O CEO da Multiplan (BVMF:MULT3), Eduardo Kaminitz Peres, 53 anos, disse ao Poder360 que a empresa pretende investir R$ 1,5 bilhão nos próximos 2 anos na expansão de 7 dos seus 20 shoppings. A esse valor se somam outros R$ 400 milhões que serão investidos já em 2024 na melhoria das estruturas atuais.
“A gente escolheu crescer por expansões. Elas nos trouxeram até aqui. Nesse caminho, você complementa o que o shopping não tem e ganha um público extra. A parte antiga também recebe o novo público. O efeito sinérgico é muito forte”, afirmou Eduardo, que assumiu o comando da Multiplan em fevereiro de 2023, sucedendo a seu pai, o carioca José Isaac Peres, 83 anos.
Os empreendimentos que serão expandidos estão em Brasília (DF), Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG), Jundiaí (SP), Maceió (AL), São Caetano do Sul (SP) e São Paulo (SP).
É comum no noticiário de negócios a Multiplan ser citada como empresa interessada em comprar outros shoppings ou em alguma operação de fusão. Eduardo Peres diz que não parou de olhar oportunidades no mercado, inclusive terrenos para começar a construir algum novo empreendimento “a partir do zero”. Mas afirma que nos próximos 2 ou 3 anos a prioridade será melhorar e expandir os atuais 20 shoppings que já estão em funcionamento.
Sobre concorrência do comércio digital, diz não ver uma ameaça. Mas faz uma ressalva sobre o caso das importações de até US$ 50 que entram no Brasil sem imposto federal: “Tem que tributar. Não se pode competir com alguém que está fora daqui e sabe-se lá como é produzida sua mercadoria, que tipo de trabalho usa, como é, onde é, que legitimidade tem para fazer o que faz. Aqui, somos megafiscalizados. Sendo bem contundente: é desleal”.
O investimento será feito apesar das preocupações que o empresário tem com a reforma tributária. Segundo ele, a ideia de simplificar é boa. Mas, até o momento, não há clareza do que será aprovado com as leis complementares que serão editadas para definir quais setores terão alíquotas diferenciadas.
“O que traz insegurança é o desconhecido. A proposta de você mudar todos os impostos de um país não é simples. Ainda volta para a Câmara, terá lei complementar. Mas isso coloca uma dúvida na cabeça de muita gente, inclusive os investidores internacionais. Você para para pensar e diz que vai esperar para ver o que será do imposto para decidir se vai ou não investir. Qual a regra? Vai mudar? Isso é um ponto negativo”, declarou.
Indagado sobre razões para estar otimista, Eduardo Peres relatou que em recente reunião do conselho da Multiplan ouviu uma notícia positiva: “Temos um sócio importante, que é o fundo de pensão dos professores de Ontário [no Canadá]. O único emergente que ficou no portfólio deles é o Brasil. Descartaram vários países. Na conversa, disseram que o Brasil é o único país emergente em evidência hoje. Se é porque os outros afundaram e a gente despontou, não sei. Mas eu estou animado e satisfeito”.
A Multiplan é uma empresa brasileira criada em 1975 por José Isaac Peres. Hoje, é o maior grupo de shopping centers da América Latina. Tem mais de 80.000 funcionários e registrou faturamento de R$ 20 bilhões em 2022.
Peres é judeu. Na entrevista ao Poder360, criticou quem apoia o Hamas, grupo extremista que atacou Israel em 7 de outubro deixando ao menos 1.400 mortos, sobretudo civis. Preferiu não comentar sobre a reação israelense. Segundo ele, é “lamentável” que pessoas atribuam a Israel a causa do ataque.
“O que foi feito com Israel não tem precedentes. Aí começam a relativizar, pelo amor de Deus. Não tem como relativizar o mal”, disse ele, que em 7 de outubro estava na França e achou apropriada a reação do governo francês ao se solidarizar com Israel. Eduardo Peres não comenta a reação inicial do governo brasileiro.
O CEO esteve em Brasília na 4ª feira (9.nov.2023). Participou da cerimônia em comemoração aos 40 anos do ParkShopping, um dos mais antigos do grupo. O ex-presidente Michel Temer (MDB), o governador de Brasília, Ibaneis Rocha (MDB), e outras autoridades estavam presentes ao evento.
Peres raramente fala com a imprensa. Conversou com o Poder360 um pouco antes das festividades pelos 40 anos do ParkShopping, quando uma parte do local foi reservada para convidados assistirem a um show da banda brasiliense Capital Inicial. A seguir, trechos da entrevista:
Poder360 – A Multiplan inaugurou o ParkShopping há 40 anos. Qual a importância deste empreendimento para a empresa?
