No texto de hoje irei falar do setor elétrico e das empresas que são vistas como defensivas na bolsa de valores. O setor elétrico tem como características principais a previsibilidade da geração de caixa e o pagamento de dividendos aos acionistas. Suas empresas representam 6,7 por cento no Ibovespa, 8,0 por cento do IBrX100 e 16,2 por cento do índice Small Caps (SMLL). São 17 companhias listadas entre as ações de maior liquidez na B3.
Entretanto, as empresas do setor elétrico são diferentes entre si. São divididas em três segmentos principais de atuação: geração, distribuição e transmissão de energia elétrica. Há algumas empresas que atuam nos três segmentos, e são chamadas integradas.
No momento atual de paralisação da economia devida à quarentena para controlar a disseminação do novo coronavírus, nem todas as empresas são impactadas da mesma maneira, apesar do beta mais baixo das ações do setor inteiro. Eu acredito que as empresas mais afetadas no setor elétrico serão, em ordem decrescente (do maior risco para o menor risco): a distribuição de energia, seguida pelo segmento de geração de energia e, com menor impacto, o segmento de transmissão de energia elétrica.
Dessa forma, as ações do setor elétrico mais defensivas são as transmissoras de energia elétrica: Alupar (SA:ALUP11), Isa Ctepp (TRPL4 (SA:TRPL4) e Taesa (TAEE11 (SA:TAEE11).
Geração: hidrelétricas
Na parte da geração, é possível encontrar empresas de portes e tecnologias diferentes. Atualmente, 70 por cento da potência instalada no país é proveniente da geração hidrelétrica. Nos últimos anos, porém, os esforços concentraram-se na diversificação da matriz energética, principalmente por meio da construção de termelétricas e parques eólicos e solares.
Geração tem contratos pré-definidos
O segmento tem contratos pré-definidos de venda de energia elétrica com as empresas de distribuição e com seguros (hedges) no caso de falta de água nos reservatórios (situação hídrica do sistema).
Risco de demanda na distribuição
O segmento de distribuição de energia elétrica pode sofrer com a queda no consumo de energia, com o aumento no nível de inadimplência dos consumidores finais (comércio e indústria) e com as possíveis medidas do Governo Federal para enfrentar os efeitos econômicos da quarentena do Covid-19: suspensão do corte de energia elétrica depois de três meses de inadimplência e possíveis descontos nas tarifas de energia.
Distribuição e transmissão: monopólios naturais
A distribuição diz respeito à forma pela qual a energia chega aos usuários finais nos grandes centros urbanos ou nas grandes usinas.
Os segmentos de transmissão e de distribuição são considerados monopólios naturais, visto que uma competição entre empresas do setor não traria quaisquer benefícios para a sociedade.
Adiamento dos reajustes de tarifa de energia elétrica
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) adiou por 90 dias o reajuste tarifário anual das distribuidoras de energia de subsidiárias da CPFL Energia (SA:CPFE3) e da Energisa (SA:ENGI4) (ENGI11 (SA:ENGI11).
Como parte do reajuste tinha o objetivo de cobrir o aumento dos custos dos últimos meses, o adiamento do reajuste provocará quedas no resultado operacional das empresas de distribuição de energia elétrica. Para compensar esse fator, as empresas de distribuição poderão parcelar o pagamento das suas contribuições à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), uma espécie de fundo setorial.
A medida funciona como um freio nas receitas dos próximos meses com apenas parte do custo no período sendo reduzida como forma de compensação. Acredito que pode acontecer o mesmo com outras distribuidoras de energia. Porém, o adiamento não é capaz de comprometer a situação financeira e operacional de curto prazo das empresas.
Tesouro Nacional: recursos para tarifa social de energia
O Governo Federal decidiu aumentar os recursos da tarifa social de energia elétrica com 900 milhões de reais do Tesouro Nacional, com objetivo de mitigar os efeitos da pandemia de coronavírus para famílias de baixa renda. A medida vai valer por 90 dias e concederá 100 por cento de desconto nas contas luz para a faixa de consumo até 220 kilowatts-hora (KWh) por mês.
Segundo estimativas oficiais, a isenção temporária do pagamento pela eletricidade deve custar em torno de 1,25 bilhão de reais, o restante do orçamento virá de sobras na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Vantagem competitiva da transmissão
A principal vantagem competitiva das empresas do setor de transmissão de energia elétrica é a sua rede de linhas e equipamentos de transmissão.
A maior parte do faturamento vem do Governo Federal, pois a empresa é exclusivamente transmissora de energia. Dessa forma, ela compra energia das empresas geradoras e depois vende essa energia para as distribuidoras e clientes finais.
Em outras palavras, se uma empresa geradora precisa mandar energia para uma distribuidora ou cliente final ela irá utilizar as linhas de transmissão das empresas.
As receitas das empresas de transmissão de energia elétrica são mais previsíveis e não dependem da demanda por energia elétrica do consumidor final.
Redução no lucro das transmissoras
A Aneel aprovou, na semana passada, uma norma que atualiza a metodologia de cálculo da Receita Anual Permitida (RAP) das empresas do setor, ao deixar de reconhecer uma “margem de lucro” de 10 por cento aprovada no Governo Dilma, como uma espécie de prêmio às concessionárias que assumissem os riscos da adesão ao plano de renovação antecipada às concessões criado para reduzir as tarifas.
Recursos para o setor elétrico como um todo
A Aneel autorizou também a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) a repassar para as distribuidoras do sistema interligado nacional e parte dos agentes do mercado livre recursos financeiros disponíveis para alívio futuro de encargos.
O valor do repasse para as empresas de distribuição de energia no Ambiente de Contratação Regulada (ACR) e para os agentes do Ambiente de Contratação Livre (ACL) é de 2,022 bilhões de reais, dos quais 1,4475 bilhão de reais são destinados às distribuidoras e 547 milhões de reais são destinados para os consumidores livres. Essa medida beneficia o setor como um todo: geração, transmissão e distribuição.
Critérios fundamentalistas quantitativos
Os principais critérios de análise fundamentalista utilizados para escolher quais são as melhores empresas são: 1) geração de caixa recorrente; 2) baixa necessidade de investimento na operação; 3) baixo nível de endividamento e; 4) distribuição de lucros através de dividendos.
Nível de endividamento
Acredito que essa é uma das principais métricas de análise fundamentalista para escolher as ações na bolsa e o indicador mais utilizado é a relação dívida líquida/Ebitda.
Algumas empresas definem em sua política de dividendos qual o patamar limite para a relação dívida líquida/Ebitda, quanto menor for o nível de alavancagem, maior a capacidade de distribuição de dividendos.
Conclusão
Neste momento de maior aversão ao risco e procura por segurança (busca pela qualidade), as ações do setor elétrico de destacam pela menor volatilidade, maior previsibilidade e capacidade de distribuição de dividendos.
Entretanto, o setor é muito regulado e pode sofrer bastante interferência governamental, o que quer dizer que existem riscos, ainda que menores do que em outros setores na bolsa.
No curto prazo, é provável que as empresas suspendam, adiem ou até mesmo reduzam a distribuição de dividendos, com objetivo de preservar a posição de caixa, mas acredito que a situação deverá ser normalizada até o final de 2020 quando finalmente passarem os efeitos da pandemia do coronavírus.
Por último, eu destaco a minha preferência pelo setor de transmissão de energia que deverá sofrer menos com os efeitos da pandemia do Covid-19 na economia.