Se você investe em algum segmento de renda variável no Brasil, muito provavelmente você perdeu dinheiro em 2020. É notória a queda do Ibovespa, que devido à crise do coronavírus saiu de máximas na região dos 120 mil pontos e chegou a atingir a região dos 60 mil, amargando uma queda de cerca de 50% em poucas semanas. Porém o mercado de ações não foi o único a sofrer: o Ifix, principal índice dos fundos imobiliários chegou a cair 42% e o Imab, índice dos títulos do tesouro atrelados à inflação, teve quedas de 19%.
Dos investimentos tradicionais do investidor pessoa física, apenas o dólar acumula alta no ano, subindo mais de 42% no momento de escrita deste artigo. Dessa forma, o dólar ajudaria a atenuar os prejuízos do portfólio do investidor, mas considerando a ordem de grandeza dos prejuízos observados nos últimos meses, quantos investidores teriam dólar suficiente para compensar as perdas da sua carteira de investimentos?
Diante dessa situação, é possível que muitos investidores filhos de um bull market estrutural pelo qual o país e o mundo passavam até a chegada da Covid-19 deixem de acreditar no seu potencial como alocador de recursos e passem a contratar os serviços de um gestor profissional, por exemplo, através de um fundo multimercado. O resultado também não seria muito animador: apesar da queda mais tímida, o IHFA, índice que mede o rendimento dos fundos multimercado brasileiros, cai mais de 4% no ano.
É importante destacar que esta performance nada animadora não nos diz muito sobre a gestão de risco dos fundos multimercados, sendo somente uma triste constatação relacionada à dura realidade das crises: em momentos de stress todas as correlações entre ativos tendem a um. De nada adianta diversificar, todos os ativos performam mal quando investidores querem fugir para a liquidez. Até mesmo o ouro, histórico porto seguro dos investimentos chegou a desabar da cotação de 1.700 dólares por onça-troy para a região dos 1.400.
Como então é possível montar uma carteira de investimentos que pudesse não apenas passar ilesa por essa crise, mas também se beneficiar deste cenário devastador? Uma estratégia que tem ganhado bastante visibilidade recentemente é a estratégia Barbell, criada pelo estatístico e best-seller Nassim Taleb. A estratégia é bem simples, consistindo na alocação de não menos que 85% em ativos livres de risco (títulos públicos, por exemplo) e o restante sendo alocado em investimentos de altíssimo risco, como opções out of the money (ou, em português, opções fora do dinheiro).
A ideia subjacente por trás da estratégia Barbell é que muitas vezes as opções irão expirar sem serem exercidas, virando pó. Porém caso elas de fato possam ser exercidas (em eventos de alta magnitude que não poderiam ser previstos, que Taleb chama de cisnes negros), as opções se valorizariam exponencialmente, compensando as perdas das opções expiradas e o baixo rendimento das aplicações conservadoras, onde está alocada a maior parte do patrimônio. Dessa forma seria possível conseguir excelentes retornos sem incorrer em altos riscos.
A estratégia Barbell inquestionavelmente tem seus méritos: transformou seu criador em multimilionário na segunda-feira negra de 1987, enquanto os mercados caíam 22% em um único dia. Mais recentemente, o fundo Universa, gerido por Mark Spitznagel e aconselhado por Taleb, obteve rendimentos de 3.600% apenas em março, somando mais de 4.100% de retorno em 2020 enquanto o mundo colapsava sob os efeitos do novo coronavírus.
O grande problema da estratégia Barbell é que ela não pode ser exportada para o Brasil. Com uma grande cultura de investimentos em ações, as bolsas norte-americanas negociam anualmente mais de 30 trilhões de dólares em ações, segundo o Banco Mundial. O Brasil, que apenas recentemente atingiu 2 milhões de CPFs cadastrados na B3, ainda aguarda por atingir seu primeiro trilhão de dólares em movimentação anual.
Evolução e comparação dos tamanhos dos mercados de capitais entre Brasil e Estados Unidos. Fonte: Banco Mundial
Por termos um mercado relativamente pequeno, temos uma tendência a ter uma alta volatilidade, o que por sua vez faz com que as opções no Brasil sejam negociadas a prêmios extremamente elevados, já que a volatilidade implícita dos ativos interfere diretamente no preço das opções, efeito sabido desde a criação do modelo de Black & Scholes na década de 1970.