Eduardo Kaminitz Peres – O ParkShopping é um dos alicerces da Multiplan, um dos primeiros shoppings que construímos na década de [19]80. Os 5 primeiros [shoppings] dizemos que são as fortalezas da Multiplan. E ele não é só emblemático, responde por boa parte da receita da empresa. É uma rua de comércio de 40 anos.
Quanto o Park Shopping representa do faturamento da Multiplan?
Em torno de 20% do total.
É o mais rentável?
Não. São o Barra Shopping [RJ] e o Morumbi Shopping [SP]. Só o Barra gera R$ 460 milhões por ano. Sozinho é uma empresa grande. No ParkShopping, são 11 milhões de visitantes por ano.
Que tipo de melhorias o Park Shopping teve de ter para continuar atraindo público?
Acabamos de colocar em funcionamento uma tecnologia que é o “free flow”, a entrada sem cancela dos automóveis no estacionamento. A cobrança se dá pela leitura de placa dos carros.
Eu me incomodava com a antena que ora pegava na cancela, ora não. Se um carro não consegue passar com facilidade, cria um problema para entrar. Na minha cabeça, uma pessoa não pode ter nenhum impeditivo para vir aqui.
Achamos a solução ideal. Ao entrar, a placa é lida automaticamente. Depois, pode ter pagamento automático por meio de um aplicativo e o valor fica, nesse caso, 20% mais barato –um incentivo para que todos usem o app. Ou, se quiser, ainda é possível pagar dentro do shopping. Foi o primeiro shopping no qual instalamos o sistema.
E para a Brasília, qual a relevância?
Quando construímos o empreendimento, só existia [em Brasília] o Conjunto Nacional, que não tinha pegada de shopping. Era mais um centro comercial. Aqui tem lazer, arquitetura arrojada, a claraboia é gigantesca. E isso foi em 1983. O brasiliense, quando fala de shopping, fala do ParkShopping. Tem vários em Brasília. Não estou dizendo que sejamos os melhores. Mas a referência é essa. Foi o 1º a agregar entretenimento. O 1º Multiplex de cinema foi aqui. Hoje, tem 60.000 m2 e 400 lojas. Vai para 78.000 e mais 60 lojas.
Quando a expansão fica pronta?
Quero acreditar que conseguiremos aprovar e começar a construir ao longo do ano que vem. Tem todo um processo. Temos uma pré-aprovação, um sinal verde para continuar a entregar documentos.
A Multiplan, assim como todo o setor de shoppings, perdeu muito na pandemia. Já se recuperou?
Muito. Estamos muito acima de antes da pandemia. Vou te dar números: estamos 40% acima de 2019.
A que o senhor atribui esse crescimento?
Vou te dizer meu sentimento. É difícil descobrir o que sente cada pessoa. Para mim, todo mundo que se aproxima da morte, muda. Eu tive a infeliz tarefa de mandar mais de 10.000 pessoas embora na pandemia do dia para a noite. Como no Carnaval [de 2020] eu estava percebendo o que estava acontecendo lá fora, vi que a covid tinha vindo para ficar. Fechamos os shoppings todos. Eu evitava passar em frente ao Barra Shopping, e moro lá do lado, para evitar a depressão. Ninguém sabia o que podia acontecer. Depois, as pessoas ficarem felizes de tomar uma vacina… Como o mundo mudou. Agora, as pessoas têm sede, ânsia de viver. Tanto é que a experiência e as operações que entregam lazer e diversão cresceram absurdamente. As pessoas não querem deixar para amanhã.
As vagas cortadas já foram repostas?
Foram mais do que repostas. Temos mais do que antes. Passamos 1 ano nos recuperando, com investimento zero. Depois de fechar, voltamos a operar só por 4 horas ao dia. Ficamos assim quase 1 ano. Cinemas abriram muito depois. Tivemos que vender um prédio em São Paulo. Não estava nos planos.
O IPTU foi cobrado dos shoppings no período em que ficaram fechados?
Todos os impostos. Agora, voltamos a investir como no [período] pré-pandemia. Ano que vem estamos pensando em passar do bilhão de reais em investimentos.
Olhando em retrospecto, as medidas adotadas durante a pandemia foram em parte equivocadas?
