Por Marta Nogueira e José Roberto Gomes
RIO DE JANEIRO/SÃO PAULO (Reuters) - A Petrobras (SA:PETR4) anunciou nesta quinta-feira que terá a opção de adotar um mecanismo hedge para os preços da gasolina, podendo mantê-los congelados nas suas refinarias por até 15 dias sem incorrer eventualmente em perdas, uma vez que utilizará contratos futuros do combustível nos EUA como proteção das cotações.
O mecanismo, que foi recebido com ressalvas por analistas de mercado, que temem retrocessos sobre a política de preços, ocorre em meio a valores recordes da gasolina nas refinarias da Petrobras, que refletem a disparada do dólar e uma alta nos preços do petróleo no exterior.
A opção do uso do hedge foi aprovada pela diretoria da petroleira na quarta-feira e já está válida.
O anúncio, ressaltaram executivos da Petrobras, não implica em qualquer mudança na política de preços da empresa, pouco mais de um ano depois de a companhia adotar uma sistemática de reajustes quase diários, em linha com o mercado internacional e o câmbio.
Desde o início dos reajustes quase diários, o preço médio da gasolina nas refinarias da Petrobras acumulou uma alta de 59,5 por cento. Atualmente, o valor médio está em 2,2069 reais por litro, valor que será mantido na sexta-feira pelo terceiro dia seguido.
"A política de preços da Petrobras não mudou, a gente está mantendo a paridade de importação, temos a opção de seguir (o reajuste) diário, desde que isso não se traduza em uma volatilidade excessiva", disse a jornalistas o diretor-executivo da Área Financeira e de Relacionamento com Investidores, Rafael Grisolia, em uma coletiva de imprensa sobre o tema no Rio de Janeiro.
"Quando a volatilidade do mercado estiver muito excessiva, a gente poderá utilizar essas opções."
Os princípios de preço de paridade internacional (PPI), margens para remuneração dos riscos inerentes à operação e nível de participação no mercado continuam em vigor, assim como a correlação com as variações do preço da gasolina no mercado internacional e a taxa de câmbio, explicou Grisolia.
O diretor-executivo de Refino e Gás Natural da Petrobras, Jorge Celestino, disse que a compra dos derivativos de gasolina no mercado futuro norte-americano será realizada assim que for visualizada uma volatilidade importante no mercado.
O executivo citou como um exemplo de fenômeno que gerou volatilidade a tempestade tropical Gordon, que impactou recentemente as referências internacionais do petróleo.
"O que essa ferramenta está tirando é a volatilidade. Se existe uma tendência de aumento, ela tira essa variação, mas o delta no final dos períodos se mantém", disse Celestino.
As ações preferenciais da Petrobras subiam 0,3 por cento na bolsa paulista B3 por volta das 16:30, enquanto o índice de referência da Bovespa subia 1,2 por cento.
PRESSÃO?
A medida ocorre depois que uma greve histórica de caminhoneiros em maio contra os altos preços do diesel causou sérios danos à economia brasileira e forçou o presidente Michel Temer a cortar os preços do combustível por meio de um programa de subsídios.
Questionados sobre o momento escolhido para adotar a medida com a gasolina, se ela estaria relacionada a pressões sociais, vindas do cenário de eleições e após as manifestações de caminhoneiros, o diretor de refino não respondeu diretamente e defendeu que a decisão faz parte de uma evolução da política de preços.
"Obviamente aprendemos com sinais que outros agentes têm encaminhado para a Petrobras... Na verdade, isso é uma trajetória de sofisticação da política de preços da Petrobras, que permanece mantida."
Anteriormente, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) chegou a fazer uma consulta pública sobre a possibilidade de estabelecer por meio de resolução um período mínimo para o repasse ao consumidor dos reajustes dos preços dos combustíveis, o que foi descartado posteriormente.
Para o analista Gabriel Fonseca Francisco, da XP Investimentos, entretanto, "a notícia deve ser lida como negativa, pois pode ser interpretada como um retrocesso na política de preços, dado que a empresa ficaria mais exposta a potenciais perdas em momentos de volatilidade de petróleo e principalmente do câmbio", segundo nota distribuída a clientes.
O Itaú BBA, por sua vez, considerou a notícia neutra, citando que a estratégia, se efetivamente empregada, reduziria a volatilidade dos preços da gasolina para o consumidor final. O analista André S. Hachem ponderou em nota a clientes que a sua principal incerteza será em relação a como essa estratégia será empregada, "já que provavelmente não sabemos a estrutura das posições de hedge enquanto os preços estão congelados".
O professor e pesquisador do Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da UFRJ, Edmar de Almeida, acredita que a medida ajuda a melhorar a qualidade do mercado de gasolina no Brasil.
"Eu acho positivo, porque é uma política que a própria Petrobras está propondo por meio de inovações financeiras... Volatilidade nunca é bom para qualquer mercado, não só porque afeta os consumidores, mas também porque diminui a transparência com relação a preços na cadeia de valor", afirmou.
O Goldman Sachs afirmou em relatório a clientes que "será fundamental monitorar a implementação do mecanismo de hedge... a fim de avaliar se os preços domésticos refletirão as referências internacionais à luz da maior volatilidade nos preços internacionais e nos níveis de câmbio".
Segundo a Petrobras o preço das refinarias representa cerca de um terço do valor do combustível vendido nos postos ao consumidor final. Entram na composição de preços ao consumidor, ainda, o custo do etanol, os tributos e as margens de distribuidoras e revendedores.
(Por Marta Nogueira, no Rio de Janeiro, e José Roberto Gomes, em São Paulo; reportagem adicional de Paula Laier)