A desaceleração do dólar e o avanço de ativos alternativos, como o Bitcoin, refletem um quadro mais amplo de preocupação com a saúde fiscal dos Estados Unidos e os desdobramentos dessa fragilidade sobre os mercados globais. Entre 2022 e 2024, o governo norte‐americano ampliou seus gastos em pacotes de estímulo que, somados às consequentes reduções de receita, elevaram o déficit primário a níveis inéditos. Em maio de 2025, essa tensão ficou explícita em leilões de títulos: a demanda pelos Treasuries de 20 anos atingiu o menor patamar desde fevereiro, levando o rendimento a 5,13% - o ponto mais alto desde novembro de 2023 - e sinalizando um crescente receio dos investidores diante do endividamento recorde e de projeções de déficit ampliado por novas reformas fiscais em tramitação no Congresso.
No ambiente externo, o índice DXY, que mede o dólar contra seis moedas fortes, acumula queda de mais de 8% em 2025. Essa desvalorização decorre tanto da percepção de que o endividamento crescente e o cerco de rating - agravado pela recente redução da nota soberana pela Moody’s - fragilizam o equilíbrio das contas públicas, quanto do receio de que as disputas comerciais e tarifárias conduzidas por Washington aprofundem a desaceleração global. A retração do dólar, porém, encontra um ponto de saturação: embora haja razões fundamentais para uma visão de médio prazo negativa sobre a moeda americana, o pessimismo excessivo já levou hedge funds a deterem mais de US$ 17 bi em posições vendidas no dólar - nível mais tímido em quase duas décadas -, o que pode preparar o terreno para correções abruptas em caso de notícias positivas sobre o orçamento norte‐americano.
É nesse caldo de incerteza que o Bitcoin desponta como refúgio especulativo e reserva de valor atraente. Em 2025, a criptomoeda já se valoriza 18%, superando amplamente os retornos de ativos tradicionais em moeda forte. A lógica é simples: diante da corrosão fiscal nos EUA e do temor de que a impressão de dinheiro - embutida em novos estímulos - se traduza em inflação mais persistente, investidores buscam proteção em ativos distribuídos, com oferta limitada e independentes de balanços estatais. Além disso, a própria narrativa de descentralização e do “ouro digital” ganha força à medida que autoridades monetárias demonstram hesitação em coordenar políticas eficazes entre si.
O contexto de dólar fraco e rendimentos americanos em alta ressuscita a discussão sobre a coordenação entre política monetária e fiscal. Muitos analistas apontam que a eficácia do aperto monetário esbarra na ausência de disciplina orçamentária: se o Tesouro seguir emitindo em alta frequência e volumes crescentes, a âncora proporcionada por juros elevados perde parte de seu poder de ancoragem. Nesse sentido, o Bitcoin e outras criptomoedas atuam como “vigilantes de mercado”, aumentando a pressão para que governos equilibrem receitas e despesas, sob pena de acelerar a migração de capitais para esses refugos digitais.
Por fim, o ambiente exposto também traz janelas de oportunidade para quem se posiciona antecipadamente. Fundos de crédito estruturado podem capturar yields maiores em debêntures de empresas sólidas, cujos spreads tendem a se alargar antes de se normalizar. Estrategistas de moedas recomendam operações de carry com moedas de países com política fiscal robusta e prêmios de juros atrativos. Na esfera de commodities, o dólar mais fraco favorece a elevação dos preços domésticos e, por extensão, a rentabilidade das empresas de base de recursos naturais. E, claro, o Bitcoin reserva espaço para estratégias de diversificação: long positions graduais podem aproveitar momentos de retração pontual para acumular posição, enquanto produtos estruturados de volatilidade em criptomoedas oferecem hedge contra choques fiscais e monetários futuros.
Em suma, a corrosão fiscal e a vulnerabilidade do dólar imprimem volatilidade e tensão aos mercados globais, mas também geram oportunidades que exigem leitura apurada dos fundamentos e agilidade na execução. Para gestores e investidores que conseguirem unir a análise rigorosa da evolução das contas públicas americanas, a dinâmica dos rendimentos e a narrativa de ruptura monetária, o cenário atual pode render ganhos consistentes e protegidos, mesmo num ambiente incerto. Afinal, o verdadeiro arbitrador de valor em 2025 será quem enxergar, além do ruído de curto prazo, as tendências de longo prazo que se desenham por trás de cada curva de juros e cada bloco de código em blockchain.