Com o crescimento forte tanto no shopping virtual quanto na área financeira no ano passado, o Mercado Livre (NASDAQ:MELI) (SA:MELI34) separou R$ 10 bilhões para investir em 2021 e a maior parte irá para o que pode se tornar sua terceira frente de negócios: a logística. "Por enquanto, estamos trabalhando para solucionar, facilitar e agilizar a entrega das vendas dos clientes", diz Stelleo Tolda, presidente do Mercado Livre para a América Latina. "Mas quando esse gargalo estiver resolvido, podemos oferecê-lo a terceiros." Entre outros movimentos, os recursos farão com que o número de funcionários do Mercado Livre passe dos atuais 5 mil para mais de 10 mil, até o fim do ano.
A expectativa é que o Mercado Envios, nome da área de logística, trilhe percurso parecido ao do Mercado Pago, segmento de serviços financeiros do Mercado Livre. Nascido para resolver os problemas de pagamentos dos vendedores do maior shopping virtual da América Latina, o Mercado Pago levou dez anos para se tornar relevante dentro da plataforma. Hoje, tem autorizações do Banco Central para funcionar como carteira virtual (com direito a rendimento maior do que a poupança), como processador de pagamentos (e com maquininhas no varejo físico) e como instituição financeira (para poder aumentar o limite do crédito, entre outros serviços). Os serviços são vendidos a terceiros e os próximos passos são oferecer alternativas de investimento para quem tem dinheiro no Mercado Pago, mas sem concorrer com as plataformas do segmento, como a XP (NASDAQ:XP).
Com tamanho crescimento, hoje a área financeira movimenta mais dinheiro do que o próprio shopping virtual. O volume de pagamentos processados no ano passado, nos 18 países da América Latina em que o Mercado Livre está presente, foi de quase US$ 50 bilhões. Já as vendas das lojas abrigadas na plataforma somaram US$ 20 bilhões. Em 2019, elas haviam sido de US$ 28 bilhões e US$ 13 bilhões, respectivamente. O Brasil responde por pouco mais da metade da receita líquida da empresa e cresceu 120% em reais, no ano passado.
Apesar de o Mercado Pago movimentar mais dinheiro que o marketplace, o retorno para o Mercado Livre é maior com os vendedores na plataforma. "Um dos nossos objetivos é incluir as pessoas no sistema financeiro e, portanto, as taxas cobradas são mínimas", diz Ricardo Lagreca, diretor jurídico e de relações governamentais do Mercado Livre.
Há um longo caminho para o Mercado Envios trilhar, antes de se tornar uma área de negócios. Os R$ 10 bilhões em investimento para 2021 equivalem ao que foi destinado à rubrica nos últimos quatro anos. Entre outras coisas, o dinheiro servirá para a construção de centros de distribuição e contratações para as áreas de logística e tecnologia.
Longe dos correios
Por outro lado, usar os recursos para entrar em uma eventual disputa pelos Correios está completamente descartado. "Os Correios não são pensados para a eficiência que buscamos", diz Tolda. "Como brasileiros e grandes usuários do serviço, queremos que ele melhore sempre, mas nosso modelo é outro."
Na prática, o Mercado Livre não pretende se tornar um Correios privado ou montar uma gigantesca estrutura própria de distribuição, apesar de haver mais carros, furgões e até mesmo aviões pintados com a marca da companhia. "Somos uma empresa de tecnologia", diz Tolda. Trocando em miúdos, isso significa que os sistemas que desenvolvem e em que investem conversam com boa parte das empresas de logística do País e traçam as rotas mais eficientes para cada carga, com os menores custos e prazos de entrega. Mas há muito a percorrer, sobretudo por conta do tamanho do País.
Com a prioridade dada à área, se há três anos 95% das entregas do Mercado Livre eram feitas pelos Correios, hoje só 5% são transportados por essa via. Em uma das frentes desenvolvidas, há armazéns com mercadorias de 10 mil lojistas virtuais estocadas e despachadas assim que o clique de venda é concluído. Em um outro modelo, o Mercado Envios recolhe os produtos em pontos de coleta e os distribui. O menor canal, mas ainda muito importante, é a remessa pelos próprios vendedores, pelos Correios.
"A nova fronteira dos marketplaces chama-se logística e todas as empresas da área estão correndo atrás de soluções para prestar o serviço mais rápido de entrega de mercadorias", afirma Eugênio Foganholo, sócio da consultoria especializada em varejo Mixxer. "Não é à toa que o Magalu (SA:MGLU3) está comprando startups que resolvem o último trecho da entrega e a B2W (SA:BTOW3) também caminha nessa direção."
Segundo Foganholo, esse diferencial é essencial na hora de conquistar os vendedores, que costumam ter lojas virtuais em todas as plataformas concorrentes. "Os grandes marketplaces estão se tornando seres tentaculares, com braços fortes em toda a prestação de serviços aos lojistas e clientes finais", afirma. "No desafio da logística, o próximo obstáculo a ser superado é o do transporte de alimentos." Nessa área, o Mercado Livre fez no mês passado uma parceria com o GPA, das redes Pão de Açúcar (SA:PCAR3) e Extra, e começa a fazer testes com alimentos não perecíveis. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.