Negócio da guerra: indústria de defesa cresce à sombra da insegurança geopolítica

Publicado 19.05.2025, 13:24
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Investing.com - Em um cenário global marcado por crises e conflitos, a indústria de defesa tem apresentado desempenho excepcional. Em sua mais recente análise para a revista Surplus, o jornalista econômico Stephan Kaufmann investiga os mecanismos que sustentam esse setor e questiona quem, de fato, se beneficia nesse modelo.

O aumento da instabilidade geopolítica tem dado impulso o faturamento das empresas do setor. “As garantias de segurança dos Estados Unidos tornaram-se questionáveis”, observa Kaufmann, e corporações como a Rheinmetall (ETR:RHMG) parecem explorar essa lacuna com destemor. Em 2023, a divisão militar da empresa registrou crescimento de 50% na receita, enquanto o lucro operacional saltou mais de 60%, atingindo o recorde de aproximadamente 1,5 bilhão de euros. “O setor bélico é extremamente lucrativo”, resume o autor, destacando que um dos maiores prejudicados por essa lógica é o contribuinte alemão, já que o Estado figura entre os principais compradores da companhia.

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Mas como explicar tamanha rentabilidade em um setor voltado à produção de armamentos? Kaufmann aponta uma combinação de poder de mercado, dependência estatal e precificação estratégica. “Países como a Alemanha não compram tanques no mercado internacional de maneira convencional”, afirma. Em vez disso, priorizam fornecedores nacionais para garantir previsibilidade política e fortalecer a economia doméstica. Esse arranjo cria um mercado protegido, onde os fabricantes de armas atuam com virtual exclusividade.

O resultado é uma margem de lucro que supera, com folga, as de outros setores. Enquanto as 100 maiores empresas da bolsa alemã obtiveram, em média, margem de 9,3% em 2024, a Rheinmetall alcançou 15,2%. No segmento de defesa, o índice chegou a 19%, e na área de armamentos e munição, a empresa obteve margem “espetacular” de 28,4%, acima dos 23% registrados no ano anterior. “De cada euro gasto com recursos públicos”, cita Kaufmann a economista Isabella Weber, “a companhia retém 28,5 centavos em lucro.”

Por que, então, o Estado aceita pagar tais valores? Segundo Kaufmann, os requisitos específicos da indústria justificam parte dos custos: tecnologia de ponta, materiais de alta qualidade, manutenção contínua da capacidade produtiva e investimentos volumosos em pesquisa e desenvolvimento são considerados essenciais, dado que no campo de batalha o segundo melhor produto simplesmente não serve. Soma-se a isso o fator escala: com produção limitada, os custos unitários disparam, e um único tanque pode custar até 15 milhões de euros.

Embora o argumento seja tecnicamente defensável, expõe uma assimetria fundamental: o Estado, como comprador exclusivo, encontra-se em posição vulnerável frente aos interesses das empresas, que impõem suas margens com poucas restrições. “Em 80% dos contratos do setor, há escaladas de preço”, aponta Kaufmann. “O valor inicial é subestimado e, ao longo do projeto, eleva-se progressivamente.”

Esse modelo gera efeitos perversos. De um lado, a indústria bélica lucra com a insegurança que ela própria ajuda a alimentar. De outro, o custo recai sobre os contribuintes, enquanto acionistas comemoram lucros recordes. “Estamos vivendo o início de uma era de rearmamento na Europa, que exigirá muito de todos nós”, declarou recentemente Armin Papperger, CEO da Rheinmetall. O que ele não disse é que o peso recairá principalmente sobre os cidadãos, ao passo que os conglomerados celebram suas “perspectivas de crescimento”.

Em síntese, o setor de defesa não opera sob as mesmas regras dos demais. Ele se sustenta no medo e na dependência dos Estados. Enquanto as empresas maximizam retornos, o restante da sociedade inevitavelmente arcará não apenas com os custos financeiros, mas também com as consequências humanas desse modelo. A análise de Stephan Kaufmann expõe com clareza as distorções do sistema, e reforça a urgência de um debate crítico sobre os limites entre segurança e lucro.

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