Nos últimos dias, algumas gestoras bem tradicionais de ações brasileiras têm sido vocais em relação à irrelevância das eleições de 2022 para quem investe com um horizonte de longo prazo (mínimo de três anos). É uma opinião polêmica, mas tendo a concordar com ela.
Isso assume, naturalmente, que o vencedor em 2022 não estará no extremo de nenhum dos lados do espectro político — seja por opção ou por moderação forçada. Durante a aula magna que fez com o Felipe para os alunos do MBA em Análise de Ações e Finanças da Empiricus, André Esteves disse que o vencedor será aquele que caminhar ao centro, seja por convicção ou por pura estratégia eleitoral. Que seja por estratégia, não importa; o cenário-base é de moderação — ficou claro que o discurso polarizado não tem ganhado muitos votos.
Os bons alocadores de capital parecem não se importar mesmo com esse evento político.
A Cosan (SA:CSAN3) anunciou ontem a entrada no negócio de exploração de minério de ferro, por meio de uma joint venture (“JV Mineração”) com o Grupo Paulo Brito, do fundador da Aura Minerals (SA:AURA33). Além da expertise logística que a Cosan aporta no negócio, ela também entrará com o Porto de São Luís, no Maranhão, o qual a companhia adquiriu ontem por R$ 720 milhões.
Tenhamos em mente que o primeiro projeto de exploração da JV Mineração deverá se tornar operacional apenas em 2025. Note que já terão passado três anos desde a eleição do próximo presidente quando a empresa fizer seu primeiro embarque de minério de ferro.
Quem está fazendo isso não é um louco; a Cosan mostrou, de 2017 a 2020, um crescimento médio anual (CAGR, na sigla em inglês) de receita de 12%, e de 5% para o Ebitda ajustado — isso mesmo colocando na conta o ano pandêmico de 2020. Se excluirmos esse ano da conta, os CAGRs vão para 22% e para 5%, respectivamente. O retorno sobre capital investido (ROIC) médio durante o período foi de 10% ao ano, uma rentabilidade espetacular para um negócio de infraestrutura.
E aqui não estou levando em consideração todos os critérios que usamos ao recomendar as ações do conglomerado; meu intuito é mostrar que bons alocadores de capital seguem investindo no Brasil, independentemente do cenário eleitoral.
Está na hora de o investidor, também, se voltar aos fundamentos.
Não quero ser radical aqui, e sei que o cenário macro tem um efeito de curto prazo na rentabilidade dos investimentos.
Meu ponto é que quem investe em ações deveria se preocupar mais com a dinâmica dos fundamentos das empresas do que com o cenário político. Nossa visão é que podemos gerar mais valor ao assinante nos debruçando sobre o negócio em análise do que nos posicionando a favor ou contra determinado cenário eleitoral.
Apesar de isso não nos eximir dos nossos deveres políticos como cidadãos, julgo que não somos especialistas em política. Somos analistas de investimentos, esse é o nosso dever e o nosso chamado profissional.
Na seara de ações, os negócios escondidos atrás dos preços de tela têm toda uma dinâmica que caminha à revelia das eleições de 2022. Veja a imagem abaixo, que mostra o índice de surpresa nos resultados das empresas que compõem o Ibovespa durante o 2T21.
Os números mostram que a receita das empresas do índice, na média, superou as expectativas de analistas em 6% no 2T21. A surpresa em relação ao lucro líquido foi ainda maior, de 28%.
Nós, analistas, ainda buscamos diariamente as empresas que tendem a mostrar surpresas ainda maiores. É um exercício de futurologia e nem sempre acertamos; mas se evitarmos erros feios e acertarmos na maioria das vezes, já estamos melhores que a média. Veja abaixo a surpresa com o resultado da Cosan nesse último trimestre. A receita ficou 6% acima do consenso; já o lucro líquido ajustado foi 388% acima do esperado.
Com esses números, eu já não me importo com as eleições.
Um abraço