Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com. Publicado originalmente em inglês em 19/04/2021
- China prepara-se para lançar uma moeda digital com planos de domínio
- EUA e Europa: dormindo ao volante
- Controle da oferta monetária global pavimenta o caminho para os objetivos da China
- O RMB não é uma moeda conversível, mas um RMB digital pode ter uma história diferente
- Dólar digital e criptoeuro não são mais um luxo: são uma necessidade
As finanças digitais são uma extensão natural da era tecnológica. Nas últimas quatro décadas, a tecnologia mudou nossas vidas. Nos anos 1970, um computador tinha muitos tubos alojados em uma sala fria. Atualmente, carregamos mais poder computacional no bolso com um smartphone. Esse aparelho também possui uma câmera profissional, acesso à internet em alta velocidade, mapas e muitos outros dispositivos que substituem produtos.
As moedas digitais entraram em cena ao redor de 2010, mas muitos de nós não notamos a emergência do bitcoin. A seis centavos por token, minerar bitcoin parecia como um videogame. A mais de US$ 62.000 por token, como na semana retrasada, estava longe de ser um jogo diante das mais de 9.260 outras moedas digitais em circulação e a capitalização de mercado da classe superando US$ 2,247 trilhões.
CONFIRA: Cotação de mais de 5 mil criptomoedas
As moedas digitais são o futuro. No entanto, elas criam problemas para os governos que controlam a oferta monetária. O dinheiro cria poder, por isso os bancos centrais, autoridades monetárias e governos não estão animados com essa nova classe de ativos que busca substituir o dinheiro por uma alternativa tecnológica.
Mesmo assim, não tardará para que capitulem e alcancem um feliz ponto médio ao implementar suas próprias moedas digitais. A China parece ser o primeiro país a fazê-lo com seu iuan digital, que atende perfeitamente seu objetivo de dominação com sua moeda, além de o país ter a segunda maior economia do mundo e abrigar a maior população do planeta.
China prepara-se para lançar uma moeda digital com planos de domínio
O bitcoin e quase todas as outras 9.266 criptomoedas são descentralizados, ou seja, são meios de troca que transcendem fronteiras. Não são controlados por qualquer autoridade central, como um banco, uma autoridade monetária ou um governo.
A filosofia dos criptoativos é libertária, assim como a de seus devotos, que abraçam a liberdade como princípio central. Embora a alta das criptomoedas seja reflexo do avanço tecnológico e elemento-chave do blockchain, também representa a falta de confiança no controle da autoridade central sobre a oferta monetária.
A China é a nação mais populosa do planeta, com a segunda maior economia. O presidente Xi Jinping planeja se tornar líder mundial. Em 2014, os chineses começaram a trabalhar em uma moeda digital, reconhecendo o potencial crescimento dessa emergente classe de ativos.
Ao contrário de outras criptos, a versão chinesa está prestes a ser emitida como um iuan digital ou Pagamento Eletrônico de Moeda Digital, controlada pelo Banco Popular da China (BPC). A distribuição será via sistema de dois níveis.
O BPC distribuirá o iuan digital a bancos comerciais responsáveis por fazer a moeda chegar às mãos dos consumidores. A China se esforça para internacionalizar sua moeda nos últimos anos. O iuan digital pode acelerar o processo.
O BPC tem trabalhado com bancos centrais da Tailândia, Emirados Árabes Unidos e Hong Kong para explorar o sistema de pagamento de moeda digital entre fronteiras. O grupo estuda usar a tecnologia de registro contábil distribuído.
EUA e Europa: dormindo ao volante
Enquanto isso, os governos dos EUA e Europa parecem estar ficando bastante atrás da China na adoção dessa evolução do mercado monetário. A Secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, chamou o bitcoin de forma “extremamente ineficiente” de realizar transações monetárias. Ela ressaltou o uso de moedas digitais para “fins ilícitos”.
Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, afirmou que os bancos centrais não usarão o bitcoin como moeda de reserva e destacou o que chamou de "negócios engraçados", sem deixar de citar a necessidade de regulação.
O que Yellen e Lagarde não mencionaram foi que as moedas digitais representam um desafio direto ao controle governamental da oferta monetária. O poder está nas mãos de quem determina o orçamento, portanto as criptomoedas são uma ameaça imediata.
Apesar de a China ter reconhecido a transformação tecnológica que está acontecendo, os EUA e a Europa ainda precisam adotá-la. O desenvolvimento do dólar digital ou do criptoeuro segue atrás dos esforços chineses.