Acho que sim. Se você espreme o horário de funcionamento, tem mais gente junto. Não fazia sentido. Sem querer fazer crítica a A, B ou C, todo mundo estava perdido. Inclusive quem tocava as cidades. Imagina a vida de um governante. Um copiava o que o outro fazia. Tinha lugar que a gente abria um dia e o outro não. Não existiu um teste mais difícil do que a pandemia.
Nos 50 anos de existência da Multiplan, foi o momento mais difícil?
Sem dúvida. Estou na Multiplan há 35 anos. Foi o mais difícil. Paramos de funcionar. Podemos ter crises, mas não parar. É como um avião que perdeu os 4 motores.
Como está a concorrência em Brasília? O Iguatemi (BVMF:IGTA3) tem uma unidade na cidade.
Acho que é outra proposta. São muitas lojas de luxo, algo mais elitizado. Gosto de dizer que o ParkShopping é mais democrático. Temos tudo para todos e queremos continuar assim. Querer ser o maior traz a pergunta: maior em comparação ao quê? Você perde o referencial. Por outro lado, ninguém pode te impedir de ser o melhor naquilo que você faz todo dia. Podem entrar no shopping e dizer que está tudo bonito, mas eu só fico vendo defeito. É uma vontade de sempre entregar mais.
Qual a perspectiva para o ano que vem?
A gente escolheu crescer por expansões. Elas nos trouxeram até aqui. O ParkShopping vai para a 11ª expansão. Nesse caminho, você complementa o que o shopping não tem e ganha um público extra. A parte antiga também recebe o novo público. O efeito sinérgico é muito forte. Não parei de olhar terreno para construir do zero, não parei de olhar ativos à venda. Mas hoje o que se mostra mais rentável e que faz mais sentido são as expansões. Esse é o futuro próximo, de 2 ou 3 anos.
Quantas expansões serão feitas nesse prazo?
Serão 7: Brasília, São Paulo, Maceió, São Caetano do Sul, Jundiaí, Minas Gerais e Curitiba.
Quantos metros serão adicionados aos shoppings?
No total, 80.000 m2.
E qual o investimento?
Aproximadamente R$ 1,5 bilhão.
No ano que vem será quanto desse valor?
Será R$ 1 bilhão. Vamos terminar duas expansões. A do Barigui [em Curitiba] é um andar inteiro novo. São 180 lojas. Só ela são R$ 300 milhões. No ano que vem, começaremos o Morumbi. Já temos licença. Aqui em Brasília eu espero conseguir começar a construir até o fim do ano. E também em Maceió.
O sr. demonstra muito otimismo. É isso mesmo?
Não dá para andar para trás. A melhor defesa da Multiplan é investir no que ela já tem, melhorar o ativo. Os investidores ficam ligados em M&A [sigla em inglês para fusões e aquisições], perguntando se vai comprar um ou outro. Não preciso comprar ninguém para ser alguém. Já somos uma empresa grande e importante estabelecida. Vou continuar construindo. A estratégia de crescer pela expansão é o que está mais próximo, mais óbvio e é o que você controla. Se você quer comprar, tem contrato, preço… não depende de você. Mas a expansão, sim. Vamos gastar aproximadamente R$ 400 milhões só na melhoria dos empreendimentos.
Então será R$ 1,5 bilhão na expansão e R$ 400 milhões na melhoria?
Sim, em 2 anos. E talvez mais.
Como o comércio eletrônico afeta a venda presencial nos shoppings?
Você não vem para o shopping comprar aquilo que você consegue comprar na internet. Vem para se divertir, viver, ver as pessoas, passear, tomar um café, almoçar, trazer a família, seu filho que quer ir na HotZone [ambiente de jogos eletrônicos do ParkShopping]. É um conjunto. Fugimos do modelo compra, compra, compra. Tenta comprar um tênis na internet. É ruim. Fui maratonista e usava sempre o mesmo tênis. Às vezes, só mudando a cor do modelo, muda o tamanho. Tem que testar antes. Faz sentido comprar na internet se você mora em um lugar que faz um frio danado e você não quer sair de casa. Mas, no Brasil, as pessoas querem se ver. É o país do Carnaval, do calor humano. Somos meio a meio. Metade experiência, metade compra. Não percebo queda grande pelo e-commerce. Você compra pela internet aquilo que você não tem prazer em comprar.
E a concorrência do comércio digital do exterior, sobretudo o chinês?
Não faz sentido a isenção de impostos [compras vindas do exterior com valor de até US$ 50 não tem incidência de imposto federal]. Que emprego eles geram aqui? A isenção é muito nociva ao comércio do país inteiro.
Como resolver?
