O mercado de açúcar teve uma semana de baixas generalizadas motivada pela aparente tranquilidade com que a Copersucar tem lidado com os problemas decorrentes do incêndio nos seus armazéns no Porto de Santos, passando um sentimento de que possíveis gargalos logísticos serão virtualmente equacionados. Somem-se a essa percepção a surpreendente posição comprada dos fundos. Com a interrupção dos serviços não essenciais pelo governo americano enquanto se aprovava o novo teto de endividamento, o CFTC atrasou a divulgação do relatório dos comitentes, que informa quem está comprado e quem está vendido, e o mercado apenas "chutava" que esse número seria muito alto. O mercado realizou fortemente do pico ocorrido há duas semanas de 20,16 centavos de dólar por libra peso e mergulhamos quase 200 pontos ou cerca de 45 dólares por tonelada.
A semana fechou com baixa entre 33 e 78 pontos, ou seja, perdas entre 7 e 17 dólares por tonelada. O vencimento março/2014 encerrou o pregão de sexta-feira cotado a 18,25 centavos de dólar por libra-peso.
O título desse comentário foi extraído de uma expressão francesa e lema de uma das principais ordens britânicas criada pelo Rei Eduardo III, no tempo das cruzadas. Em tradução livre seria equivalente ao nosso “Maldito seja quem pense mal disto”. Dizem que a frase foi cunhada por Sua Majestade durante uma grande festa em 1347 (uma espécie de Sugar Dinner da época), em que ele dançava com sua amante, a Condessa de Salisbury, quando essa perdeu sua liga azul. Mais que depressa o Rei recolocou-a sob os olhares maliciosos dos nobres da corte, clamando que ninguém deveria pensar mal sobre seu gesto. Em seguida criou a Ordem da Jarreteira que tem como símbolo uma liga azul sobre fundo dourado e é uma das mais prestigiosas ordens do Reino Unido.
Como entre seus apenas 24 membros (a Rainha, o Príncipe de Gales e mais 24 pessoas ilustres) não consta nenhum trader de açúcar, é claro que os mortais do mercado acreditam – e não há nenhum mal que eles assim pensem - que os problemas logísticos serão muito difíceis de ser equacionados mais adiante, mas ninguém gosta de comentar abertamente pois parece mau agouro. Não dá para gritar “cortem-lhe a cabeça” se alguém acredita que teremos problemas.
A sorte, para a situação em si, é que normalmente no primeiro trimestre do ano os embarques de açúcar diminuem consideravelmente. Nos últimos 10 anos, o primeiro trimestre do ano civil respondeu, em média, por apenas 17% daquele ano, ou seja, é um período com movimentação 35% menor do que a média dos demais meses. Ocorre que, não podemos nos esquecer, pelo menos 8 milhões de toneladas foram retiradas do circuito logístico. Elas terão que escoar de algum modo, mas não sem reflexos no prêmio e nos custos de frete e elevação. Quem pensa diferente é ingênuo.
Quem teve acesso ao terminal da Copersucar depois do lamentável incêndio afirma que vão se passar alguns meses até que todo o açúcar seja retirado e pelo menos 8-12 meses para que o terminal volte a ser operacional. Não temos como confirmar essa informação. A pergunta que o mercado faz não é se, mas sim quando esse episódio vai afetar os prêmios.
Apesar da performance baixista dos últimos dias, conforme temos opinado nesse espaço, já vimos o preço mais baixo. Ou seja, 15,93 centavos de dólar por libra peso foi a mínima dos últimos 42 meses e deverá assim permanecer. Um ponto que sempre gosto levantar é quanto o mercado negocia em reais por tonelada. Certamente existe uma grande resistência em torno de 980-1,000 reais por tonelada FOB Santos, ao longo da curva de NY e dos preços do dólar nessa mesma curva via operações de NDF. Nesse nível muitas usinas se sentem encorajadas em fixar seus contratos de venda para exportação. Lembrando, que de acordo com o modelo da Archer Consulting, o custo de produção de açúcar está em torno de 700 reais por tonelada posto na usina.
O mercado interno de açúcar apreciou 2,5% por cento desde o incêndio no Porto de Santos comparativamente ao mercado de exportação que mudou de 19 centavos de dólar por libra peso para 18,25 centavos de dólar por libra peso. O spread entre os dois é de 6,75%.
Ainda existe muita gente que acredita que o Centro-Sul deve encerrar a presente safra com uma moagem total de 590 milhões de toneladas. O número da Archer Consulting, de dois meses atrás, é de 578 milhões de toneladas.
Começam as previsões de quanto vamos crescer no próximo ano. Embora ainda seja cedo demais, poucos acreditam numa expansão além de 5% em relação a essa safra, ou seja, estamos falando em algo como 610 milhões de toneladas de cana. Como já dissemos aqui à exaustão, o Brasil precisa crescer 25 milhões de toneladas de cana apenas para atender ao consumo potencial de etanol em virtude do aumento da frota.
Se a Petrobras realmente implementar a política de reajuste de preços dos combustíveis baseados numa formula que reflita as variações do mercado internacional, esse será um importantíssimo passo para a tão necessária retomada de investimentos no setor. Quanto mais transparente for essa formula (sobre a qual nada se sabe ainda) maior a chance de haver instrumentos financeiros de balcão a serem disponibilizados para o setor objetivando o hedge do etanol hidratado, produto que em 42 por cento das vezes, nos últimos cinco anos, foi negociado abaixo do custo de produção.
Uma correção: no comentário da semana passada dissemos que o armazém que pegou fogo em Santa Adélia, região de Catanduva, pertencia à EDF Man. Na verdade pertence a Agrovias, em cuja empresa a EDF Man possui participação acionária.
A Bloomberg está disponibilizando para seus clientes os comentários de açúcar e café da Archer Consulting. Basta digitar ARCO
Boa semana a todos.