Controle da oferta monetária global pavimenta o caminho para os objetivos da China
O iuan digital não minará o controle da China sobre a oferta monetária, na medida em que p BPC tem autoridade sobre os meios de troca. Entretanto, como primeiro país a usar uma versão digital da sua moeda no mercado, a China intensificará sua ambição de se tornar a economia líder com significativa influência global. Se o iuan digital se tornar a moeda de escolha mundial, inclusive fora dos EUA e Europa, pode impactar de forma significativa as finanças internacionais, potencialmente fragilizando a posição do dólar estadunidense como moeda de reserva global.
Enquanto isso, a Rússia trabalha em um rublo digital, já que o presidente Vladimir Putin e seu colega Xi perceberam que, quanto maior seu impacto no orçamento mundial, maior é seu poder.
A velocidade e eficiência do sistema de pagamentos digitais podem fazer com que produtores de commodities e consumidores em todo o mundo usem o iuan ou rublo digital quando surgirem. A China e a Rússia são poderosas nações produtoras de matérias-primas, e a população chinesa é a maior consumidora desse tipo de produto no mundo. A China e a Rússia juntas podem ditar os termos que apoiam o uso de suas moedas digitais para transações internacionais.
Embora não se tenha notícia de que os EUA ou a Europa estejam trabalhando em suas moedas digitais para fazer frente aos esforços da China e da Rússia, o governo Biden está aumentando o escrutínio sobre os planos do país asiático. O iuan digital pode ser o primeiro passo em direção à substituição do dólar como meda de reserva mundial. O presidente Xi não vê a hora de fazer isso, suplantando o dólar e controlando o sistema financeiro mundial com um iuan digital que domina o comércio internacional.
O RMB não é uma moeda conversível; um RMB digital pode ser uma história diferente
Um dos problemas enfrentados pela China nos últimos anos é o equilíbrio do controle de sua moeda com a permissão para que sua cotação flutue livremente, o que viabilizaria sua total conversibilidade sem restrições. O dólar e o euro são moedas livremente conversíveis, criando a liquidez necessária para atingir o status de moedas de reserva.
Se o RMB digital fosse capaz de se tornar uma moeda mundial resolveria os problemas de controle da China. Com o BPC no mando, a moeda digital pode se tornar livremente conversível, experimentar os benefícios da tecnologia de registro distribuído e permitir constante monitoramento e regulação do fluxo de fundos no mundo.
Quanto mais generalizado o iuan digital venha a se tornar, mais poder e informação o governo chinês terá em suas mãos. Fazer com que o iuan digital seja totalmente conversível para outras moedas digitais e tradicionais permitirá gerar dados capazes de aumentar o poder financeiro.
Empresas como Apple (NASDAQ:AAPL) (SA:AAPL34), Amazon (NASDAQ:AMZN) (SA:AMZO34), Alibaba (NYSE:BABA) (SA:BABA34), Facebook (NASDAQ:FB) (SA:FBOK34) e muitos outros líderes tecnológicos já lucraram com a acumulação de dados e inteligência artificial que compreende e manipula as tendências de consumo. A capacidade da China de implementar uma moeda digital que compita com o dólar, euro e outros instrumentos de câmbio internacional pode gerar esse tipo de benefício de que gozam as empresas de tecnologia.
Posições dominantes da indústria porque os dados das Big Techs podem fazer com que a China tenha um papel dominante no comércio mundial caso o iuan digital se torne a moeda de reserva global.
Dólar digital e criptoeuro não são mais um luxo: são uma necessidade
Em meados de abril, os preços do bitcoin e ethereum atingiram novas máximas, fazendo com que a capitalização de mercado das criptomoedas superasse US$ 2,247 trilhões.
Fonte de todos os gráficos: CQG
O gráfico acima mostra que o bitcoin tocou nova máxima a US$ 65.520 em 14 de abril.
O ethereum atingiu novo pico recorde a US$ 2.572,75 em 16 de abril apenas algumas semanas depois de seus contratos futuros começarem a ser negociados na CME. No dia 14 de abril, a Coinbase (NASDAQ:COIN), plataforma americana de moedas digitais, teve bastante sucesso na sua abertura de capital. A alta da classe de ativos é um sinal de que a tecnologia não irá esperar por quem está ficando para trás. Ainda que a classe de ativos rejeite o controle governamental sobre seus tokens, os órgãos reguladores e líderes podem exercer influência via leis, decretos, estatutos e restrições a empresas.
Ao mesmo tempo, é uma questão de segurança nacional para os EUA e a Europa seguir os passos da China na direção de uma moeda digital. A vitória chinesa na arena das criptomoedas, fazendo com que o iuan se tornasse uma das principais moedas de reserva, gearia implicações significativas para o equilíbrio de poder mundial.
Os esforços da China nas moedas digitais emite uma mensagem a quem está no poder nos EUA e Europa, além de ter grandes consequências para o futuro do mundo. O dólar digital ou o criptoeuro baseado em blockchain não são mais um luxo. São uma necessidade neste momento.