Primeiro foi a madeira serrada. Depois o cobre. Agora o minério de ferro.
As pressões de preços nos materiais de construção estão simplesmente disparando nos Estados Unidos, à medida que sua economia se recupera da Covid-19 e cria um ambiente inflacionário nunca visto desde a Grande Recessão da última década.
A economia norte-americana registrou expansão anual de 6,4% no primeiro trimestre deste ano, após a contração induzida pela pandemia de 3,5% em 2020. O Federal Reserve projeta que o crescimento em 2021 será de 6,5%.
O problema é a inflação. Ninguém sabe ao certo como ela se comportará.
Oficialmente, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) prevê que os gastos com consumo pessoal, sua medida da inflação, ficarão em média a 2,4% em 2021 e 2,1% em 2023.
Privadamente, a maioria dos formuladores da política monetária do Fed, sob a liderança de Jerome Powell, está convencida de que 2021 não terá a distinção de ser um ano de inflação a 2%.
Desde que o banco central americano anunciou sua meta de 2% em 2012 para as pressões de preços, nunca conseguiu atingir esse objetivo durante um ano civil. De fato, antes da crise financeira de 2008/09, só houve quatro anos em que a inflação nos EUA ultrapassou essa meta, de 2004 a 2007.
Powell particularmente gosta de pensar que as atuais pressões inflacionárias são “transitórias”, como costuma dizer. O presidente do Fed acredita que, até 2023, não haverá qualquer inflação duradoura que permita que essa métrica alcance 2% em um ano civil. Diversos chefes distritais do Fed, que têm assento no Fomc ao lado de Powell para decidir mensalmente as taxas de juros, concordam com o presidente.
O problema está nos economistas fora do banco central, principalmente aqueles que são ouvidos pelos operadores de Wall Street.
Esse grupo tem quase certeza de que a inflação nos EUA ficará muito acima de qualquer projeção, já que a economia se aproximará muito de uma recuperação total da pandemia.
Porém, até mesmo esse grupo não acredita em uma média de 2% neste ano. Estão convencidos de que as pressões de preço forçarão o Fed a elevar as taxas de juros – que estão perto de zero desde a emergência da Covid em março de 2020 – mais cedo do que o previsto e a reduzir a política monetária acomodatícia que tem impulsionado os mercados acionários durante toda a pandemia.
Dadas as suas apostas nas pressões de preço, e a beleza das profecias autorrealizáveis – ou seja, para que a inflação acelere, as máximas recordes nas commodities devem continuar –, vamos examinar os três materiais de construção mencionados anteriormente para ver até onde podem subir, pelo menos do ponto de vista técnico.
Madeira serrada: Projeção de recorde a US$2.000
A madeira serrada é uma matéria-prima essencial na construção civil, pois é usada em vigas e estruturas.
A falta de madeira serrada nos EUA fez com que os preços mais do que triplicassem no último ano e aumentou em milhares de dólares o custo geral de novas construções residenciais no país.
Em apenas um ano, o preço da madeira serrada aumentou cerca de 370%, atingindo a máxima recorde acima de US$ 1.700 por 1.000 bd ft. Para fins de contexto, a madeira serrada historicamente flutua entre US$ 200 a US$ 400.
Nos Estados Unidos, o preço médio de uma residência é de US$ 35.872, de acordo com uma análise realizada na semana passada pela Associação Nacional de Construtoras.
Em uma pesquisa recente em Nevada, publicada pelo periódico Las Vegas Review-Journal, as casas novas unifamiliares custavam em média US$ 25.000 e, para residências maiores, a falta de madeira serrada poderia aumentar os preços de US$ 50.000 para US$ 60.000.
Nat Hodgson, CEO da Associação de Construtora de Nevada do Sul, foi citado na pesquisa dizendo:
“Essa alta equivale à mesma quantidade de madeira usada há 12 meses para construir a casa vizinha”.
A madeira mais cara impactou o custo de armários, portas e pisos, segundo ele.
“Estou na indústria desde 1993, nesta mesma cidade, e nunca vi um aumento tão grande no preço da madeira como estou vendo agora", declarou Hodgson. “Eu adoraria dizer que isso vai acabar em uma ou duas semanas, mas infelizmente não é o caso. Esse preço está pesando tanto no orçamento que as pessoas podem não conseguir comprar uma casa”.
