Por Ricardo Brito e Andre Romani
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) -O Telegram apagou nesta quarta-feira a mensagem enviada a usuários na véspera com críticas ao chamado Projeto de Lei das Fake News, cumprindo determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, e ameaçou deixar o país caso o PL seja aprovado nos termos propostos.
O Telegram também enviou a usuários uma nova mensagem, prevista na decisão de Moraes, com um texto que classifica a ação anterior da empresa como "flagrante e ilícita desinformação".
Direcionada a usuários do aplicativo no Brasil, a mensagem do Telegram impulsionada na terça-feira afirmava que "o Brasil está prestes a aprovar uma lei que irá acabar com a liberdade de expressão" e que daria "ao governo poderes de censura sem supervisão judicial prévia".
Nesta quarta-feira, Moraes determinou que o Telegram apagasse a mensagem em até uma hora após a intimação de representante legal da companhia, e que enviasse um novo texto aos mesmos destinatários.
A mensagem determinada pelo STF, e cumprida pelo Telegram é: "Por determinação do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, a empresa Telegram comunica: A mensagem anterior do Telegram caracterizou FLAGRANTE e ILÍCITA DESINFORMAÇÃO atentatória ao Congresso Nacional, ao Poder Judiciário, ao Estado de Direito e à Democracia Brasileira, pois, fraudulentamente, distorceu a discussão e os debates sobre a regulação dos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada (PL 2630), na tentativa de induzir e instigar os usuários à coagir os parlamentares."
A empresa ainda enviou aos usuários uma introdução breve, na qual explica que o envio da nova mensagem, assim como a remoção da anterior, deveu-se à decisão do STF.
Caso as medidas não fossem cumpridas, Moraes determinara a suspensão do aplicativo de mensagens no país por 72 horas e multa de 500 mil reais por hora.
Procurado, o Telegram afirmou em comunicado enviado à Reuters que, após análise, concluiu que provavelmente não conseguiria continuar funcionando no Brasil caso a lei seja aprovada com a redação proposta e que "os usuários merecem saber dessa possibilidade e do raciocínio" da companhia.
A empresa disse que embora tenha cumprido a decisão do STF, "mantém sua análise e acredita que as leis que afetarão a vida de dezenas de milhões de pessoas exigem atenção pública e um período razoável de debate".
A mensagem impulsionada pelo Telegram na terça-feira ocorreu cerca de uma semana após outras empresas usarem suas plataformas para publicar conteúdo contrário ao projeto, provocando reações do governo, do Judiciário e de parlamentares. O PL, que estava pautado para o dia 2 de maio no plenário da Câmara, teve sua votação adiada pelos deputados na última semana.
NOTIFICAÇÃO DA SENACON
Também nesta quarta-feira, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, disse que notificou o Telegram para averiguar se houve violação de diretos do consumidor no disparo da mensagem.
Além disso, comissões da Câmara dos Deputados aprovaram requerimentos para que executivos de Meta, Telegram, Twitter, Spotify (NYSE:SPOT) e Google (NASDAQ:GOOGL) prestem esclarecimentos em audiência pública na Casa, segundo as assessorias dos deputados Ivan Valente e Luiza Erundina, do PSOL de São Paulo, autores das peças. Os requerimentos passaram pelas comissões de Defesa do Consumidor e Comunicação.
Valente afirmou em comunicado que a medida visa "explicações sobre o abuso de poder econômico nas campanhas contra PL das fake news", acrescentando que "as big techs têm muito o que explicar", em referência ao nome dado em inglês a essas grandes companhias de tecnologia.
O parecer do projeto da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência, conhecida como PL das Fake News, propõe responsabilizar as plataformas por conteúdos divulgados, em uma guinada em relação à norma atual, regida pelo Marco Civil da Internet.
Apesar de estar em tramitação há anos na Câmara, o projeto tornou-se uma espécie de teste para o governo na Casa diante do empenho do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, no apoio à iniciativa.
Dino disse em post em redes sociais que a decisão de Moraes sobre o Telegram nesta quarta-feira "é um passo importante para fixação de balizas regulatórias a tais empresas".
Na decisão de Moraes, também consta determinação para que a Polícia Federal (PF) colha o depoimento dos representantes legais do Telegram no Brasil em até 48 horas. Segundo Dino, a PF dará cumprimento imediato à decisão.
Paralelamente à iniciativa do Legislativo, a presidente do STF, Rosa Weber, marcou para 17 de maio o julgamento no plenário da corte de uma ação que questiona pontos do novo Marco Civil da Internet, o que também pode resultar em uma nova regulamentação para o setor.
(Por Ricardo Brito, em Brasília, e André Romani, em São PauloEdição de Pedro Fonseca e Maria Carolina Marcello)