Tem que tributar. Não se pode competir com alguém que está fora daqui e sabe-se lá como é produzida sua mercadoria, que tipo de trabalho usa, como é, onde é, que legitimidade tem para fazer o que faz. Aqui, somos megafiscalizados. Sendo bem contundente: é desleal.
Como foi até agora o 1º ano da administração Lula?
A gente está otimista. Não consigo tecer comentários se o governo fez bem ou mal. Nem gosto de ter uma posição política porque acho que isso não tem nada a ver com o que a gente faz. Vejo que o país segue consumindo, crescendo.
Tem exemplos que justifiquem seu otimismo?
Acabei de vir da reunião do conselho da Multiplan. Temos um sócio importante, que é o fundo de pensão dos professores de Ontário [no Canadá]. O único emergente que ficou no portfólio deles é o Brasil. Descartaram vários países.
Descartaram quem?
Todos os outros emergentes. Escolhe um. Só ficou o Brasil. Na conversa, disseram que o Brasil é o único país emergente em evidência hoje. Se é porque os outros afundaram e a gente despontou, não sei. Mas eu estou animado e satisfeito.
A economia brasileira está sendo bem manejada?
Sim.
E as reformas, sobretudo a tributária?
Pelo menos no meu setor, o que mais traz insegurança é o desconhecido. E a proposta de você mudar todos os impostos de um país não é simples. Ainda volta para a Câmara, terá lei complementar. Mas isso coloca uma dúvida na cabeça de muita gente, inclusive os investidores internacionais. Você para para pensar, espera para ver o que será do imposto e só então decide se vai ou não investir. Qual a regra? Vai mudar? Isso é um ponto negativo.
Tem algum ponto no texto da reforma tributária aprovado pelo Senado que preocupa mais?
É preciso que tenham muito cuidado quando falam em ter um IVA de 27,5% ou 28%. Imagino que terão o cuidado de olhar cada categoria de forma diferente. Cada uma tem uma capacidade de pagar impostos. Comércio é uma, indústria é outra. São pontos de preocupação.
É um problema de comunicação?
Não sei dizer. O tema é difícil. A proposta é bastante arrojada. Não me lembro de uma reforma tributária como estão propondo. É uma mudança muito brusca. Sei que será feita aos poucos. Mas preocupa.
Se for aprovada neste ano, os investidores darão uma pausa?
Depende do que for aprovado. Este ano ficamos na dúvida. Vamos ver o que vai sair. Para o lojista, a dúvida é se o Simples vai continuar, se muda o lucro presumido. O pessoal dos restaurantes me disse que se tiverem que pagar 27,5% em uma conta e não houver compensação, param de funcionar. Não tem margem. Não julgo o governo Lula até porque está no 1º ano. Por enquanto, está indo bem. Mas o tema é abrangente. Mexer numa cadeia que há anos está funcionando, com jurisprudência montada, é complexo. Vai ter que começar do zero.
O que se fala sobre o eventual benefício da reforma tributária é a simplificação do futuro sistema.
Tomara que seja e que aconteça. Acho que estamos em um momento de muita dúvida. Se nem os jornalistas conseguem dizer direito o que vai ser, imagina o empresário? Convivemos com o assunto este ano e vamos ver como será realidade no ano que vem. Pelo que entendo, vão discutir setor por setor. Tem mais 1 ano e será ano de eleição.
Será um ano de crescimento?
Para a Multiplan, sim.
E para o país?
Espero que sim. A gente só se beneficia se o país crescer como um todo. Não conseguimos crescer sozinhos. Não somos uma ilha de prosperidade em meio ao caos.
Qual é a sua avaliação sobre a guerra no Oriente Médio?
É lamentável que alguém possa apoiar um grupo extremista e terrorista. Não consigo aceitar isso.
E a posição do governo com relação à guerra?
O governo pode ter a reação que quiser. Eu me sinto mal. Não entendo que qualquer pessoa possa, e não quero personificar no governo, apoiar o grupo terrorista que fez o que fez o Hamas contra Israel e ainda dizer que Israel foi culpado pela agressão que sofreu. Isso eu não concordo. É lamentável. O que foi feito com Israel não tem precedentes. Aí começam a relativizar. Pelo amor de Deus. Não tem como relativizar o mal. Tem mais de 200 pessoas lá que são reféns. É um absurdo.
O que o Brasil poderia fazer?
Não sei. Como judeu, sinto muita tristeza. Quando estourou a guerra, estava na França. E o governo francês se colocou ao lado de Israel. O governo brasileiro tomou outro caminho.