Por Leandro Manzoni
Investing.com - Não é somente a queda da taxa de juros à mínima histórica que vai impulsionar o Ibovespa em 2020. A consolidação do retorno do crescimento econômico no Brasil é a chave para que o principal índice acionário brasileiro continue sua tendência de alta em 2020, após se valorizar 31,58% no ano passado. Essa é a avaliação de Alexandre Silverio, CIO da gestora de recursos AZ Quest Investimentos, em entrevista ao Investing.com, sem estimar a pontuação do Ibovespa no final deste ano.
“Acho que nunca estive tão otimista em 25 anos de carreira’, afirma o gestor, que aponta o otimismo com os cenários macro e microeconômico para fundamentar sua perspectiva positiva para o Ibovespa neste ano, além da diversificação do portfólio dos investidores em busca de ativos de risco na renda variável em um cenário com remuneração baixa dos ativos de renda fixa graças à Selic a 4,5% ao ano.
Além disso, a volta do dinamismo econômico pode trazer ventos favoráveis que podem retroalimentar o apetite ao risco na bolsa paulista, como um possível retorno dos estrangeiros à B3.
Confira abaixo os principais trechos da conversa com o gestor, que também aborda o estado das empresas neste momento de retomada econômica, as oportunidades, os riscos, a política e avanço das reformas no Congresso.
Macroeconomia
Silverio traça um paralelo da situação macroeconômica brasileira nos últimos 25 anos com a sua carreira. A análise é para justificar seu otimismo para agregar ao diagnóstico consensual de que o Ibovespa vai continuar em alta com a retomada do crescimento, inflação baixa e taxa básica de juros na mínima histórica.“Olhando apenas para a parte econômica, o país se desenvolveu neste período”, afirma o gestor, ressaltando que o progresso veio em uma velocidade abaixo do desejado.
Nesta avaliação, ele fala do sucesso do Plano Real em estabilizar a inflação nos anos 1990 e da forte distribuição de renda na década de 2000, embora esta última situação foi baseada em um cenário externo favorável com o crescente preço das commodities no período. Silverio também lembra do aumento das reservas internacionais nos anos 2000, que levou o Brasil a se tornar credor líquido externo e, assim, diminuiu o risco de crise cambial.
O último pilar do avanço macroeconômico é a estabilização fiscal após a implementação de uma política econômica liberal em 2016, legitimada pelo resultado das eleições de 2018. A aprovação da reforma da Previdência no ano passado diminuiu o risco fiscal, que havia aumentado após anos de incerteza econômica e expansão fiscal.“O Brasil está pronto para decolar”, diz Silverio, cuja análise que combina ajuste estrutural com conjuntura favorável com baixa taxa de juros aponta para uma previsão de expansão de 2,5% do PIB, com viés de alta. “É difícil fazer estimativa, acho a tendência mais importante, pois vamos sair de um crescimento de 1,2% em 2019 para algo acima de 2%, 2,5%. Isso me deixa otimista caso haja uma surpresa”, ressalta.
Em relação à Selic, a AZ Quest prevê mais dois cortes de 0,25 ponto percentual nas reuniões de fevereiro e março, encerrando 2020 a 4% ao ano. Já a inflação deve encerrar 2020 a 3,7%.
Riscos
“O maior risco é o risco externo, de alguma crise”, menciona caso a possibilidade de a previsão do crescimento econômico não se concretizar. Apesar de a primeira fase do acordo comercial entre EUA e China esteja prestes a ser assinada, segundo autoridades americanas e a imprensa chinesa ligada ao Partido Comunista, Silverio não crê em uma interrupção da disputa comercial entre as duas maiores economias do mundo.
“É uma questão geopolítica que vai durar muito tempo”, afirma o gestor, que lembra que 2020 é ano de eleições presidenciais nos EUA e da saída do Reino Unido da União Europeia, embora neste último caso as incertezas diminuíram graças à vitória com ampla margem de votos do Partido Conservador liderado pelo primeiro-ministro Boris Johnson, que é favorável à saída do país do bloco econômico no fim de janeiro.
