Inflação pegando
A inflação oficial atingiu em março o maior nível em 20 anos, levando o IPCA acumulado em 12 meses para 8,13%.
Quando falei no M5M um ano atrás que a inflação de fato (e não aquela virtual, de preços represados pré eleição) já havia estourado o teto da meta fui taxado de “mentiroso”, “tucano” e “terrorista”.
Lembrando que o teto da meta é 6,5%... E, ninguém mais lembra ou toma por base, mas a meta de inflação de verdade é 4,5%.
Mas bola pra frente. A questão agora é outra...
Até que ponto o Banco Central vai brigar contra inflação, aprofundando a recessão (com aumento de juros)?
A partir de qual momento a recessão vai incomodar de tal forma que se abandone a luta contra o descontrole dos preços, cortando juros para tentar despertar a economia?
Em favor da sua ignorância - um exemplo prático (com Vale)
Quem imaginava que o preço do minério chegaria a US$ 50 por tonelada esse ano?
Ninguém, o que inclui a própria Vale, maior produtora do mundo.
Essa interrogativa aparece em relatório de banco de investimentos. No relatório, o analista revisa para baixo suas projeções para o preço do minério de ferro e para o preço-alvo da ação da Vale.
Veja bem: ele acaba de revisar a sua projeção para o preço do minério de ferro este ano, o que atesta que sua projeção estava errada, e admite que ninguém imaginava a dinâmica do mercado atual, o que não deixa de ser verdade...
Mas, no mesmo relatório continua fazendo a projeção para este, o próximo e muitos anos à frente. Ora, se a estimativa dele para este ano acaba de ser quebrada (revisada), qual a visibilidade que ele tem para fazer projeção para a mesma variável em 2018?
E o problema não é do(s) analista(s) em si. Ele(s) trabalha(m) com as informações que tem em mãos, assume premissas, e se esforça(m) ao máximo para que elas cheguem o mais próximo possível da realidade...
O problema é do próprio modelo de fluxo de caixa descontado e da ditadura do mercado, que toma preços-alvo como baliza para decisões financeiras, ignorando a completa subjetividade e imprevisibilidade da coisa.
Moral da história: não se contamine com o mal da cabeça obcecada por planilhas.
O que você pode fazer - um exemplo prático (com Vale)
Tá, mas a ação da Vale já provou que é uma derivada da volatilidade diária do preço do minério de ferro.
Se nem a Vale, que é a maior produtora do mundo, está conseguindo acertar o preço do minério, o que lhe resta?
Concentrar no que é minimamente tangível.
O cenário volátil de preços está praticamente destruindo o setor, restando poucos players capitalizados e com vantagens de escala, que, naturalmente, ganharão mercado ao longo da curva.
Trata-se, ainda, de um mercado-chave, cujo principal demandante é uma economia que, apesar de ter diminuído o ritmo de crescimento, ainda cresce a mais de 6% ao ano.
A Vale possui uma estrutura de custos relativamente enxuta e ativos de classe global (com teor de ferro mais elevado do que a média), capaz de gerar caixa em cenário adverso.
É como disse o Fabio Alperowitch, gestor da Fama Investimentos, que tem US$ 400 milhões em ativos sob gestão, ao Conversas com Gestores: “as coisas em empresas são muito mais lentas, enquanto o mercado financeiro é muito imediatista”.
Já que as coisas em empresas são mais lentas, enquanto o mercado financeiro é imediatista, no caso, tente concentrar na empresa.
Criaram um monstro
Hoje o mercado encontra fôlego para estender o rali mais recente. Não pela inflação, pela meta fiscal, ou pelo Temer, mas, sim, pelo ambiente externo propício.
Pudera...
O índice Hang Seng, da bolsa de Hong Kong, subiu 4%.
Mais impressionante, o seu volume financeiro: US$ 32 bilhões no pregão.
Isso é equivalente a 3x a média diária deles, e 20% a mais do que o recorde anterior de volume local, em outubro de 2007 (pré-estouro do crise subprime).
Como explicar isso?
Já conversamos sobre a farra de liquidez e a bolha de crédito versão China...
Tem cerca de US$ 1,3 trilhão somente em empréstimos ocultos (fora do sistema financeiro regulado), segundo a IHS Global Insight. E, segundo o JP Morgan, o crédito “obscuro” foi responsável por 69% do PIB chinês em 2012.
Agora, como a bolha de crédito já inflou a Bolsa de Shanghai um bocado (vide o gráfico abaixo), ela ficou cara e os investidores locais começam a migrar para Hong Kong.
Risco-China? Desaceleração econômica?
Pode ter na ação da Vale, mas não tem nas ações chinesas...
A propósito, o múltiplo de P/L (preço/lucro) médio das empresas de tecnologia da China está em 220x.
Está disposto a pagar isso, para, grosso modo, ter retorno daqui 220 anos?
E se eu imprimir um bocado de dinheiro e te emprestar a juro zero?