Os custos da madeira serrada começaram a subir no ano passado, embora nos últimos meses tenham ganhado força.
O preço por milhar de pés superficiais de madeira serrada normalmente custa entre US$ 200 e US$ 350.
De acordo com a última análise da Random Lengths, empresa que rastreia a indústria, os preços até a semana encerrada em 23 de abril mostram que o custo da madeira estrutural se aproximou de US$ 1200 bd ft, uma alta de quase 250% desde abril de 2020.
Há cerca de cinco semanas, os preços da madeira serrada caíram 15%, mas rapidamente voltaram a subir, disse a Hodgson. A madeira serrada é geralmente usada na estrutura de novas casas.
“Já subiu para US$1.300 até agora”, declarou a Hodgson. “É insano. Na história, nunca aconteceu isso. Se fosse um pequeno item de linha em uma residência, não teria problema em aumentar o custo de uma casa em 1%. Mas não, a madeira serrada é um dos itens mais usados no orçamento de uma residência”. A maior parte desse custo pode ser repassada para o consumidor, mas a oferta extremamente restrita impede que as construtoras iniciem mais projetos.
Analistas já começam a alertar que os preços da madeira serrada podem atingir um ponto crítico, em que a acessibilidade se torna tão limitada a ponto de fazer a demanda cair repentinamente. Isso fez com que a associação nacional de construtoras pedisse ao governo Biden que interrompesse temporariamente as tarifas sobre as madeiras importadas do Canadá, que atualmente pagam imposto de 9%.
A tributação sobre a madeira canadense começou a ser aplicada em 1982 e representa uma das mais longas guerras comerciais entre os dois países. Os EUA estão atualmente recorrendo de uma decisão da Organização Mundial de Comércio (OMC) que afirma que seu aumento tarifário de 2017 violou as regras de comércio global.
Até sexta-feira, o contrato futuro da madeira serrada para julho na Bolsa Mercantil de Chicago atingiu a máxima histórica de US$ 1.711,20 por 1000 bd ft.
Gráficos: cortesia de SK Dixit Charting
Embora seja difícil definir até quando os preços podem subir só pela demanda, tecnicamente, a madeira na CME pode registrar nova máxima de 2000 segundo S.K. Dixit Charting, em uma análise feita para o Investing.com.
Sunil Kumar Dixit, grafista-chefe da empresa, disse:
“Os preços da madeira serrada ganharam tração após a longa consolidação entre US$ 500 e 1000, o que gerou um forte rali até as máximas de 1711.”
“Os preços estão fazendo uma pausa no suporte da média móvel exponencial de 5 semanas a 1486. Um movimento sustentado para cima desse nível pode impulsionar o rali até 2000.”
Cobre pode encontrar resistência a US$ 5/Lb
O contrato futuro de cobre para julho atingiu as máximas de quase US$ 4,89 por lb na Comex de Nova York na segunda-feira, enquanto o contrato de três meses na Bolsa de Metais de Londres (LME) atingiu o pico a US$ 10.746 por tonelada.
Ambos registram alta de cerca de 35% no ano.
Isso faz com que o cobre fique logo atrás da gasolina (44%), milho (47%), estanho e soja (46% cada).
Os fundamentos apontam que o cobre é uma sólida aposta com base no crescimento de duas grandes economias após a pandemia do coronavírus: a chinesa e a americana.
Enquanto a China se recompõe da devastação da pandemia, procura colocar de pé praticamente uma segunda versão do seu plano de infraestrutura de 2000, responsável por torná-la a maior consumidora de metais, principalmente cobre.
Mesmo antes da Covid-19, os EUA já estavam promovendo uma revolução verde que irá exigir uma quantidade enorme de cobre nos próximos anos para a eletrificação da maioria dos novos veículos vendidos e estações de carregamento. Isso não inclui o cobre necessário para cabeamento e condução de eletricidade em outras indústrias que querem deixar de emitir poluição por combustíveis fósseis.
Como se não bastasse, agora o governo Biden quer reduzir pela metade as emissões de todos os americanos até 2030.