No mercado americano investidores conseguem investir de forma barata em fundos de índice que replicam o VIX, índice de volatilidade implícita da CBOE, bolsa de opções de Chicago, mas no Brasil instrumentos como esses infelizmente não existem devido ao altíssimo custo da sua estruturação.
Outro problema da compra sistemática de opções fora do dinheiro é o risco de reinvestimento: uma vez que suas opções se valorizem exponencialmente, em que outro ativo o investidor deveria investir os lucros? Vejamos nos gráficos abaixo a evolução dos sorrisos de volatilidade nas opções sobre o BOVA11, fundo de índice (ETF) de maior liquidez na B3:
Sorriso de Volatilidade de Opções sobre o BOVA11 em fevereiro de 2020
Sorriso de Volatilidade de Opções sobre o BOVA11 em maio de 2020, Demonstrando um Enorme Crescimento de Volatilidade.
Constatamos então que, infelizmente, o uso frequente e sistemático da compra de opções fora do dinheiro no Brasil tende a ter um alto custo para o investidor, eventualmente culminando em uma relação ruim de risco e retorno. Nesse cenário como pode então o investidor criar um portfólio capaz de enfrentar momentos de extrema volatilidade como os que enfrentamos agora?
Se em momentos de stress todas as correlações de ativos tendem a um, a chave para essa questão passa por não pensar em alocação passiva, mas sim em estratégias ativas que possam se beneficiar de momentos de alta volatilidade no mercado. Estratégias como essas invariavelmente terão de passar pela compra e venda intradiária de ativos, aproveitando-se das oscilações do mercado.
As operações de day trade são de fato muito arriscadas, especialmente ao se trabalhar com um grande nível de alavancagem como é comum entre os investidores brasileiros, e por isso é muito importante que o investidor faça a alocação de apenas uma pequena parcela do seu capital para esse tipo de estratégia. O ideal é que para realizar esse tipo de operação o investidor não confie apenas em seus instintos sobre as tendências do mercado, mas sim que possa contar com métodos estatísticos que garantam maior precisão e lucro nessas operações.
Para isso o investidor pode se utilizar de robôs traders como os que são oferecidos no Brasil ou realizar aplicações em fundos quantitativos, que são fundos de investimento que operam utilizando modelos estatísticos sofisticados.
Apenas para efeitos ilustrativos, observemos o comportamento de um robô da estratégia Capital WIN OnTime, distribuído pela SmarttBot, que opera com minicontratos futuros do índice Bovespa:
Evolução do Patrimônio de um Robô da Estratégia Capital WIN OnTime, com rendimento de 300% no período destacado
Note que o robô passou meses sem entregar altos retornos, mas se analisarmos seu comportamento a partir do dia 05/03 veremos que enquanto o Ibovespa derretia com períodos de desvalorizações bastante expressivas e em meio a seis circuit breakers entre os dias nove e dezoito de março deste ano, o robô acima foi capaz de multiplicar o capital inicial de quatro mil reais em quatro vezes, atingindo um rendimento líquido de doze mil reais em menos de dez dias.
É importante frisar que o exemplo acima não se trata de uma recomendação de investimento, mesmo porque o robô em questão chegou a ter um drawdown (perda de capital) de 93%, número extremamente elevado e que reflete o risco inerente a esse tipo de robô. Entretanto, o exemplo é capaz de ilustrar o potencial de estratégias como essas na proteção de um portfólio de investimentos, desde que utilizada com a devida proporção e cautela. Caberia então ao investidor selecionar estratégias com modos operacionais menos arrojados para a maior parte do seu patrimônio, apostando apenas uma pequena proporção do seu patrimônio em estratégias como essa.
É claro, o uso de estratégias automatizadas de investimento de forma alguma é garantia de rentabilidade: mesmo fundos da Renaissance Technologies, gestora quantitativa de melhor histórico de performance no mundo, chegaram a cair 17% no mês de março. Entretanto, em meio a enormes ondas de volatilidade que constantemente nos atingem, seja em forma de greve de caminhoneiros, Joesley days ou demissões de ministros, é difícil saber o que fazer. Nestes momentos eu prefiro contar com a estatística dos nossos robôs.