncia."
Para o PGR, Cunha teria solicitado e aceitado a promessa de vantagens indevidas para garantir esquema ilícito na estatal, "omitindo-se em interferir ou impedir" contratos dos navios-sonda e também para manter indicados políticos.
O procurador também acusou o presidente da Câmara de ter se utilizado de seu cargo para pressionar pelo pagamento da propina, quando foi interrompido, e de receber ao menos 5 milhões de dólares. Essa parte da acusação também foi acolhida pelo relator.
Segundo a denúncia de Janot, Cunha é acusado de crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em decorrência da contratação, por cerca de 1 bilhão de dólares, de dois navios do consórcio Mitsui-Samsung, da Coreia do Sul, com a intermediação de Camargo, lobista do consórcio.
Uma auditoria contratada pela Petrobras constatou irregularidades no contrato de comissionamento entre Camargo e o consórcio, ocasionando a suspensão dos pagamentos e, em consequência, a interrupção das propinas.
DEFESA
O advogado Antonio Fernando de Souza, que representa o presidente da Câmara, por sua vez, argumentou que não há nada que sustente a denúncia feita pela PGR contra o parlamentar.
Ao se pronunciar durante a sessão desta quarta, o advogado, que é ex-procurador-geral da República, questionou as delações premiadas mencionadas pela PGR na acusação e negou que Cunha tenha recebido os 5 milhões de dólares em propina.
Cunha comentou que Teori afastou "mais da metade" das acusações feitas pela PGR ao acolhê-las apenas parcialmente.
"Lembrando que em 2013 eu me tornei réu e depois fui absolvido por unanimidade. Mesmo se tornar réu, isso não significa que ninguém é condenado, então eu estou absolutamente tranquilo, porque eu estou com a verdade, estou com a inocência", afirmou.
Ainda são necessários os votos de cinco ministros para concluir o julgamento, que terá continuidade na quinta-feira.
Votaram pelo recebimento parcial da denúncia, além de Zavascki, Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber.
O resultado precisa ser proclamado ao final do julgamento. Antes disso, os ministros podem alterar seu posicionamento.
(Com reportagem de Eduardo Simões, em São Paulo)