As propostas ecológicas dos EUA incluem subsídios a proprietários privados de carros elétricos, a instalação de mais 500.000 novas estações de carregamento pelo país, além da conversão de 500.000 ônibus escolares e de toda a frota de transporte público para veículos com emissão zero.
Somente essas estações e esse volume de ônibus movidos à bateria exigiriam quase 200.000 toneladas de cobre, de acordo com uma estimativa do banco de investimento Jefferies. A energia renovável geralmente requer cerca de cinco vezes mais cobre do que as fontes convencionais.
A demanda combinada de China, UE e EUA pelo cobre é o que provavelmente levou o Goldman Sachs a prever, há duas semanas, que o metal poderia atingir US$ 15.000 por tonelada na LME até 2025, em comparação com sua cotação atual de US$ 9.000.
O cobre será essencial para a descarbonização e substituição do petróleo por fontes de energia renovável e, neste momento, o mercado está enfrentando uma escassez do produto, o que pode impulsionar seu preço em mais de 60% em quatro anos, na visão do Goldman.
Mas, até o fim da década, a demanda não dará trégua, disparando 900% daqui até 2030 e alcançando 8,7 milhões de toneladas, caso as tecnologias verdes sejam adotadas em massa, nas estimativas do banco americano. Mesmo que esse processo seja mais lento, a demanda pode atingir 5,4 milhões de toneladas, quase 600% maior do que atualmente, prossegue a instituição, chamando o cobre de “novo petróleo”.
S.K. Dixit Charting afirma que o cobre pode atingir US$5 por lb na Comex no curto prazo, apesar de alguns desafios.
“O cobre, com sua imparável tendência de alta, continua vencendo importantes resistências”, disse Dixit.
“O movimento de alta acima da resistência anterior de US$ 4,30 ocorreu de forma bastante rápida. O movimento abaixo da MME de 5 semanas a US$ 4,53 pode fazer com que o cobre teste a MMS de 20 semanas e a parte intermediária da Banda de Bollinger a US$ 4,02. O nível de U$5 claramente atuará como forte resistência”.
Minério de ferro pode atingir recorde de US$ 220
O contrato futuro de minério de ferro já subiu mais de 30% neste ano, atingindo máximas recordes de US$ 204,35 por 500 toneladas métricas secas na CME na sexta-feira, diante da explosão da demanda de aço, afirmam analistas.
O setor de minério de ferro “está muito, muito aquecido”, declarou Vivek Dhar, analista de commodities do Commonwealth Bank da Austrália, em uma entrevista à Bloomberg. “A oferta ainda não é capaz de atender a forte demanda”.
O minério de ferro futuro em Cingapura saltou para mais de US$ 226 por tonelada, um recorde. Os contratos em Dalian atingiram o limite diário de alta.
O boom do minério de ferro ocorre no momento em que os fabricantes de aço chineses mantêm taxas de produção acima de 1 bilhão de toneladas por ano, apesar de uma série de restrições com vistas a reduzir as emissões de carbono e frear a oferta.
Tais medidas elevaram os preços do aço e a rentabilidade das usinas, permitindo-lhes acomodar melhor os custos maiores do minério de ferro e a produção antes de mais restrições ambientais.
Fabricantes de navios e produtos domésticos eventualmente não conseguirão arcar com os preços mais elevados do aço, reportou a agência de notícias estatal da China no domingo, citando uma análise da Associação do Ferro e Aço do país. A reportagem disse ainda que seria difícil a continuidade do rali do aço.
S.K. Dixit Charting também prevê resistência no minério de ferro na Comex, que pode buscar o recorde de US$ 220.
“Existe falta de volume e liquidez no minério de ferro futuro”, segundo o grafista-chefe da Dixit. “O grande gap muito provavelmente fará com que os preços recuem e o fechem a US$ 180. Mas existe a possibilidade de mais altas até US$ 220”.
Aviso de isenção: Barani Krishnan utiliza diversas visões além da sua para oferecer aos leitores uma variedade de análises sobre os mercados. A bem da neutralidade, ele apresenta visões e variáveis de mercado contrárias. O analista não possui posições nos ativos e commodities sobre os quais escreve.