Pois é, você não leu o título errado. O IPCA, nosso principal indicador de inflação ao consumidor do país, registrou queda de 0,68% em julho. Sim, o índice apresentou deflação mensal – o que significa que os preços de bens e serviços caíram entre um mês e outro. Esse foi o menor resultado para o mês desde o início da série histórica (em 1980), mas está longe de contar toda a história.
Antes de tudo, vale lembrar que deflação nem sempre é positiva para a economia. Pelo contrário, preços caindo podem sinalizar graves crises, marcadas por um forte enfraquecimento da demanda, que acaba por desincentivar a produção.
Como você deve imaginar, esse não é o caso do Brasil hoje. Porém, antes de estourar o champanhe e comemorar “o fim da inflação”, vale destacar outros detalhes da situação atual.
O alívio temporário
Primeiro, a deflação observada em julho foi puxada pela redução de impostos sobre bens e serviços específicos – no caso, combustíveis, telecomunicações e eletricidade. Com menos tributos incidentes sobre eles, o preço final desses bens e serviços ao consumidor caiu, mesmo sem diminuir na demanda. A queda, então, é explicada pela redução de determinados impostos federais e estaduais sobre bens como gasolina e gás de cozinha (alguns destes sendo até zerados) – por meio de mudanças legislativas aprovadas pelo Congresso recentemente.
Ou seja, a queda da inflação não se deu de maneira disseminada e estrutural no mês. Pelo contrário, se não considerarmos esses itens com preços mais voláteis (como gasolina e energia), a inflação seguiu positiva em julho – ou seja, preços subindo.
Além disso, não podemos esquecer que a inflação segue “rodando” acima de 10% no acumulado em doze meses (a métrica mais usualmente observada como referência popular à inflação). Daí a sensação de que tudo segue muito caro. Afinal, os preços de bens e serviços no país subiram, em média, 10% se compararmos ao ano passado (12 meses atrás).
Finalmente, mas não menos importante, uma parte da queda desses impostos (os impostos federais) é temporária. Ou seja, tem validade apenas até o fim deste ano. Deste modo, quando esses tributos voltarem ao patamar anterior, os preços também tendem a voltar – a não ser que o vendedor opte por um desconto.
Nesse ponto, vale lembrar que sempre há a possibilidade de tais reduções de impostos tornarem-se permanentes, caso aprovado no Congresso. Nesse caso, os preços deixariam de subir de imediato. Porém, não se engane! O gasto adicional (afinal, o governo arrecada menos) precisaria ser pago de qualquer forma: com mais dívida, aumento de outros impostos ou mais inflação no futuro.
A luz no fim do túnel e as feras do ano eleitoral
Dito tudo isso, há um lado positivo e não conjuntural no que vimos no resultado do IPCA de julho: o pior parece ter ficado para trás, pelo menos por ora.
É possível observar que alguns preços começam a perder fôlego, com o mundo voltando a produzir e escoar produtos normalmente (especialmente com a normalização da atividade na China) e preços de commodities caindo no mercado internacional. E, nesse ponto, o medo de uma recessão global acaba jogando a favor. Afinal, mundo que cresce menos, consome menos, produz menos, e demanda menos insumos básicos.
Nesse contexto, o diabo passa a morar no setor de serviços. Com a economia normalizada, o mercado de trabalho melhorando e benefícios fiscais renovados, o consumo de serviços ganha força – pressionando os preços.
A taxa Selic em 13,75% ao ano (determinada pelo Banco Central) é uma das principais armas nessa cruzada, encarecendo o crédito e desaquecendo a demanda por bens e serviços. Porém, junto dela, precisam andar as expectativas sobre a inflação no futuro. Afinal, a inflação é o que chamamos de profecia autorrealizável: se todo mundo acha que os preços não vão parar de subir, todo mundo aumenta o seu próprio, e a inflação efetivamente sobe.
Porém, as expectativas são feras mais difíceis de domar. E o ano eleitoral as torna ainda mais ferozes.