O mais recente golpe no mercado de altcoins vem de mais uma memecoin de origem duvidosa, a LIBRA, criada na blockchain de propósito geral Solana, conhecida por sua alta velocidade e baixas taxas de transação. Assim como muitas memecoins, LIBRA passou por um “rug pull”: atingiu uma capitalização de mercado superior a US$ 4 bilhões no sábado e despencou para US$ 300 milhões na segunda-feira.
No momento da publicação, a atividade de negociação de LIBRA aumentou, elevando seu valor de mercado para mais de US$ 500 milhões. Crédito da imagem: DexScreener.
Dessa vez, o colapso da memecoin tem contornos incomuns. Primeiro, porque o presidente argentino Javier Milei, conhecido por seu posicionamento libertário e pela defesa de cortes drásticos nos gastos públicos, promoveu LIBRA em sua conta oficial no X na sexta-feira.
A princípio, isso parecia fazer sentido, já que LIBRA está associada ao slogan "Viva La Libertad", tema central de sua campanha presidencial. No entanto, em apenas quatro horas, Milei afirmou desconhecer a origem do token e apagou sua publicação de apoio.
Esse foi o período em que LIBRA valorizou rapidamente, levando ao rug pull logo em seguida. Mais recentemente, Milei determinou que o Escritório Anticorrupção investigasse o lançamento da LIBRA por suspeita de fraude. A decisão veio após seus opositores políticos pedirem seu impeachment no fim de semana, alegando irregularidades no caso.
Mas esse pode ser apenas o início do escândalo. Outro fator que torna o caso LIBRA ainda mais peculiar é a possibilidade de que seus criadores sejam os mesmos responsáveis por MELANIA e outras memecoins.
Memecoins: esquema coordenado de extração de riqueza?
Em colaboração com o renomado investigador de criptoativos Stephen Findeisen, conhecido como Coffeezilla, e a plataforma Bubblemaps, surgiram evidências on-chain que conectam MELANIA aos criadores de LIBRA.
A base dessa suspeita está em um endereço de carteira (OxcEA) previamente vinculado à memecoin MELANIA. Outro endereço enviou fundos para essa carteira em uma atividade chamada "sniping", que consiste em utilizar bots para comprar um ativo no menor preço possível antes de uma valorização expressiva.
A partir dessas operações, mais de US$ 2,4 milhões foram movimentados entre os dois endereços. Coffeezilla e Bubblemaps mapearam as transações on-chain entre os responsáveis por MELANIA e os criadores de LIBRA, identificando um padrão recorrente de transferências e liquidação de ativos.
Rastreamento on-chain e movimentação de capital da LIBRA
Crédito da imagem: Bubblemaps.
O gráfico revela que a carteira OxcEA financiou o endereço DEfcyK, vinculado ao lançamento de LIBRA. No sábado, a Bubblemaps já havia reportado que a equipe por trás de LIBRA estava retirando liquidez de pools de USDC e SOL, escoando cerca de US$ 87 milhões na época.
Além de MELANIA e LIBRA, as trilhas on-chain também indicam envolvimento em outros tokens de pump and dump, como KACY, VIBES, TRUST e HOOD (NASDAQ:HOOD).
Dentro desse enredo, Coffeezilla, agora rebatizado como voidzilla, recentemente entrevistou Hayden Davis, um dos criadores de LIBRA, junto com Julian Peh (Kip Protocol), Mauricio Novelli (Tech Forum Argentina) e Manuel Godoy (Tech Forum Argentina).
Davis negou que tenha sido um rug pull, alegando que se tratava de um "plano que deu muito errado". Além disso, enfatizou que Milei não teria lucrado com o lançamento da LIBRA, informação que foi compartilhada pelo próprio presidente.
Enquanto isso, embora o KIP Protocol parecesse envolvido no projeto, a empresa se manifestou para esclarecer sua posição.
"KIP não iniciou o projeto, não gerenciou nem direcionou o processo de lançamento do token, não recebeu tokens antes ou depois do lançamento e não obteve qualquer lucro com ele."
De acordo com as informações disponíveis, a responsabilidade pelo lançamento de LIBRA recai sobre Kelsier Ventures e Hayden Davis.
Lições de mais uma memecoin fracassada
Na entrevista com voidzilla, Hayden Davis foi direto: "É uma memecoin, se você está apostando todo o seu portfólio em uma memecoin... isso é um erro."
O pressuposto subjacente é que memecoins não possuem valor intrínseco e têm uma natureza efêmera. Voidzilla também apontou que há uma linha tênue entre "extração desleal de valor" e um rug pull, já que os investidores entram nesse mercado cientes da fragilidade desses ativos.
Em resumo, a dinâmica pode ser explicada assim:
- Diferentemente do Bitcoin, que é sustentado por uma rede de mineração baseada em proof-of-work, memecoins e a maioria das altcoins podem ser criadas indefinidamente e do nada.
- Como o custo de produção de novas criptomoedas é praticamente nulo, isso apenas amplia a diluição do mercado de altcoins, fomentando ciclos curtos de pump and dump.
- Esse cenário cria um grupo de traders que trata o setor cripto como um esquema de apostas relâmpago, enquanto os verdadeiros beneficiários são aqueles que manipulam os mercados no topo da cadeia.
O resultado? Um modelo totalmente oposto à proposta original de blockchain e dinheiro descentralizado.
Milei: atingido, mas ainda forte
Agora que Javier Milei foi envolvido no escândalo das memecoins, é provável que esse segmento perca um pouco de sua euforia. Para Milei, a situação é especialmente constrangedora, já que sempre se apresentou como um defensor da moeda forte e do livre mercado, chegando a chamar o Banco Central da Argentina de "um dos maiores ladrões da história da humanidade".
Assim como ocorre com memecoins, bancos centrais criam dinheiro do nada, causando inflação e corroendo o poder de compra da moeda. No entanto, o Dólar Americano sofre menos com esse efeito devido ao seu papel de reserva global. Desde que Milei assumiu a presidência, a inflação argentina caiu para o menor nível em cinco anos, chegando a 2,2%.
Combinado aos cortes profundos nos gastos públicos e ao fim de subsídios, Milei acumulou muitos inimigos. Os pedidos de impeachment devem ser interpretados dentro desse contexto, mais como uma reação política do que um esforço genuíno de combate à corrupção.
Ainda assim, apenas a possibilidade de impeachment fez o índice S&P Merval (IMV (OTC:IMVIF)) recuar quase 5% na segunda-feira. Isso ocorre porque o antigo establishment político, responsável pelo colapso econômico da Argentina, é uma variável conhecida. Um retorno ao passado sinalizaria mais dificuldades econômicas.
Ironia do destino, essa leitura de mercado pode reforçar ainda mais o apoio à presidência de Milei, independentemente do escândalo da LIBRA. No fim das contas, LIBRA pode até recuperar valor se a investigação concluir que tudo não passou de forças naturais do mercado. Mas, mesmo assim, investidores fariam bem em evitar ativos lastreados em fundamentos tão frágeis.
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