Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - As safras de soja e milho do Brasil podem surpreender positivamente, apesar dos problemas climáticos iniciais na temporada 2023/24, e a expectativa é de um segundo semestre movimentado nas exportações de grãos, avaliou o presidente da Cargill no país, Paulo Sousa, em entrevista à Reuters.
Por ocasião da divulgação dos resultados da empresa em 2023, quando a companhia registrou lucros e investimentos recordes no Brasil, Sousa avaliou que as revisões na safra brasileira de soja de agora em diante deverão ser feitas para cima, à medida que os resultados de áreas mais tardias, como Rio Grande do Sul e Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), têm sido positivos.
"Nós não reportamos números de safra, mas a visão nossa é que a safra de soja não é tão pior que a do ano passado, porque tivemos problema no começo, em Mato Grosso, mas Matopiba está tendo uma safra muito boa", disse ele.
"Então há outras regiões que compensam essa quebra que teve em Mato Grosso. Essa é a nossa visão", disse ele.
Pela última estimativa da estatal Conab, a produção em 2023/24 está estimada em 146,52 milhões de toneladas de soja, decréscimo de 5,2% frente ao recorde do ciclo anterior.
No caso do milho segunda safra do Brasil, que responde por cerca de 75% da colheita do cereal no país, a expectativa também é favorável, ainda que abaixo dos patamares históricos após um recuo na área plantada.
"A safrinha não é recorde como no ano passado, mas é muito boa, e tem uma expectativa de um segundo semestre de logística cheia, tanto soja quanto milho sendo exportados", afirmou Sousa, evitando fazer projeções de volumes da exportação.
A produtividade da segunda safra ainda depende das condições climáticas até a colheita, que normalmente começa entre o final de maio e início de junho, em Mato Grosso. O Estado geralmente responde pela maior parte da exportação de milho, que ganha força no segundo semestre no país.
No ano passado, o Brasil exportou mais de 100 milhões de toneladas de soja pela primeira vez, com 101,37 milhões de toneladas, alta de 30% ante 2022, segundo dados da associação de exportadores (Anec). No caso do milho, os embarques do país avançaram 24,6% em 2023, para 55,7 milhões de toneladas.
Essa grande movimentação ajudou nos resultados da unidade brasileira Cargill. A companhia elevou em 10 milhões de toneladas o total de produtos originados, processados e comercializados de 2022 para 2023, para cerca de 51 milhões de toneladas, principalmente com maiores volumes de soja e milho. Em termos percentuais, a alta anual foi de mais de 24%.
LUCRO RECORDE
A Cargill registrou lucro líquido recorde de 2,5 bilhões de reais em 2023 no Brasil, alta de 101% ante 2022, com a unidade brasileira sendo beneficiada por preços mais altos de commodities agrícolas, além de margens recordes no processamento da soja, impulsionadas pela quebra da safra da Argentina.
Os problemas no país vizinho, tradicionalmente o maior exportador de óleo e farelo de soja, trouxeram uma demanda adicional ao Brasil no ano passado, lembrou Sousa.
"Com muito orgulho anunciamos o lucro recorde da Cargill no Brasil, marcando nossos 59 anos de presença no Brasil."
Já o investimento da multinacional no Brasil somou 2,6 bilhões de reais em 2023, alta anual de 116%, com aquisições de processadoras de soja e unidades de biodiesel, afirmou o executivo.
A empresa com sede nos Estados Unidos concluiu em dezembro a aquisição de três plantas de esmagamento de soja e produção de biodiesel no Brasil que anteriormente pertenciam à Granol.
A Cargill citou em relatório que possui agora 29 fábricas, 75 armazéns, sete terminais portuários, dois centros de inovação, cinco centros de distribuição, além de 14 escritórios comerciais no país. A empresa conta com 13 mil funcionários no Brasil.
2024 MAIS BAIXO
Para 2024, a Cargill projeta lucros e investimentos mais baixos no Brasil, uma vez que não estará presente uma conjunção de fatores impulsionadores dos números de 2023, disse Sousa, pontuando que o negócio da empresa é "cíclico e sazonal".
O executivo não revelou metas, mas disse que as margens de esmagamento caíram pela metade no Brasil em 2024 em relação às máximas de 2023, com a recuperação esperada da safra da Argentina e preços mais baixos das commodities agrícolas.
Em relação aos investimentos para este ano, o presidente da Cargill disse que há "aquisições em vista", mas não serão tão grandes quanto as realizadas em 2023, quando as processadoras de soja adquiridas foram incluídas.
"Já fizemos aquisições neste ano calendário... compramos lá um negócio de nutrição de suínos do Paraná... Temos outras aquisições de impacto sendo trabalhadas, mas não tem expectativa de que se materialize neste ano."
Sousa comentou também que os investimentos da Cargill têm uma visão de longo prazo. E que anos de recordes, como 2023, são muito bem-vindos, mas não devem guiar o planejamento, já que o negócio da empresa é cíclico.
Para o executivo, a demanda pelos produtos agrícolas não caiu em 2024 ante 2023, mas há a Argentina com uma produção que deve ser o dobro do ano passado, o que se reflete em preços dos produtos mais baixos e nas vendas dos produtores brasileiros, que estão mais lentas.
"Então, por isso, margem ainda está historicamente boa, mas é metade do ano passado. Esse principal motor do lucro recorde no ano passado não está presente este ano, infelizmente."
O presidente da Cargill no país disse que a companhia trabalha com fornecedores "sólidos", que têm honrado contratos apesar da rentabilidade menor, mas reafirmou que o setor acompanha com preocupação um aumento de inadimplência e do uso do instrumento da recuperação judicial por aqueles agricultores atingidos por preços mais baixos e menor rentabilidade.
(Por Roberto Samora)