Por Ana Julia Mezzadri
Investing.com - Há exatos cinco anos, 195 países se reuniam para aprovar o Acordo de Paris, que desenhou uma série de medidas para reduzir o aquecimento global. Após um número mínimo de países assinarem o acordo, muito foi feito desde a entrada em vigor em 4 de novembro de 2016.
No Brasil, 2020 foi um ano importante para o ESG, sigla para Environmental, Social and Governance ("ambiental, social e governança”, em tradução livre), que são critérios de conduta para empresas.
O ano começou com “um impulso no coração do capitalismo”, nas palavras de Celso Lemme, professor da Coppead: na abertura do World Economic Forum foi apresentada uma série de estudos sobre o tema, como um mostrando as conexões entre as questões ambientais e o desempenho econômico e financeiro das empresas e outro sobre as métricas para monitorar desempenho ambiental e social nos mais diversos setores de negócios, lembra o professor.
O tema, que há muito tempo está em voga na academia e entre um público mais preocupado com essas questões, finalmente chegou de vez aos mercados. Maurício Lima, gerente de produtos da Western Asset, diz perceber isso na prática: “O interesse dos investidores, não só pessoa física, mas mesmo institucionais, tem crescido. Eles têm se mostrado mais interessados no assunto, têm questionado nossa abordagem ao ESG”, relata.
O forte avanço em 2020, segundo Lemme, veio da uma convergência dessas fortes manifestações do setor econômico e financeiro tradicional com o aumento gradativo da pressão dos consumidores, dos investidores e da regulação pública sobre as empresas.
Para além dos analistas e investidores, também as empresas têm sentido um aumento de pressão para agir.
“O investidor está preocupado com a última linha, mas não só. Ele quer saber como a empresa está obtendo essa última linha. É a um custo ambiental muito alto? A um custo social muito alto? Sem ética, sem transparência? Isso não cabe mais nas empresas hoje em dia”, diz Raphael Lafetá, diretor executivo de Relações Institucionais e de Sustentabilidade da MRV (SA:MRVE3).
Para além da implicação, mais óbvia, de que o tema agora faz parte dos critérios de escolha de investimentos, a pressão, segundo Celso Lemme, também vem sendo feita de outra forma: “Muitos fundos e grandes investidores têm assentos nos conselhos das empresas. Então eles podem começar a atuar nesses conselhos, forçando a agenda de sustentabilidade”, explica.
Edmar Lopes, CFO da Movida (SA:MOVI3), ressalta que uma preocupação com o ESG também traz valor para empresas em termos financeiros. “No final das contas, o conjunto da obra é um conjunto de geração de valor. Ser (SA:SEER3) uma empresa melhor, com menos risco, com mais visibilidade das coisas e mais alinhada com os anseios dos clientes e da sociedade em geral ajuda a companhia no longo prazo”, explica.
“Houve um aumento no valor de ativos intangíveis, como marca e reputação, cada vez mais considerados como fonte importante de valor e cada vez mais impactados por essas questões de sustentabilidade”, completa Lemme. Nesse sentido, ter uma empresa alinhada a objetivos ESG fortalece a marca perante aos consumidores e também a seus colaboradores, permitindo a atração de novos talentos, segundo Lafetá.
E a tendência não deve se reverter. “Acho que isso deve perdurar porque é um desenvolvimento de mercado. Estamos hoje em uma trajetória que deve se consolidar nos próximos anos”, diz Maurício Lima. “No fim do dia, os millennials vão começar a ter mais dinheiro para investir, vão determinar as agendas dos fundos que, por sua vez, vão ter que escolher melhor as empresas. Isso tudo vai gerando um efeito positivo”, completa Edmar Lopes.
Celso Lemme dá ainda mais uma razão para acreditar que esse movimento deve crescer. “Esse movimento hoje é mais forte, naturalmente, nas grandes empresas, que têm mais acesso a esse conhecimento e têm mais recursos. Mas o movimento que as grandes empresas estão fazendo vai na direção da cadeia de valor, causando um efeito indutor da agenda de sustentabilidade sobre as pequenas e médias empresas”, explica
Outros vetores de crescimento apontados por Lemme são a articulação setorial por meio das entidades de classe, a articulação com o poder público, pressionando as autoridades por regulação, e uma aproximação entre empresas e investidores e o terceiro setor.
“A gente trabalha muito com a ideia de intersetorialidade. A questão social e sustentável do nosso país não vai ser resolvida se deixarmos só nas mãos do poder público. Deixar só na mão do terceiro setor não vai resolver também. Acho que o segundo setor tem que entrar nesse jogo, fornecendo recursos financeiros e incentivando”, finaliza Raphael Lafetá.