Saúde das empresas
O cenário microeconômico também é otimista. “Há uns 2 anos que a AZ Quest vê que as empresas têm o que chamamos de dupla alavancagem”, diz sobre aspectos favoráveis dos balanços operacional e financeiro das empresas.Na parte operacional, as empresas durante os anos da crise econômica diminuíram produção e a folha salarial para melhorar parte da margem. “Quando a economia começa a acelerar, a empresa consegue alavancar seus resultados”, afirma.Do lado financeiro, a queda da taxa básica de juros proporcionou aumento da disponibilidade do crédito. Assim, muitas empresas alongaram suas dívidas a uma taxa de juros baixa e podem financiar em condições favoráveis seus investimentos.Maiores oportunidades na bolsa
Os setores que vão apresentar melhor performance em 2020 não diferem do resultado de 2019. Silverio aposta na valorização de empresas ligadas aos setores de educação, saúde, logística, serviços financeiros e construção civil, sem revelar detalhes da carteira da AZ Quest.
“Esses setores estão sob uma perspectiva clara de manter crescimento de lucros mais altos em relação ao restante da bolsa”, avalia o gestor, ressaltando que os lucros de empresas desses setores devem vir acima do PIB.
Setores menos favoráveis
“Não acho que haja um setor que seja claramente ruim”, diz Silverio. Na sua avaliação, há setores que serão menos favorecidos com o cenário macro e microeconômico da AZ Quest. O gestor destaca que os setores exportadores podem ter uma performance menos animadoras em relação a empresas de outros setores, pois são dependentes de fatores externo, como: desdobramentos da guerra comercial, do crescimento global e o preço das commodities.
Política e Reformas
Com pouca divergência, a pauta econômica é defendida pela equipe econômica pela grande maioria dos congressistas. “Esse alinhamento ao longo de 2019 tende a ser a tônica de 2020”, projeta.
Na avaliação de Silverio, não existe indicativo de que outras pautas com divergência entre Presidência da República e Congresso atrapalharão o andamento das principais pautas econômicas, entre os quais a reforma administrativa e o encaminhamento da reforma tributária, além das concessões e privatizações.
“A reforma administrativa deve ser aprovada, mas ainda tem alguns pontos de ajustes. A tributária é mais complexa, acho que vai andar, mas não sei se é capaz de ter uma aprovação no final do ano”, projeta.
Concessões e Privatizações
A diminuição da presença do Estado na economia deve continuar em 2020, com aumento do ritmo de leilões de concessões de infraestrutura rodoviária, ferroviária e aeroportuária. “Mas não esperamos uma privatização icônica”, aposta o gestor em relação à venda de uma estatal relevante. “Pode aparecer uma venda de fatias de estatais, como as participações que o BNDES tem”, prossegue.
Mesmo assim, Silverio não vê grande resistência do Congresso e da sociedade quanto à venda de empresas estatais. “Tivemos uma privatização este ano, da BR Distribuidora (SA:BRDT3), e claramente não houve grande questionamento”, avalia sobre a diminuição da participação da Petrobras (SA:PETR4) na empresa distribuidora de combustíveis, por um processo de pulverização em bolsa, em que a estatal petrolífera deixou de ser majoritária. “Além disso, o preço atingido foi favorável pela Petrobras”, diz.
Estrangeiros na bolsa em 2020
“Essa é uma pergunta que vale muito dinheiro”, responde Silverio imediatamente após a pergunta sobre o possível retorno dos estrangeiros na B3. No ano passado, os investidores estrangeiros tiveram saída líquida de R$ 43 bilhões até o pregão de 26 de dezembro no mercado secundário, desconsiderando participações em IPOs e follow-ons.
“A impressão que o mundo tem do Brasil, principalmente Europa e EUA de alguma maneira, não é boa”, avalia o gestor. Na sua percepção, a consolidação da retomada do crescimento econômico pode derrubar a percepção negativa do investidor estrangeiro em relação ao Brasil.
LEIA MAIS: ‘A festa é boa, mas a festa é nossa’: Para Ilan Goldfajn, estrangeiros não virão
Silverio ressalta a forte entrada de Investimento Estrangeiro Direto (IED) na economia brasileira como contraponto a saída de investidores portfólio. “O Brasil é um país estratégico, quinto ou sexto de maior mercado do mundo de vários produtos ou indústria, o que reforça a necessidade de estar no Brasil”, acrescenta.
Em 2019, o Brasil registrou a entrada líquida de US$ 69,1 bilhões em IED até novembro, um pouco abaixo dos US$ 69,9 bilhões registrados nos 11 primeiros meses de 2018. Os dados são do Banco Central sob o termo Investimento Direto Produtivo (IDP)